The First Lady, série do Paramount, e Uma vida pequena, livro de Hanya Yanaguhara
Bruno Rabello e Rafhael Frattari
The First Lady, série do Paramount
Com tanta coisa para assistir nos serviços de streaming, costumo deixar de lado aquelas séries que não são aclamadas pela crítica. Afinal, a vida é muito curta para perder tempo com seriados meia-boca.
Vez ou outra, desvio dessa regra e acabo, por minha conta e risco, conferindo o que a crítica desprezou. Nem sempre me dou bem, mas gostei tanto de The First Lady (disponível para os assinantes do canal Paramount), que quis recomendá-la aqui.
São apenas dez episódios em que a vida de três Primeiras-Damas, seu background e sua influência sobre seus maridos são mostrados de forma intercalada, com a cronologia variando em cada episódio, sugerindo alguns diálogos interessantes. A grande estrela da série é Viola Davis (que também é uma das produtoras) interpretando Michele Obama. As outras duas retratadas são Betty Ford (Michele Pfeiffer, em um dos seus melhores papéis) e Eleanor Roosevelt (Gillian – Arquivo X, The Crown – Anderson).
Se é verdade que Viola Davis está caricata e não brilha como de costume, o mesmo não pode ser dito das outras duas atrizes principais, que interpretam personagens históricas com as quais não tivemos tanta familiaridade, mas fazem isso de forma absolutamente fascinante.
Adultério, alcoolismo, vício em analgésicos, relação homoafetiva, influência política, câncer, histórico familiar conturbado são alguns dos ingredientes dessa série que, a despeito do fracasso de crítica, merece muito ser descoberta e vista.
Recomendo demais.
Bruno Rabello
Procurador do Estado
Uma vida pequena, livro de Hanya Yanaguhara
O longo romance narra a vida dos amigos Willem, JB, Malcolm e Jude, que se estabelecem em Nova York depois da Universidade. Na verdade, como o livro aborda a infância de cada um deles, trata-se de uma história completa da vida dos quatro, um típico romance de formação americano.
Cada personagem é escrutinado em detalhes, mas numa escrita objetiva e clara. A narrativa do passado deles é alternada com o desenvolvimento das suas relações pessoais e profissionais, focada na vida dos quatro amigos: ator, artista plástico, arquiteto e advogado. Eles também são quase todos pretos, gays ou não. Enfim, um livro bastante atual, numa Nova York pulsante, que trata sobretudo da amizade, especialmente entre homens. Embora o livro não se exceda em descrições, as análises psicológicas dos personagens, inclusive dos secundários, são bastante ricas, profundas.
No meio da obra, o romance centra-se na figura de Jude, órfão que viveu a infância em um mosteiro e depois em um orfanato, e sofreu abusos que acabaram lhe custando a mobilidade nas pernas, o que lhe traz toda a sorte de traumas e limitações, psicológicas, inclusive. O livro se torna muito triste, mas isso não diminui em nada a sua beleza e sensibilidade. Os personagens são bem construídos, parecem ir se tornando cada vez mais reais ao longo do romance. A obra também é interessante formalmente, com alterações bacanas entre os narradores e capítulos que entrelaçam narrativas diversas, às vezes com perspectivas temporais alternadas.
Ao final das quase 800 páginas, mesmo diante do excesso de dor e sofrimento dos personagens, especialmente de Jude, tive o sentimento de que as coisas tristes que aparecem na obra pertencem à vida, ainda que com certo exagero, por certo. Mas toda essa dor nos lembra de que estamos vivos, no mundo real, e que a amizade é sempre uma possibilidade a nos amparar. Belíssimo livro.
Rafhael Frattari
Sócio da área Tributária do VLF Advogados