Aos Prantos no Mercado, livro de Michelle Zauner, e Ruptura, série da Apple TV+
Alexandre Bianchini e Katryn Rocha
Aos Prantos no Mercado, livro de Michelle Zauner
“Desde que minha mãe morreu, eu choro no mercado H Mart”, abertura de Aos Prantos no Mercado nos remete ao icônico início de O Estrangeiro, de Albert Camus: “Hoje, mamãe morreu. Ou talvez ontem, não sei bem”.
No entanto, se O Estrangeiro trata, entre outros, de um estrangeirismo metafórico e do sentimento de alienação da sociedade por Meursault, e sua conseguinte indiferença ao mundo, Aos Prantos no Mercado é um relato vivo e atual sobre o luto pela perda da mãe e uma reflexão sobre o lugar que ocupamos no mundo.
O “H Mart” é uma rede de supermercados especializada em comida asiática; filha de mãe sul-coreana e pai norte-americano, Michelle Zauner narra como é ser criada no interior dos Estados Unidos com a sensação de pertencer a outro lugar, e como sua mãe auxiliou na criação da identidade própria, principalmente a partir de tradições sul-coreanas.
No entanto, todo esse processo é analisado a partir da morte de sua mãe, passando também pelos estágios de sua carreira profissional, que foi de garçonete à cantora, com relativa fama. O livro é narrado em primeira pessoa, sem esconder qualquer emoção que a autora sentiu nos momentos descritos, em oposição à notória indiferença de Meursualt.
A leitura é rápida e vale a pena para quem deseja refletir sobre luto e o sentimento (não metafórico) de pertencimento. Não bastasse, vale notar que entrou na tradicional lista de livros indicados por Barack Obama de 2021.
Alexandre Bianchini
Advogado da Equipe de Consultoria do VLF Advogados
Ruptura, série da Apple TV+
Imagine uma realidade em que megacorporações mundiais exercem controle total e absoluto sobre seus funcionários e podem fazer o que bem quiserem sem nenhuma regulamentação. Onde trabalhadores são mantidos distantes uns dos outros, fazendo apenas parte do processo, mas completamente alheios ao produto final e sequer têm memória do que se passou durante o período de trabalho. Esta leve extrapolação da nossa realidade serve de premissa para a série Ruptura, criada por Dan Erickson.
Na primeira temporada, acompanhamos o protagonista Mark Scoutt (Adam Scott), funcionário das Indústrias Lumon que concorda em fazer o procedimento de “ruptura”, em que suas memórias do trabalho são separadas das memórias da vida pessoal, e que por isso leva uma existência dividida: quando está fora do trabalho é um homem depressivo e alcoólatra, incapaz de se recuperar da perda de sua esposa dois anos antes, mas durante as horas de trabalho, e graças ao procedimento, ele é Mark S., um líder eficiente e dedicado do departamento de Refinamento de Macrodados.
O que num primeiro momento parece uma ideia atraente para atender à necessidade de separação e equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, com a aparição de um amigo de trabalho de Mark S., Petey (Yul Vazquez), que aparentemente foi demitido, à porta de Mark Scoutt dizendo que conseguiu fazer o procedimento de reintegração para juntar novamente as duas existências, os dois tipos de memória, Mark se vê dividido entre as responsabilidades como um novo chefe do setor e investigar as práticas misteriosas da Lumon, para entender o que de fato acontece na empresa.
De todos os mistérios da série, entretanto, e há muitos, talvez o maior deles seja o fato de a maioria dos episódios serem dirigidos por Ben Stiller. Embora o comediante tenha experiência com direção, como nos filmes Zoolander e Trovão Tropical, a série com ares distópicos Ruptura destoa positivamente de tudo que ele fez anteriormente. Com 14 indicações ao Emmy, inclusive de Melhor Série de Drama e pela atuação de Adam Scott assim como de outros integrantes do elenco estelar John Turturro, Christopher Walken e Patricia Arquette, Ruptura inegavelmente foi uma das melhores produções de 2022.
Ainda sem data de estreia para a segunda temporada, a série está disponível na Apple TV+.
Katryn Rocha
Auxiliar de Comunicação do VLF Advogados