As alterações nas regras de tributação de investimento no exterior e de fundos no Brasil
Rosa Lima
Em 25 de outubro de 2023, a Câmara dos Deputados aprovou o texto do Projeto de Lei nº 4.173/2023 (“PL 4.173/2023”), que dispõe sobre a tributação da renda auferida por pessoas físicas residentes no Brasil em aplicações financeiras, entidades controladas e trusts no exterior, além de fundos fechados como FIP, FIA e FIDC. O PL 4.173/2023 segue para votação do Senado Federal em regime de tramitação de urgência, nos termos do art. 64 da Constituição Federal (1).
De acordo com o artigo terceiro, parágrafo primeiro, inciso I, do referido Projeto de Lei, são definidas como aplicações financeiras no exterior quaisquer operações financeiras fora do país, tais como, depósitos bancários remunerados, certificados de depósitos remunerados, ativos virtuais, carteiras digitais ou contas correntes com rendimentos, cotas de fundos de investimento, com exceção daqueles tratados como entidades controladas no exterior, instrumentos financeiros, apólices de seguro cujo principal e cujos rendimentos sejam resgatáveis pelo segurado ou pelos seus beneficiários, certificados de investimento ou operações de capitalização, fundos de aposentadoria ou pensão, títulos de renda fixa e de renda variável, operações de crédito, inclusive mútuo de recursos financeiros, em que o devedor seja residente ou domiciliado no exterior, derivativos e participações societárias, com exceção daquelas tratadas como entidades controladas no exterior.
Já os rendimentos são classificados como a remuneração produzida pelas aplicações financeiras no exterior, incluídos, exemplificativamente, variação cambial da moeda estrangeira ou variação da criptomoeda em relação à moeda nacional, rendimentos em depósitos em carteiras digitais ou contas correntes remuneradas, juros, prêmios, comissões, ágio, deságio, participações nos lucros, dividendos e ganhos em negociações no mercado secundário, inclusive ganhos na venda de ações das entidades não controladas em bolsa de valores no exterior (art. 3º, 1º, inciso II do PL 4.173/2023).
A tributação, por sua vez, se dará por meio de Imposto sobre a Renda das Pessoas Físicas (“IRPF”), sendo que a pessoa física residente no país deverá, de forma separada dos demais rendimentos e dos ganhos de capital, enviar Declaração de Ajuste Anual (“DAA”) informando os rendimentos do capital aplicado no exterior, nas modalidades de aplicações financeiras e de lucros e dividendos de entidades controladas.
Para os casos de aplicações financeiras e rendimentos no exterior, na votação da Câmara, ao contrário da progressão inicialmente proposta, definiu-se uma alíquota única de 15% (quinze por cento), independentemente do valor auferido a título de rendimento.
Em relação às entidades controladas no exterior, os lucros serão tributados também à alíquota fixa de 15% (quinze por cento), contudo, serão aplicadas regras diferenciadas de contabilidade a depender de sua localização. Nos casos em que as entidades estejam localizadas em países com tributação favorecida (“JTF”) ou seja beneficiária de regime fiscal privilegiado (“RFP”), deverão ser aplicadas as regras contábeis da legislação comercial brasileira.
Ademais, foram fixadas cláusulas sobre transparência, incluindo a declaração de dívidas e obrigações nos casos em que o indivíduo eleja declarar os ativos detidos pela entidade controlada no exterior como se fossem detidos diretamente pela pessoa física.
Se o contribuinte optar pela atualização de ativos no exterior, será aplicada alíquota de 8% (oito por cento) sobre o ganho de capital percebido por pessoas físicas no momento de atualização de valor de ativos situados no exterior na DAA, tendo em vista prévia declaração destes bens na Declaração do Imposto de Renda das Pessoas Físicas (“DIRPF”) até o exercício de 2022.
A partir de 2024, os fundos de investimentos fechados terão a tributação de IR na forma do Come-Cotas, assim como os fundos abertos. Isto é, a depender da classificação do fundo, como de curto ou longo prazo, os fundos se sujeitarão ao recolhimento de Imposto de Renda Retido na Fonte (“IRRF”) de modo periódico à alíquota de 15% (quinze por cento) ou de 20% (vinte por cento).
