Empregada gestante x Contrato de trabalho temporário
Leilaine de Melo Vieira Queiroz
O Tribunal Superior do Trabalho (“TST”), por meio da súmula 244, item III, firmou entendimento de que a empregada gestante tem direito à estabilidade provisória, mesmo na hipótese de admissão mediante contrato por tempo determinado. Ocorre que esse entendimento não tem sido estendido às empregadas que descobrem a gravidez no curso do trabalho temporário, diante das peculiaridades dessa modalidade de contratação.
Nesse sentido, surge a dúvida: a empregada gestante contratada pela modalidade de trabalho temporário tem direito a estabilidade?
Antes, entretanto, é importante destacar a diferença entre contrato de trabalho por tempo determinado e o contrato de trabalho temporário.
O contrato de trabalho por tempo determinado possui previsão no art. 443 da CLT, sendo que essa modalidade de contratação se caracteriza por possuir prazo máximo de duração de dois anos, motivado por razões estabelecidas no §2º do referido artigo (1), que prevê que o contrato por prazo determinado será válido nos casos de serviço de natureza transitória, de atividades empresariais de caráter transitório e no contrato de experiência.
Já o contrato de trabalho temporário é regido por lei própria (Lei nº 6.019/1974), sendo que este tipo de modalidade contratual é utilizado para atender à necessidade de substituição transitória de pessoal permanente ou à demanda complementar de serviços.
Nos termos do art. 10 da Lei nº 6.019/1974 (2), há previsão expressa sobre a inexistência de vínculo empregatício entre a empresa e o trabalhador temporário, bem como a previsão do prazo desta modalidade que é de 180 dias.
Feita a distinção dos tipos de contratos, há o questionamento se a empregada que descobre uma gestação no curso do contrato temporário tem direito a estabilidade.
De acordo com a legislação que trata sobre a contratação temporária, não há brechas para que seja reconhecida a estabilidade, uma vez que o §5º do art. 10 da referida lei prevê que “o trabalhador temporário que cumprir o período estipulado nos §§1º e 2º deste artigo somente poderá ser colocado à disposição da mesma tomadora de serviços em novo contrato temporário, após noventa dias do término do contrato anterior”.
Nesse sentido, em julgado recente proferido pelo juiz Alexandre Reis Pereira de Barros (processo 0010924-98.2021.5.03.0075), titular da 1ª Vara do Trabalho de Pouso Alegre/MG, afastou o direito à estabilidade no emprego pretendido por gestante admitida por contrato de trabalho temporário, nos termos da Lei nº 6.019/1974.
Segundo o magistrado,
a própria Lei 6.019/74, com as alterações promovidas pela Lei nº 13.429/2017, esclarece que o trabalhador temporário que laborar pelo prazo máximo legal, contadas as prorrogações previstas no diploma, somente pode ser colocado à disposição do mesmo tomador dos serviços após noventa dias do encerramento do contrato anterior (cf. art. 10, § 5º, da Lei nº 6.019 /1974), restrição esta que não existe nas mencionadas modalidades de contrato por prazo determinado e que evidencia, uma vez mais, a incompatibilidade do sistema de trabalho temporário com qualquer hipótese de prorrogação do contrato para além dos prazos fixados em lei.
O magistrado ainda ressaltou que
conforme registrado no julgamento do Incidente de Assunção de Competência nº 0005639-31.2013.512.0051, o próprio Pleno do Tribunal Superior do Trabalho ressaltou que o E. Supremo Tribunal Federal ainda não se manifestou a respeito da matéria em questão, uma vez que, nos precedentes julgados pela Suprema Corte, não houve exame sobre a aplicabilidade da garantia à gestante ao trabalhador contratado no regime da Lei nº 6.019/1974, mas às contratações precárias da Administração Pública, a exemplo das ocupantes de cargos em comissão (demissíveis ad nutum) ou das contratações administrativas em regime emergencial temporário. Logo, também por tal fundamento, fica afastada a incidência do entendimento constante do item III da Súmula 244 do TST.
Veja-se que o magistrado afastou o pedido feito pela empregada naqueles autos no que diz respeito à aplicação do entendimento previsto no item III da Súmula 244 do TST, uma vez que a exceção prevista na referida súmula se aplica ao empregado admitido pela modalidade de contrato por prazo determinado, o que não se assemelha à contratação na modalidade de trabalho temporário.
Com base nos artigos supracitados e no texto da súmula do TST, a conclusão que se chega nesse momento (podendo ser modificada até declaração posterior do STF) é que não se aplica a estabilidade provisória da empregada gestante, cujo contrato seja regido pela Lei nº 6.019/1974, diante das peculiaridades previstas na lei.
Leilaine de Melo Vieira Queiroz
Advogada da Equipe Trabalhista do VLF Advogados
(1) § 2º - O contrato por prazo determinado só será válido em se tratando: (Incluído pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)
a) de serviço cuja natureza ou transitoriedade justifique a predeterminação do prazo; (Incluída pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)
b) de atividades empresariais de caráter transitório; (Incluída pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)
c) de contrato de experiência.
(2) Art. 10. Qualquer que seja o ramo da empresa tomadora de serviços, não existe vínculo de emprego entre ela e os trabalhadores contratados pelas empresas de trabalho temporário. (Redação dada pela Lei nº 13.429, de 2017)
§ 1o O contrato de trabalho temporário, com relação ao mesmo empregador, não poderá exceder ao prazo de cento e oitenta dias, consecutivos ou não. (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017)
§ 2o O contrato poderá ser prorrogado por até noventa dias, consecutivos ou não, além do prazo estabelecido no § 1o deste artigo, quando comprovada a manutenção das condições que o ensejaram.