Os métodos/critérios para os contratos de rateio de despesas e custos sob a ótica da Administração Pública e do Poder Judiciário
Rafhael Frattari e Giovanna Villegas
Alberto Xavier é autor fundamental para a análise dos contratos de CSA, já que foi, inclusive, citado por mais de sete Soluções de Consulta da Receita Federal do Brasil (“RFB”) e inúmeros acórdãos do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (“CARF”). Para o Professor português:
Os contratos de compartilhamento de custos são contratos inominados celebrados entre duas ou mais empresas (via de regra integradas num mesmo grupo econômico) pelo qual uma ou mais empresas ("comparticipantes") se obrigam a assumir uma quota-parte dos custos necessários à fruição de bens ou direitos ou à realização de atividades do interesse comum de todos, sendo que os custos inerentes a essa fruição ou exercício são incorridos apenas por uma (Centro de Custos), à qual é exclusivamente imputável a obrigação do respectivo pagamento, por ela realizado em nome próprio (1).
No Brasil, considera-se o contrato de compartilhamento de despesas como atípico, eis que inexiste legislação civil que determine seus elementos. Por meio dele, uma “empresa-mãe” (ou simplesmente centro de custo) assume determinadas despesas e custos – que não sejam relacionadas ao objeto social de nenhuma delas – e os centraliza, rateando antecipadamente (adiantamento) ou posteriormente (reembolso) entre as demais sociedades do grupo (sociedades relacionadas). Entre as despesas comuns a esses contratos estão com pessoal administrativo, de apoio jurídico, de tecnologia da informação etc. Também o legislador tributário não tratou dos efeitos decorrentes a utilização dos contratos de compartilhamento de despesas e custos.
Assim, é importante ao direito tributário analisar a substância desses contratos, cotejando-a com os fatos geradores dos tributos que poderiam relacionarem-se com a realidade econômica subjacente. De todo modo, caso seja configurado o efetivo rateio de custos e despesas, é certo que a adoção dos contratos de cost sharing deve ser neutra, em termos tributários.
É dizer que, se efetivamente estiver diante de reembolsos/antecipações recebidos pela sociedade-mãe (responsável pela realização das despesas), esses valores não poderão ser alcançados pela tributação, seja pelo imposto de renda, seja pelas contribuições para o PIS/Cofins, ou ainda pelo imposto sobre serviços. É que neste caso ocorre mera recomposição de patrimônio (não há acréscimo patrimonial) (2), que não pode ser considerada como receita (pois não há potencial para a geração de acréscimo) (3), e muito menos enseja a caracterização de uma prestação de serviço típica (ausência de intuito lucrativo e atividade distinta do objeto social das empresas, já que atividades-meio).
Embora essas consequências tributárias sejam relativamente óbvias, ante a ausência de legislação expressa sobre o assunto, a Receita Federal passou a descrever os elementos/requisitos que deveriam caracterizar os contratos de compartilhamento de despesas e custos.
Nestes termos, é possível identificar várias manifestações da RFB, a começar pela Solução de Consulta nº 08/2012, em que são tratados os requisitos/elementos para a configuração do CSA:
ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA - IRPJ. RATEIO DE CUSTOS E DESPESAS ENTRE EMPRESAS DO MESMO GRUPO ECONÔMICO. DEDUTIBILIDADE. São dedutíveis as despesas administrativas rateadas se: a) comprovadamente corresponderem a bens e serviços efetivamente pagos e recebidos; b) forem necessárias, usuais e normais nas atividades das empresas; c) o rateio se der mediante critérios razoáveis e objetivos, previamente ajustados, devidamente formalizados por instrumento firmado entre os intervenientes; d) o critério de rateio for consistente com o efetivo gasto de cada empresa e com o preço global pago pelos bens e serviços, em observância aos princípios gerais de Contabilidade; e) a empresa centralizadora da operação de aquisição de bens e serviços apropriar como despesa tão somente a parcela que lhe couber segundo o critério de rateio.
