A possibilidade de compensação de créditos no cumprimento de sentença independentemente de previsão do título executivo judicial
Diego Murça
As matérias extintivas ou modificativas da obrigação exequenda, supervenientes à formação do título executivo judicial, normalmente serão trazidas ao processo por informação das próprias partes, sobretudo, o devedor. A arguição destas matérias tem por objetivo impedir eventual tentativa de enriquecimento ilícito por parte do exequente que tente obter, por exemplo, a execução de obrigação que não mais subsiste. A compensação, por exemplo, é uma destas matérias extintivas ou modificativas do cumprimento de sentença.
Compensação é o termo designado para a causa da extinção de duas obrigações, pelo fato de os credores serem, ao mesmo tempo, devedores um do outro. Trata-se de situação prevista no Código Civil Brasileiro, que em seu artigo 368, estabelece que “[s]e duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-se, até onde se compensarem”. Na hipótese de as partes do cumprimento de sentença possuírem, simultaneamente, a condição de credora e devedora uma da outra, o crédito de ambas deve ser apreciado e reconhecido pelo juízo de forma contemporânea, antes de se determinar que o pagamento seja efetuado por uma em favor da outra.
Nestas situações, a compensação não só é possível, como recomendada, afinal, deve ser assegurado ao devedor o direito de compensar o crédito que lhe foi exigido com aquele a que tem direito.
Eis, aqui, um ponto importante e que pode vir a ser negligenciado pelos credores e devedores simultâneos: a possibilidade de compensação dos créditos não depende de previsão no título executivo judicial e pode ser arguida pelo devedor, em sede de impugnação ao cumprimento de sentença, devendo, para tanto, indicar a natureza, o valor e a origem do crédito que possui.
A compensação de créditos, ainda que não prevista pelo título executivo judicial, possui amparo tanto na legislação vigente, quanto na jurisprudência pátria, que tem reconhecido o seguinte:
Nos termos do art. 368, do CC se duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-se, até onde se compensarem. Restando demonstrada a existência de débito do apelado segundo a perícia realizada na fase de liquidação, não existe óbice à compensação na fase de cumprimento de sentença, mesmo se ausente determinação nesse sentido na sentença executada. (TJMG, 9ª CACIV, Apelação Cível 1.0000.22.098534-5/001, Des. Amorim Siqueira, 06/07/2022).
[...] É possível a compensação de débitos entre autor e réu, nos termos do art. 368 do Código Civil, podendo tal medida ser requerida, inclusive, em fase de cumprimento de sentença, mesmo que inexistente pleito anterior. (TJMG, 13ª CACIV, Apelação Cível 1.0000.21.224725-8/001, Des. Rogério Medeiros, 20/03/2022)
[...] O acolhimento do pedido de compensação se mostra viável mediante prova, nos autos, da existência de saldo devedor e da apuração de seu montante. (TJMG, 9ª CACIV, Agravo de Instrumento 1.0000.21.019308-2/001, Des. Márcio Idalmo Santos Miranda, 16/11/2021)
[...] A compensação de créditos e débitos em sede de cumprimento de sentença deve ser arguida em impugnação, nos termos do art. 525 do Código de Processo Civil. (TJMG, 18ª CACIV, Agravo de Instrumento 1.0024.11.082672-4/011, Des. José Eustáquio Lucas Pereira, 09/11/2021)
Evidentemente, na hipótese de o crédito do executado ser superior ao crédito do exequente, entende-se que, ainda que aplicada a compensação entre eles, deve ser resguardada a exigibilidade do saldo remanescente, extinguindo-se o cumprimento de sentença, com resolução do mérito, nos termos do art. 924, II, do CPC (1). Quanto ao ponto, o TJMG também entende que a compensação gera a extinção do cumprimento de sentença, com resolução do mérito, na hipótese de satisfação da obrigação:
Apurando-se que o banco requerido, por meio da compensação de crédito e débito autorizada na sentença exequenda, quitou o débito que possuía junto ao autor, correta a extinção do cumprimento de sentença, haja vista a satisfação do crédito. (TJMG, 13ª CACIV, Apelação Cível 1.0000.22.053522-3/001, Des. Luiz Carlos Gomes da Mata, 18/07/2022)
Verifica-se, portanto, que a aplicação da compensação no cerne do cumprimento de sentença, além de ocasionar a sua extinção, afasta a esdrúxula e insuportável situação de o credor se ver compelido a “pagar” seu devedor, sem ter a certeza de que conseguirá satisfazer o seu crédito posteriormente.
Mais informações podem ser obtidas com a equipe de contencioso cível do VLF Advogados.
Diego Murça
Advogado da Equipe de Contencioso Cível do VLF Advogados
(1) Art. 924. Extingue-se a execução quando: [...] II - a obrigação for satisfeita.