Responsabilidade tributária dos sócios e gestores e o Tema 981
Rafhael Frattari e Laura Maakaroun
Neste mês, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) finalizou o julgamento sob o rito dos repetitivos em que pretendeu definir se o sócio/administrador de empresa dissolvida irregularmente só pode ser responsabilizado pela dívida tributária caso já tivesse poderes de gestão no momento da ocorrência do fato gerador do tributo exigido (tema n. 981 de demandas repetitivas, apreciados os REsp 1643944, REsp 1645281, REsp 1645333 e REsp 1867199) (1).
Com divergência de votos, a 1ª Seção definiu que sócios/gestores com poderes de gestão no momento da dissolução irregular da empresa podem ser responsabilizados, ainda que não fossem gestores no momento da ocorrência dos fatos geradores que deram vida ao débito.
Prevaleceu o entendimento da Relatora, Min. Assusete Magalhães, para quem a responsabilização do sócio com poder de gerência demanda tão somente sua participação na empresa quando ocorrida a sua dissolução irregular, não sendo relevante o fato de ele estar (ou não) na administração da sociedade à época da ocorrência do fato gerador do tributo não pago. O fundamento legal para o redirecionamento foi o art. 135 do Código Tributário Nacional (“CTN”), que regula a responsabilidade tributária de terceiros.
O voto condutor constou, ainda, que a responsabilidade tributária de terceiros do art. 135 do CTN pode advir tanto do ato do qual resulte diretamente a obrigação tributária, como daquele praticado em momento posterior ao surgimento do crédito tributário e que inviabilize a cobrança do devedor original.
É importante destacar que essa posição não implica o redirecionamento da execução fiscal ao sócio apenas em razão de não pagamento do tributo, situação que, segundo se extrai do voto relator, não se enquadraria na hipótese do art. 135, III do CTN.
O julgado contribui para uniformizar o tratamento de situação corriqueira no âmbito das execuções fiscais: a dissolução irregular da sociedade empresária. Fica consolidada a posição, nestes termos, de que a dissolução irregular está contemplada no conceito de infração à Lei, o que viabiliza o redirecionamento da ação executiva contra o sócio/gerente.
O curioso é que se mesclou o art. 135, com o art. 134 do Código, que traz a expressão “dissolução irregular”. Como os termos não foram definidos com clareza pelo legislador, situações como deixar de funcionar no domicílio fiscal informado à Administração Tributária sem comunicação aos órgãos competentes, portanto, bastam para constituir a presunção de dissolução irregular, pelo menos até que se esclareça eventual equívoco.
Na prática, definiu-se que o insucesso empresarial pode acarretar a transferência de responsabilidade tributária ao sócio gestor, caso a sociedade não seja encerrada nos termos legais, por processo falimentar, o que deve gerar reflexões da doutrina tributária.
Talvez tenha sido essa a razão da divergência instaurada pela Min. Regina Helena Costa, para quem a responsabilização pessoal do sócio ou gestor precisaria ser fundada em condutas efetivamente dolosas, o que não é o caso da simples dissolução da pessoa jurídica por insucesso comercial. A Ministra ressaltou, também, que a dissolução irregular normalmente decorre da insolvência da pessoa jurídica, que usualmente é consequência dos atos dolosos anteriormente praticados, de forma que o gestor que não participou desses atos dolosos, mas tão somente da dissolução irregular (uma espécie de canto do cisne), não poderia ser responsabilizado.
De todo modo, a divergência no julgamento não prosperou e definiu-se que pode haver responsabilização do sócio gestor no momento do encerramento irregular das atividades empresariais, com a atenção de que há presunção de encerramento caso a pessoa jurídica não se encontre no endereço fornecido à Administração Tributária, que sempre há de ser vista como presunção relativa, a admitir prova em contrário, por óbvio.
Rafhael Frattari
Sócio responsável pela Equipe de Contencioso Tributário do VLF Advogados
Laura Maakaroun
Advogada da Equipe de Contencioso Tributário do VLF Advogados
(1) Convém destacar que ao final de 2021 houve outro julgamento relacionado à responsabilização do sócio por débitos tributários, através do Tema n. 962. Naquela ocasião, o STJ decidiu que o sócio que gerenciava a empresa à época do fato gerador do tributo não pago, mas que se afastou regularmente da empresa antes da dissolução irregular, não deve responder pelos débitos fiscais da companhia, desde que não tenha dado causa à posterior dissolução irregular.