Em 2013, houve a publicação da Solução de Divergência COSIT nº 23/2013, que reafirmou tais requisitos, discutindo a repercussão da utilização desses contratos nas Contribuições para o PIS/Confins:
ASSUNTO: NORMAS GERAIS DE DIREITO TRIBUTÁRIO EMENTA: É possível a concentração, em uma única empresa, do controle dos gastos referentes a departamentos de apoio administrativo centralizados, para posterior rateio dos custos e despesas administrativos comuns entre empresas que não a mantenedora da estrutura administrativa concentrada. Para que os valores movimentados em razão do citado rateio de custos e despesas sejam dedutíveis do IRPJ, exige-se que correspondam a custos e despesas necessárias, normais e usuais, devidamente comprovadas e pagas; que sejam calculados com base em critérios de rateio razoáveis e objetivos, previamente ajustados, formalizados por instrumento firmado entre os intervenientes; que correspondam ao efetivo gasto de cada empresa e ao preço global pago pelos bens e serviços; que a empresa centralizadora da operação aproprie como despesa tão-somente a parcela que lhe cabe de acordo com o critério de rateio, assim como devem proceder de forma idêntica as empresas descentralizadas beneficiárias dos bens e serviços, e contabilize as parcelas a serem ressarcidas como direitos de créditos a recuperar; e, finalmente, que seja mantida escrituração destacada de todos os atos diretamente relacionados com o rateio das despesas administrativas. Relativamente à Contribuição para o PIS/Pasep e à Cofins, observadas as exigências estabelecidas no item anterior para regularidade do rateio de dispêndios em estudo: a) os valores auferidos pela pessoa jurídica centralizadora das atividades compartilhadas como reembolso das demais pessoas jurídicas integrantes do grupo econômico pelo pagamento dos dispêndios comuns não integram a base de cálculo das contribuições em lume apurada pela pessoa jurídica centralizadora; b) a apuração de eventuais créditos da não cumulatividade das mencionadas contribuições deve ser efetuada individualizadamente em cada pessoa jurídica integrante do grupo econômico, com base na parcela do rateio de dispêndios que lhe foi imputada; c) o rateio de dispêndios comuns deve discriminar os itens integrantes da parcela imputada a cada pessoa jurídica integrante do grupo econômico para permitir a identificação dos itens de dispêndio que geram para a pessoa jurídica que os suporta direito de creditamento, nos termos da legislação correlata. DISPOSITIVOS LEGAIS: arts. 251 e 299, Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999; art. 123 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (CTN); arts. 2º e 3º da Lei nº 9.718, de 27 de novembro de 1998; art. 1º da Lei nº 10.637, de 30 de dezembro de 2002; e art. 1º da Lei nº 10.833, de 29 de dezembro de 2003.
Em setembro de 2021, é publicada mais uma Solução COSIT, de número 149/2021:
ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA - IRPJ REEMBOLSO. RATEIO DE CUSTOS E DESPESAS. EMPRESAS LIGADAS. LUCRO PRESUMIDO. RECEITA BRUTA. São considerados reembolsos, os valores recebidos por pessoa jurídica centralizadora relativos a contratos de rateio de custos e despesas das demais pessoas jurídicas ligadas, desde que: a) as despesas reembolsadas comprovadamente correspondam a bens e serviços recebidos e efetivamente pagos; b) as despesas objeto de reembolso sejam necessárias, usuais e normais nas atividades das empresas; c) o rateio se realize através de critérios razoáveis e objetivos, previamente ajustados, devidamente formalizados por instrumento firmado entre os intervenientes; d) o critério de rateio esteja de acordo com o efetivo gasto de cada empresa e com o preço global pago pelos bens e serviços, em observância aos princípios técnicos ditados pela Contabilidade; e) a empresa centralizadora da operação de aquisição de bens e serviços aproprie como despesa tão-somente a parcela que lhe cabe de acordo com o critério de rateio, assim como deverão proceder de forma idêntica as empresas descentralizadas beneficiárias dos bens e serviços, e contabilizar as parcelas a serem ressarcidas como direitos de créditos a recuperar, orientando a operação conforme os princípios técnicos ditados pela Contabilidade. f) a empresa centralizadora da operação de aquisição de bens e serviços, assim como as empresas descentralizadas, mantenham escrituração destacada de todos os atos diretamente relacionados com o rateio das despesas administrativas; g) não haja qualquer margem de lucro no reembolso; h) não configure pagamento por serviços prestados pela empresa centralizadora. Solução de Consulta n.º 149 Cosit Fls. 2 2 Os reembolsos auferidos pela pessoa jurídica centralizadora decorrente do rateio de custos e despesas, desde que cumpridas as condições do item anterior, não são considerados receitas para fins do IRPJ apurado com base no lucro presumido. Dispositivos Legais: Lei nº 9.430, de 1996, art. 25; Lei nº 9.249, de 1995, art. 15; Decreto-lei nº 1.598, de 1977, art. 12. SOLUÇÃO DE CONSULTA PARCIALMENTE VINCULADA À SOLUÇÃO DE DIVERGÊNCIA COSIT Nº 23 DE 23 DE SETEMBRO DE 2013.
