A revogação do Decreto que previa a redução das alíquotas de PIS e COFINS incidentes sobre receitas financeiras e o respeito à noventena
Yuri Brizon
Em 30 de dezembro de 2022, foi publicado o Decreto nº 11.322/2022 (1), que alterou o Decreto nº 8.426/2015 (2) para reduzir as alíquotas da Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (“PIS/PASEP”) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (“COFINS”) incidentes sobre receitas financeiras auferidas pelas pessoas jurídicas sujeitas ao regime de apuração não-cumulativa.
Dessa forma, as alíquotas do PIS/PASEP e da COFINS que até então eram de 0,65% (sessenta e cinco centésimos por cento) e 4% (quatro por cento) passaram para 0,33% (trinta e três centésimos por cento) e 2% (dois por cento), respectivamente.
O Decreto nº 11.322/2022 entrou em vigor na data de sua publicação e previa a produção de efeitos a partir de 1º de janeiro de 2023.
Ocorre que o Decreto nº 11.374/2023 (3), publicado em 1º de janeiro de 2023, revogou o Decreto nº 11.322/2022, restabelecendo as alíquotas do PIS/PASEP e da COFINS anteriormente vigentes.
Por se tratar de majoração de alíquota de tributos, o referido Decreto somente poderia produzir efeitos decorridos 90 (noventa) dias de sua publicação, nos termos do art. 150, inciso III, alínea “c”, e art. 195, § 6º, ambos da Constituição da República de 1988 (4).
Em 2 de janeiro de 2023, após a cerimônia de transição de cargo, o recém-nomeado Ministro da Fazenda Fernando Haddad declarou que parte das medidas do decreto publicado no final do ano não poderiam ser imediatamente revogadas, indicando que a perda de arrecadação em virtude da cobrança somente poderia ser realizada após à noventena (5):
(A estimativa é) entre 10 e 15 bilhões, considerando o que nós imaginamos hoje que é irrecuperável, a não ser que haja uma suspensão das medidas pelo Judiciário. [...]
Nós temos problema jurídico para analisar. Tem algumas dúvidas sobre a questão da anterioridade e tem uma certeza sobre a questão da noventena, que é o tempo que você vai perder de arrecadação. De qualquer maneira o prejuízo está feito.
Todavia, o que parecia definido ganhou novo desdobramento quando a Advocacia Geral da União (“AGU”) ajuizou em 3 de fevereiro de 2023 a Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 84/DF perante o Supremo Tribunal Federal (“STF”) para afastar a noventena, bem como para suspender as decisões judiciais que asseguram a aplicação do desconto nas alíquotas de PIS e COFINS sobre receitas financeiras até abril de 2023 (6).
A AGU defende que (i) o novo Decreto não impôs aumento de tributo, apenas manteve as alíquotas vigentes desde 2015; e que (ii) o Decreto publicado em 30 de dezembro de 2022 não chegou a ser aplicado, pois previa o seu início no dia 1º de janeiro de 2023, quando foi assinado o novo texto. Portanto, não teria havido nem redução nem aumento do tributo.
Apesar de o STF já ter firmado o entendimento de que a majoração da contribuição ao PIS/PASEP ou da COFINS por meio de decreto autorizado submete-se à anterioridade nonagesimal, quando do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5.277/DF (5), é difícil prever o que será decidido em relação a esse caso, em virtude de suas peculiaridades.
Embora seja arriscado prever o entendimento que será adotado pelo STF (8), é seguro dizer que há grande risco de autuação para o contribuinte que deixar de oferecer suas receitas financeiras à tributação dessas contribuições, haja vista o posicionamento adotado pela AGU.
Portanto, recomenda-se a propositura de medida judicial para assegurar o direito à redução das alíquotas em respeito à anterioridade nonagesimal.
Para mais informações, procure nossa equipe tributária.
Yuri Brizon
Advogado da Equipe de Direito Tributário do VLF Advogados
(1) BRASIL. Decreto nº 11.322, de 30 de dezembro de 2022. Altera Decreto nº 8.426, de 1º de abril de 2015, que restabelece as alíquotas da Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público - PIS/PASEP e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - COFINS incidentes sobre receitas financeiras auferidas pelas pessoas jurídicas sujeitas ao regime de apuração não-cumulativa das referidas contribuições. Brasília, 30 dez. 2022. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2022/decreto/d11322.htm. Acesso em: 23 fev. 2023.
(2) BRASIL. Decreto nº 8.426, de 1º de abril de 2015. Restabelece as alíquotas da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS incidentes sobre receitas financeiras auferidas pelas pessoas jurídicas sujeitas ao regime de apuração não-cumulativa das referidas contribuições. Brasília, 1º abr. 2015. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/decreto/d8426.htm. Acesso em: 23 fev. 2023.
(3) BRASIL. Decreto nº 11.374, de 01 de janeiro de 2023. Revoga decretos, revigora dispositivos e repristina redações. Brasília, 2 jan. 2023. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2023/decreto/D11374.htm. Acesso em: 23 fev. 2023.
(4) BRASIL. (Constituição (1988)). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidente da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em 23 fev. 2023.
(5) RIVEIRA, Carolina. Haddad estima perda de R$ 10 a R$ 15 bilhões com decretos de Mourão: no apagar das luzes do mandato, o governo Bolsonaro assinou prorrogação de desonerações e incentivos que o novo governo não pode revogar imediatamente. Exame. 2 jan. 2023. Disponível em: https://exame.com/economia/haddad-estima-perda-de-r-10-a-15-bilhoes-com-decretos-de-mourao/. Acesso em: 23 fev. 2023.
(6) AGU pede ao Supremo que reconheça constitucionalidade de decreto que disciplinou alíquotas de PIS/PASEP e COFINS: objetivo é evitar multiplicação de processos na justiça. 3 fev. 2023. Disponível em: https://www.gov.br/agu/pt-br/comunicacao/noticias/agu-pede-ao-supremo-que-reconheca-constitucionalidade-de-decreto-que-disciplinou-aliquotas-de-pis-pasep-e-cofins. Acesso em: 23 fev. 2023.
(7) ADI 5277, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 10/12/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-057 DIVULG 24-03-2021 PUBLIC 25-03-2021.
(8) ALVARENGA NETO, Roberto Junqueira de; GOMES, André Luiz de Souza Silva. A anterioridade e o PIS/Cofins-receitas financeiras: a regra é clara? Consultor Jurídico. 22 fev. 2023. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2023-fev-22/neto-gomes-anterioridade-piscofins-receitas-financeiras. Acesso em: 23 fev. 2023.
(9) MOLINARI, Flávio Miranda. O pragmatismo tributário na balança e a modulação de efeitos no STF. Consultor Jurídico. 3 jan. 2022. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2022-jan-03/molinari-pragmatismo-tributario-modulacao-efeitos-stf. Acesso em: 23 fev. 2023.