STJ julga Tema 1.111 e garante cobertura do seguro obrigatório nos acidentes que envolvem veículos agrícolas terrestres que trafegam em via pública, mesmo quando ocasionam acidente de trabalho
Guilherme Calais
Em outubro do ano passado, o Superior Tribunal de Justiça julgou o Tema Repetitivo 1.111 (Recursos Especiais nº 1937399/SP e REsp 1937399/SP) (1) e definiu que: (i) o sinistro ocasionado por veículo agrícola transitável em via terrestre está coberto pelo Seguro de Danos Pessoais por Veículos Automotores Terrestres ou “Seguro DPVAT”; e que (ii) a mera caracterização de acidente de trabalho com veículo voltado à atividade agrícola não excluiu a cobertura do seguro obrigatório.
O tema foi afetado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (“TJSP”) ainda em novembro de 2021, em duas ações indenizatórias movidas por vítimas de invalidez parcial permanente, nas quais a indenização pelo DPVAT havia sido negada sob a justificativa de que o sinistro teria sido ocasionado por trator agrícola e/ou que teria havido acidente de trabalho relacionado à atividade agrícola (2).
O DPVAT, também conhecido como “seguro obrigatório”, foi criado pela Lei nº 6.194/1974 (3), com o objetivo de garantir indenização mínima às vítimas de acidentes ocasionados por veículos automotores, independentemente de culpa ou da identificação do causador do dano. Até então, a Caixa Econômica Federal (Gestora do DPVAT) não havia incluído veículos agrícolas no rol de veículos com cobertura pelo DPVAT (4).
Apesar dessa circunstância, o STJ entendeu que os veículos agrícolas podem ser utilizados não só para transporte de carga em vias públicas, mas, ainda, para locomoção humana e, portanto, devem constar do rol. Em decorrência, os Ministros entenderam que o requisito essencial para concessão ao seguro obrigatório é a capacidade de o veículo agrícola transitar em vias públicas, seja em zona urbana ou rural. Estão excluídas, porém, as colheitadeiras de grande porte e veículos que trafegam sobre trilhos (trens e afins).
A 2ª Seção do STJ também entendeu que a cobertura pelo DPVAT deve ser assegurada mesmo que o acidente possa ser classificado, também, como acidente de trabalho, desde que presentes os elementos constituintes do seguro obrigatório (acidente ocasionado por veículo terrestre, do qual resultem danos pessoais, independentemente de culpa ou da identificação do causador do dano). O essencial é que o veículo seja o causador do dano, mesmo que não esteja em trânsito (5), e não mera concausa passiva do acidente (ex.: quando a vítima simplesmente cai de um automóvel inerte ou quando o veículo está na oficina para manutenção ou reparos). Ou seja, o simples fato de o sinistro ter ocasionado também um acidente de trabalho não exclui a cobertura do DPVAT se o veículo terrestre tiver causado danos pessoais.
É importante lembrar, por fim, que, “havendo condenação à reparação dos danos causados pelo acidente do trabalho, deverá ser deduzido o valor do seguro obrigatório da indenização judicialmente fixada” (Súmula 246/STJ). (6)
Interessou-se pelo tema? Mais informações podem ser obtidas com a equipe cível do VLF Advogados.
Guilherme Calais
Advogado da Equipe de Contencioso Cível do VLF Advogados
(1) Íntegra em: https://processo.stj.jus.br/processo/julgamento/eletronico/documento/mediado/?documento_tipo=integra&documento_sequencial=166329777®istro_numero=202101403497&peticao_numero=&publicacao_data=20221003&formato=PDF. Acesso em: 25 jan. 2023.
(2) Processo nº 1000093-76.2019.8.26.0390, originalmente em trâmite perante a Vara Única do Foro de Nova Granada/SP.
(3) A Lei nº 6.194, de 19 de dezembro de 1974, dispõe sobre Seguro Obrigatório de Danos Pessoais causados por veículos automotores de via terrestre, ou por sua carga, a pessoas transportadas ou não.
(4) Disponível em: https://www.caixa.gov.br/servicos/dpvat/perguntas-frequentes/Paginas/default.aspx. Acesso em: 25 jan. 2023.
(5) Neste sentido: REsp nº 1.187.311/MS, Rel. Ministro Massami Uyeda, Terceira Turma, DJe 28/9/2011; REsp nº 1.185.100/MS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 18/2/2011, e REsp nº 646.784/RS, Rel. p/ acórdão Ministro Castro Filho, Terceira Turma, DJ 1º/2/2006
(6) Nesse sentido: REsp nº 1.245.817/MG, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 14/3/2012.