Assim, as orientações da RFB perfiladas nas Soluções de Consulta foram responsáveis por determinar os requisitos para que os CSA pudessem gerar a neutralidade tributária deles esperada (4).
No entanto, em relação à escolha dos possíveis métodos/critérios de rateio, as orientações da RFB foram vagas, limitando-se a exigir aos valores rateados “que sejam calculados com base em critérios de rateio razoáveis e objetivos, previamente ajustados, formalizados por instrumento firmado entre os intervenientes”, como se percebe de todas as manifestações colacionadas acima.
A partir dessa expressão, é possível afirmar que a regra de rateio deve ser razoável, o que exige que ela seja justificável diante dos experts e não cause qualquer sentimento de inadequação. Também é importante que o critério seja objetivo, não dependa de sentimentos pessoais ou subjetivos e possa ser aferido por qualquer pessoa com o mínimo de habilidade técnica, do mesmo modo. Então, o critério deve ser previamente determinado entre os contratantes e formalizado em instrumento próprio e prévio.
No entanto, não é difícil perceber que a afirmação de que o método/critério utilizado deva ser razoável e objetivo ainda abre um leque imenso de opções. Exatamente pela ausência de legislação e pela indeterminação linguística dos termos utilizados nas manifestações da RFB, ainda há questionamentos sobre o critério para o rateio, na ordem jurídica brasileira, como explica Ana Carolina Salvador Groninguer:
A OCDE admite a utilização de vários critérios de rateio, dentre eles: faturamento ou lucro das empresas; número de empregados; unidades produzidas, utilizadas ou vendidas etc.
No Brasil, porém, esses critérios não são comumente aceitos e, portanto, as empresas acabam tendo que se valer de um critério pouco prático e de difícil mensuração: o critério hora/homem. É extremamente difícil, no dia a dia operacional, mensurar esse valor, afinal, ele varia conforme a atividade prestada; o perfil do profissional; o pacote de sua remuneração; a localidade onde o profissional se encontra etc., sem contar a dificuldade de realizar o controle e a gestão das horas incorridas para desempenhar uma atividade em favor das demais empresas do grupo.
De fato, os Guidelines da OCDE parecem permitir critérios amplos de rateio, porque também esses Documentos consideram um conteúdo também amplo para os contratos de compartilhamento de custo (5) (com diversos tipos).
O fato é que, em regra, a doutrina afirma existirem métodos diretos para a determinação do rateio de despesas e custos e métodos indiretos (6). Os primeiros buscam identificar a relação por atividades específicas e concretas efetivamente realizadas em prol de cada uma das sociedades, já os segundos partem da premissa de que há serviços e benefícios que são necessariamente coletivos e gerais, que não trazem benefícios apenas para a sociedade que os utiliza, quando geram, por exemplo, conhecimento e experiência que são compartilhados por todos os integrantes do grupo.
Entre nós, a maior parte da doutrina tem sugerido a adoção de critérios diretos de rateio, sempre que possível, dos quais a medição por timesheet (7) tem sido a mais indicada para o trabalho humano, por exemplo. Desaconselham, por sua vez, a utilização de critérios indiretos, como o faturamento ou a produção, como único índice.