Os fundos FIDCS, assim como FIP, FIA e ETF de Renda Variável (“ETF-RV”), não serão submetidos ao regime de Come-Cotas, com os cotistas sendo tributados apenas no momento de distribuição de rendimentos, amortização ou resgate de cotas. Nesses casos, os fundos serão classificados como entidade de investimento, conforme posterior regulamentação do Conselho Monetário Nacional (“CMN”). Para além, será exigido que a carteira seja ao menos 67% (sessenta e sete por cento) composta por direitos creditórios, cuja definição ainda depende de posicionamento do CMN, sendo que os cotistas terão até 30 de junho de 2024 para se adequar às novas regras.
Os FIA permanecem isentos do Come-Cotas, sendo dispensada a classificação como entidade de investimento para tanto. Nesse caso, a carteira de ações deverá ser composta por 67% (sessenta e sete por cento) de ações e ativos elegíveis para negociação em bolsa de valores nacional ou internacional, bem como em mercado de balcão organizado no país. Ademais, o rol de ativos elegíveis foi ampliado pelo PL 4.173/2023 em observância às regras definidas pela Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”).
Os FIP e ETF-RV também são isentos do Come-Cotas na medida em que cumpram com as regras estabelecidas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) quanto à composição de carteira e sejam classificados como entidades de investimento.
Por outro lado, FIP, ETV-RV, FIDC não classificadas como entidades de investimento serão tributados pelo regime Come-Cotas. Contudo, naqueles fundos que detenham participações societárias, a variação de valor das participações em controladas e coligadas será excluída da base de cálculo do Come-Cotas, sendo exigido o controle em subconta específica, de maneira que a tributação será aplicada somente sobre os eventos de realização.
Quanto aos “fundos de fundos”, isto é, fundos que investem até 95% (noventa e cinco por cento) do seu patrimônio líquido em FIP, ETF-RV, FIDC, sendo essas entidades de investimento, FIA, FII, FIAGRO, FIP-IE, FIP-PD&I e fundos de debêntures incentivadas (FI-Infra) não se sujeitarão ao Come-Cotas.
Em regra, nos casos de rendimentos acumulados até 31 de dezembro de 2023 (estoque), haverá a tributação de 15% (quinze por cento) no momento da efetiva disponibilização de IRRF, cujo pagamento poderá ser realizado em 24 (vinte e quatro) parcelas mensais a partir de maio de 2024.
Todavia, será dada a possibilidade ao contribuinte de se antecipar, recolhendo o IRRF a uma alíquota de 8% (oito por cento). Nesse caso, o contribuinte deverá realizar o pagamento dos rendimentos apurados à data corte de 30 de novembro de 2023, o qual será pego mediante quatro parcelas iguais e sucessivas entre dezembro de 2023 e março de 2024. Posteriormente, quanto aos rendimentos percebidos neste período, será devida uma parcela única com recolhimento em maio de 2024.
Por fim, quanto ao INR, ou seja, os investidores Não-Residentes, dispõe-se que o Come-Cotas não lhes é aplicável, na medida em que investirem no Brasil conforme regulamentação da CMN. Todavia, se o INR residir ou for domiciliado em países com JTF, deverá ser aplicado o regime específico a estes investidores, como explicitado alhures.
O PL 4.173/2023 apresenta mudanças significativas que podem ter implicações fiscais substanciais para investidores individuais e institucionais, tanto no Brasil quanto no exterior. Essas alterações visam padronizar e simplificar a tributação, alinhando-a com padrões internacionais, mas também podem aumentar a carga tributária para certos investidores.
No entanto, há alterações que certamente serão contestadas pelos contribuintes, como a tributação dos estoques. Para saber mais, consulte a equipe tributária do VLF Advogados.
Rosa Lima
Advogada da Equipe de Direito Tributário do VLF Advogados
(1) Art. 68. As leis delegadas serão elaboradas pelo Presidente da República, que deverá solicitar a delegação ao Congresso Nacional.
§ 1º Não serão objeto de delegação os atos de competência exclusiva do Congresso Nacional, os de competência privativa da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, a matéria reservada à lei complementar, nem a legislação sobre:
I - organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros;
II - nacionalidade, cidadania, direitos individuais, políticos e eleitorais;
III - planos plurianuais, diretrizes orçamentárias e orçamentos.
§ 2º A delegação ao Presidente da República terá a forma de resolução do Congresso Nacional, que especificará seu conteúdo e os termos de seu exercício.
§ 3º Se a resolução determinar a apreciação do projeto pelo Congresso Nacional, este a fará em votação única, vedada qualquer emenda.