STJ reconhece a aplicação da Lei Maria da Penha em casos de violência contra mulheres trans
Guilherme Calais
O VLF Advogados sempre teve como iniciativa o engajamento em questões sociais de grande relevância. Prova disso é o recente Selo CESA Equidade de Gênero 2021, na Categoria Aliado, concedido às sociedades de advogados que se comprometem com a igualdade de gênero.
Ainda que não esteja em sua área direta de atuação, recente decisão prolatada pelo Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) (1) merece o devido destaque pelo escritório em razão do contínuo compromisso com o tema da diversidade e da inclusão social. Trata-se da aplicação da Lei Maria da Penha à violência doméstica e familiar contra mulheres transexuais.
Instada a decidir sobre a questão em processo pelo qual uma mulher transexual perseguia medida protetiva contra seu pai em razão de agressões por ela sofridas, a Sexta Turma do STJ, por unanimidade, concedeu a medida requerida sob a assertiva de que, para fins de enquadramento da vítima aos termos da Lei nº 11.340/2006, não deve ser considerado como fator dominante a questão biológica, mas, sim, o gênero ao qual se identifica a vítima, o que engloba fatores sociais.
O Ministro Relator, Rogério Schietti Cruz, destacou que o julgamento “versa sobre a vulnerabilidade de uma categoria de seres humanos, que não pode ser resumida à objetividade de uma ciência exata. As existências e as relações humanas são complexas, e o direito não se deve alicerçar em discursos rasos, simplistas e reducionistas, especialmente nestes tempos de naturalização de falas de ódio contra minorias”.
Ainda segundo o relator, “o verdadeiro objetivo da Lei Maria da Penha seria punir, prevenir e erradicar a violência doméstica e familiar contra a mulher em virtude do gênero, e não por razão do sexo”, a teor do que preconiza o art. 5º da Lei nº 11.340/2006 (2). Por isso, basta que a vítima se identifique como mulher e que a violência seja cometida em ambiente doméstico ou familiar.
A decisão é um avanço e contribui fortemente para o desencorajamento da sociedade no que tange à transfobia, principalmente no Brasil, que pelo 13º ano consecutivo, é o país que mais mata travestis e transexuais, em sua maioria, do gênero feminino, conforme reportagem recentemente publicada pelo Estadão (3).
Guilherme Calais
Advogado da Equipe de Contencioso Cível do VLF Advogados
(1) Notícia na íntegra em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/05042022-Lei-Maria-da-Penha-e-aplicavel-a-violencia-contra-mulher-trans--decide-Sexta-Turma.aspx. Acesso em: 20 de abr. 2022.
(2) Art. 5º da Lei 11.340/2006. Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial.
(3) Notícia na íntegra em: https://brasil.estadao.com.br/noticias/geral,brasil-continua-lider-mundial-de-assassinatos-da-populacao-trans,70003963904. Acesso em: 20 de abr. 2022.