Pela análise da jurisprudência do CARF, percebe-se que a maioria das empresas (pelo menos as autuadas pela RFB) tem escolhido métodos diretos, buscando se aproximar do efetivo custo de cada empresa para o Contrato de Compartilhamento (Acórdãos nº 101-96.525, 1801-00.821, 9101¬001.878, 9101¬002.202, 9101-003.003, 9101-004.300 e 1201-003.691). Assim, a análise dos acórdãos citados indica uma preferência pelo método direto.
De outro lado, a simples existência das discussões demonstra que as empresas têm tido dificuldade em gerir de maneira adequada os contratos de rateio de despesas e de custos.
É que em todos esses casos mencionados, a fiscalização desconsiderou o CSA, porque afirmou que não haveria comprovação suficiente da realização das despesas, do controle de seu quantitativo ou de sua necessidade para as sociedades envolvidas. Assim, foram questionados os compartilhamentos como um todo, em regra, pelo argumento de que eles não poderiam sequer ser analisados, diante da falta de informações, de registros etc.
Assim, na maior parte dos casos analisados no CARF, estava-se diante de métodos diretos, muitas vezes diferentes para cada despesa aferida. Sem dúvida, a utilização desses métodos torna mais real o rateio, de acordo com a exigência feita por cada sociedade participante. De outro lado, é inegável que tais métodos parecem trazer mais problemas de gestão para os contribuintes que os adotam, afinal trabalham com mais indicadores.
Curiosamente, em quase todos esses casos, os auditores fiscais utilizaram métodos indiretos para balizar a exigência fiscal decorrente das autuações, com base no faturamento ou receita líquida, como exemplifica as decisões abaixo, cujo raciocínio, no entanto, aparece em outras autuações:
Por sua vez, o critério adotado na decisão de primeira instância, tendo por base a receita líquida de vendas de cada empresa do conglomerado – como ficou demonstrado no Quadro anexo à decisão – se mostra adequado (Acórdão n. 101-93.013, Jezer de Oliveira Cândido, julgado em 16/03/2000)
Embora entenda que a utilização de qualquer parâmetro para rateio sempre ficará distante da realidade, na hipótese vertente, tratando-se de empresas financeiras que utilizam estruturas físicas, operacionais e de pessoal, em comum, o rateio mais coerente talvez fôsse aquele feito em função das receitas operacionais apuradas no período-base, o que, considerando os demonstrativos de fls. 246 a 251, conduziria a percentual semelhante ao que foi adotado pela autoridade julgadora de primeira instância (em torno de 14%) (Acórdão n. 101-91.47, Jezer de Oliveira Cândido, julgado em 15/10/1997)
A adoção de métodos indiretos (como o volume do faturamento) também é aceita pelo Fisco, como indicam trechos de decisões do próprio CARF, conforme se verifica no acórdão nº 101-96.525, quando cita o voto da Conselheira Sandra Maria Faroni em caso semelhante:
Efetivamente, o fisco não nega a licitude de convênios para repartição de custos entre empresas do mesmo grupo, objetivando mais eficiência. O Termo de Constatação, reportando-se a doutrina sobre o tema, menciona que critério de rateio dos custos/despesas pode seguir o método direto e o método indireto. No primeiro (método direto), o rateio é feito de acordo com a quantidade efetiva atribuível a cada um participante, apurável em planilhas nas quais a apropriação dos custos dos homens/hora, das máquinas/equipamentos, etc, observa sua utilização efetiva. No segundo (método indireto) não há uma relação efetiva entre o custo do serviço utilizado e sua remuneração em função do benefício recebido, aplicando-se uma proporcionalização com base em determinado parâmetro, sendo o mais utilizado o volume de faturamento (Sandra Maria Faroni – Acórdão n. 101-95.791, de 18.10.2006)
A análise dos acórdãos administrativos sugere que a questão para a RFB é menos “conceitual”, sobre qual o critério ou método utilizado, do que pragmática, sobre os elementos e informações relacionados como rateio. Ou seja, as maiores polêmicas no CARF giram em torno da efetiva realização da despesa, da qualidade das informações sobre os critérios de rateio para indicar os valores de reembolso, da contabilização adequada e da sua necessidade. Em outros termos, a questão probatória tem sido mais debatida sobre o rateio de custos do que a própria escolha do critério para a divisão.
