Procedimentos Especiais de Jurisdição Voluntária no Novo CPC (Parte 2)
Leonardo Wykrota
Notificação e interpelação (arts. 726 a 729)
As notificações e interpelações são medidas destinadas a permitir que a parte manifeste formalmente sua vontade a respeito de assunto “juridicamente relevante” junto aos participantes de uma mesma relação jurídica (art. 726, NCPC). As notificações se prestam à comprovação solene de determinada declaração de vontade feita pela parte interessada, na qual, em regra, se estipula prazo e pena à outrem, para que este faça ou deixe de fazer algo (art. 726, NCPC) (1). Já as interpelações servem ao credor que pretende constituir o devedor em mora, relativamente ao cumprimento de determinada obrigação (2).
O Novo Código corrige o equívoco de seu antecessor que antes tratava as notificações no âmbito das cautelares específicas, em Seção intitulada “Dos Protestos, Notificações e Interpelações” (arts. 867 a 873, CPC/1973). Na esteira da boa doutrina (3), as notificações e interpelações passam a ser tratadas no âmbito dos procedimentos especiais (arts. 726 a 729).
O protesto, do mesmo modo, sendo medida destinada à comprovação ou documentação de intenção do promovente (4), embora não tenha tratamento detalhado como acontecia no Código anterior, rege-se pelas disposições gerais dos procedimentos especiais, com aplicação subsidiária das normas que regulam as notificações e interpelações (art. 726, § 2.º, NCPC).
À exceção da necessidade de devolução dos autos (art. 729, NCPC) e das hipóteses de audiência prévia do requerido (art. 728, NCPC), o Novo Código não traz um procedimento de todo específico para as notificações e interpelações, de modo que estas serão processadas, no mais, segundo as disposições gerais já tratadas anteriormente (art. 719, NCPC).
Além disso, vale anotar que, no Código anterior, tanto o protesto quanto as notificações e interpelações não admitiam resposta nos mesmos autos (art. 871, CPC/1973). O Novo Código, contudo, inova ao determinar a audiência prévia do requerido antes do deferimento da notificação ou do respectivo edital, nas hipóteses de: (i) suspeita de obtenção de um fim ilícito com a notificação; requerimento de averbação da notificação em registro público (art. 728, NCPC). Ainda segundo o Novo Código, os protestos, notificações e interpelações que pretendam dar ciência geral ao público por meio da publicação de edital somente serão deferidos nos casos em que tal publicação for tida pelo magistrado como “fundada e necessária ao resguardo de direito” (art. 726, § 1.º, NCPC).
A alienação judicial (art. 730)
O Código anterior previa a alienação judicial no âmbito dos procedimentos especiais para (a) evitar os problemas de deterioração, custo de guarda ou avaria de bens constritos (art. 1.113, CPC/1973); bem como para (b) resguardar o interesse de incapazes (art. 1.117, III, CPC/1973); ou (c) tratar de outras situações em que a venda fosse necessária pelo desacordo entre as partes sobre a forma de disposição do bem, como ocorre na extinção de condomínio sobre coisas indivisíveis (art. 1.117, I e II, CPC/1973). O Novo Código, por sua vez, reúne essas hipóteses em torno do desacordo entre os interessados a respeito do modo de alienação de determinado bem (art. 730, NCPC). É certo que a primeira hipótese tratada no Código anterior tem natureza cautelar e, por isso, poderia ser encampada pelo art. 301 (5) do NCPC, mas a alienação judicial, salvo melhor juízo, continua sendo o modo idôneo para a parte se acautelar contra tais circunstâncias (6).
A despeito do silêncio do legislador a respeito do assunto, parece mais sensato admitir a alienação como procedimento autônomo e como procedimento incidente no curso de determinado processo, encampando a doutrina unânime em relação à legislação anterior (7). Mesmo com a eliminação das disposições especiais havidas na legislação anterior, os princípios da celeridade e da economia processual autorizam supor a manutenção da possibilidade de alienação judicial no curso do próprio processo (8).
Seja em procedimento autônomo ou no curso do processo, a alienação judicial pode ocorrer de ofício, por iniciativa dos interessados ou, ainda, do depositário e a ela se aplicam, no que for cabível, as disposições gerais dos procedimentos de jurisdição voluntária (art. 719, NCPC), bem como as disposições sobre alienação no procedimento executivo (art. 879 a 903, NCPC).
Essa circunstância de aplicação supletiva das normas do procedimento executivo, porém, não deve confundir o pressuposto que orienta a alienação judicial em cada um dos casos: no âmbito dos procedimentos especiais, como visto, quer-se atender a um propósito acautelatório ou resolver o desacordo sobre o modo de alienação de bens particulares; já na alienação havida no procedimento executivo, o que se faz é implementar a atividade substitutiva do Estado-Juiz de modo a preparar a satisfação de determinado crédito.
Leonardo Wykrota
Sócio responsável pela equipe de Contencioso Cível do VLF Advogados.
(1) THEODORO JR., Humberto. Curso de direito processual civil. Rio de Janeiro: Forense, 1997. v. II, p. 519
(2) CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 17. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. v. I, p. 203.
(3) Por todos, cf. SILVA, Ovídio Baptista da. Do processo cautelar. Rio de Janeiro: Forense, 1996. p. 459.
(4) THEODORO JR., Humberto. Curso de direito processual civil. Rio de Janeiro: Forense, 1997. v. II, p. 518. O Código anterior tratava o protesto como medida destinada àquele que pretendesse “(...) prevenir responsabilidade, prover a conservação e ressalva de seus direitos ou manifestar qualquer intenção de modo forma” (art. 867, CPC/1973).
(5) Art. 301. A tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito.
(6) Exemplo típico se dá com a alienação prevista no art. 742, do NCPC, segundo o qual: “O juiz poderá autorizar a alienação: I – de bens móveis, se forem de conservação difícil ou dispendiosa; II – de semoventes, quando não empregados na exploração de alguma indústria; III – de títulos e papéis de crédito, havendo fundado receio de depreciação; (...) V – de bens imóveis: a) se ameaçarem ruína, não convindo a reparação (...)”.
(7) Cf., por todos, Alexandre Freitas Câmara, para quem a alienação prevista nos arts. 1.113 a 1.119 do CPC/1973 é “(...) procedimento a ser utilizado para a alienação judicial no curso do processo (já que a alienação judicial com procedimento autônomo segue o procedimento comum da jurisdição voluntária, por força do disposto no art. 1.112, III a V, do CPC)” (Lições de direito processual civil. 17. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. v. I, p. 495).
(8) Pense-se, por exemplo, nas alienações eventualmente necessárias no curso de um inventário, ou na pendência de processo que acabe por instituir condomínio sobre coisa indivisível. Será bem mais prática a alienação sem a necessidade de se instaurar novo procedimento autônomo.