Numa linha semelhante ao CARF, parece que também o Judiciário não tem dado muita atenção ao critério de rateio utilizado, mas sim à higidez da comprovação das despesas e de sua dedutibilidade, embora os Tribunais judiciais pouco tenham se debatido sobre o assunto. A análise de Luís Pacheco Vieira (8), especialmente no Tribunal de Justiça de São Paulo (“TJSP”) e nos Tribunais Regionais Federais, mostra que o Judiciário tem se preocupado bastante com a questão probatória, especialmente relacionada com a qualidade das informações e registros, quase sempre de ordem quantitativa, do que no método/critério de rateio de despesas utilizado, tendo a maior parte das decisões permitido o afastamento da tributação pela mera recomposição patrimonial havida.
Em regra, a doutrina admite o uso de métodos diretos e indiretos para o rateio de custos e despesas, embora tenda a preferir os primeiros. Mesmo assim, é importante considerar que os métodos indiretos também devem ser admitidos, mesmo porque os métodos diretos não captam com exatidão a relação entre despesa, rateio e benefício para a sociedade envolvida. O argumento é correto, sobretudo, porque há benefícios coletivos a todo o grupo envolvido, mesmo quando uma das sociedades gera a necessidade de determinada despesa, adquirindo conhecimento e experiência que será disponibilizada e útil para as demais.
Ainda assim, há vozes advertindo como inadequada a utilização da participação de cada empresa no faturamento global do grupo, como é o caso de Arthur Pereira Muniz Barreto:
Em último caso, podem as empresas do grupo se basear em critérios como a participação de cada empresa no faturamento global do grupo (fator que pode até ser muito mais conveniente e prático). Contudo, esse critério dificilmente será aceito pelo Fisco se adotado isoladamente, por ser muito amplo e genérico, muitas vezes insuficiente, de fato, para discriminar os gastos incorridos por cada empresa integrante do contrato. De outra parte, cumpre destacar que a participação no faturamento global pode muitas vezes não refletir propriamente a situação das empresas; a título exemplificativo, considere-se uma empresa do grupo que, para angariar clientes e aumentar o volume de negócios, estabelece diversas promoções, concede descontos ou de outras formas reduz seu faturamento com essa finalidade. Pela proporção no faturamento global, esta empresa deverá apropriar uma parcela reduzida de despesas, que provavelmente não condiz com a sua efetiva participação nas atividades desenvolvidas pelo grupo considerado em sua totalidade. Da mesma forma, não é suficiente a emissão, pela sociedade centralizadora, de uma nota global de débitos ao final do exercício, por exemplo, a título de bens, serviços e direitos contratados durante o ano, sem o detalhamento necessário das utilidades a que correspondem tais valores cobrados de cada uma das empresas beneficiárias. Na prática, é compreensível que seja necessário recorrer-se ao uso de estimativas e aproximações, considerando que pode ser inviável ter o controle de tais informações de forma tão eficiente quanto seria o ideal. Não obstante, cabe às empresas integrantes do contrato de compartilhamento buscar detalhar tanto quanto possível sua relação com os gastos globais contratados de forma proporcional, de modo que o rateio seja admitido pelo Fisco (9).
Embora esse alerta faça algum sentido, é certo que a própria administração tem aceitado (quando é a Administração que utiliza o critério) a utilização da participação na receita do grupo como critério, como também lembra Vinicius Branco:
18. Outros critérios são admitidos pela jurisprudência administrativa, dentre os quais o da receita auferida e o do patrimônio líquido das empresas conveniadas. Muito embora sejamos da opinião de que a utilização de tais parâmetros só deva ser aventada em casos excepcionais, a jurisprudência administrativa vem, pouco a pouco, admitindo a utilização da receita bruta como parâmetro válido para fins de rateio entre as empresas conveniadas, sendo certo que até mesmo a própria Receita Federal preconiza, através da Instrução Normativa nº 32, do Secretário da Receita Federal, de 30 de março de 2001, a utilização da receita como parâmetro válido na hipótese de rateio de despesas com exportação incorridas por duas ou mais empresas no exterior (10).
Portanto, de um lado há a exigência de que os critérios de rateio sejam razoáveis, e aptos a medir a participação de cada sociedade nas despesas centralizadas; de outro, benefícios na realização de despesas que são gerais, comuns a todas as sociedades envolvidas, bem como a pequena atenção que o CARF e o Judiciário vêm dando para o critério escolhido, mais preocupada com a sua implementação, concentrando-se na análise do contexto comprobatório das despesas e no cumprimento dos requisitos para a sua dedutibilidade.
Assim, no momento que o contribuinte vai escolher o método/critério de rateio é importante que se faça um sopesamento entre as possibilidades. Métodos diretos tendem a ser considerados mais razoáveis e próprios para o rateio, de outro lado, o seu manejo traz mais problemas pela necessidade de mensuração específica de um ou mais indicadores. Por outro lado, métodos indiretos como faturamento ou despesa das sociedades frente aos números globais do grupo são mais simples de aplicação, mas podem ser questionados porque são genéricos. Nestes casos, a utilização de médias temporais (nos últimos meses, por exemplo) pode evitar problemas pontuais, como a ausência de faturamento por um problema pontual.
Seja qual for o método/critério utilizado, é importante que ele seja formalizado em contrato prévio e que a operacionalização do contrato de rateio de despesas e custos seja acompanhado minuciosamente, para que todas a realização das despesas e custos seja comprovada, não só em termos quantitativos, mas também descritivamente, para que a análise da sua necessidade seja realizada sem maiores problemas.
Mais informações sobre o assunto podem ser obtidas com a Equipe de Consultoria Tributária do VLF Advogados.
Rafhael Frattari
Sócio-fundador responsável pela Área Tributária do VLF Advogados
Giovanna Villegas
Estagiária da Equipe de Direito Tributário do VLF Advogados
(1) XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 337.
(2) GALHARDO, Luciana. Rateio de despesas: aspectos tributários. São Paulo: Quatier Latin, 2003, p. 128.
(3) OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Fundamentos do Imposto de Renda.
(4) Lembrando que não há rateio de despesas quando se trata da atividade-fim das sociedades, “uma vez que, nesse caso, o reembolso dos valores teria nítida natureza de contraprestação pela prestação de serviços. Assim, ainda que o reembolso se desse pelo preço de custo do serviço prestado, a receita decorrente seria tributável pelo PIS/Cofins”. In: LESSA, Donovan Mazza; FONSECA, Fernanda Daniel Moura; LIMA, Daniel Serra. Novas Perspectivas sobre o Rateio de Despesas à Luz do Entendimento do Carf e da Receita Federal do Brasil. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 211, São Paulo, Dialética, p. 33.
(5) GALHARDO, Luciana. Rateio de despesas: aspectos tributários. São Paulo: Quatier Latin, 2003, p. 28-29; VIEIRA, Luís Pacheco. A tributação nos contratos de compartilhamento de custos e despesas. Dissertação de Mestrado. 161 f. Universidade do Vale dos Sinos, 2018, p. 20-21.
(6) XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 336.
(7) BARRETO, Arthur Pereira Muniz. Tratamento Tributário dos Contratos de Compartilhamento de Custos e Despesas e a Solução de Divergência nº 23, de 2013. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 224, São Paulo, Dialética, p. 20-21.
(8) Para uma análise de várias decisões judiciais, confira-se: VIEIRA, Luís Pacheco. A tributação nos contratos de compartilhamento de custos e despesas. Dissertação de Mestrado. 161 f. Universidade do Vale dos Sinos, 2018, p. 111-149.
(9) BARRETO, Arthur Pereira Muniz. Tratamento Tributário dos Contratos de Compartilhamento de Custos e Despesas e a Solução de Divergência nº 23, de 2013. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 224, São Paulo, Dialética, p. 21.
(10) BRANCO, Vinicius. Convênios de Rateio de Despesas – Disciplina Tributária. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 107, São Paulo, Dialética, p. 81.