Tendências regulatórias da nova norma sobre Populações Atingidas por Barragens
Leonardo Alves Corrêa
O Projeto de Lei nº 2788, de 2019, que institui a Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (“PNAB”) foi aprovado no Plenário do Senado e segue para sanção presidencial nos próximos dias. A nova norma regulamentará temas como os direitos das Populações Atingidas por Barragens (“PAB”), o Programa de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (“PDPAB”), bem como estabelecerá regras de responsabilidade social do empreendedor. É verdade que, no âmbito estadual, Minas Gerais já possui a sua Política Estadual dos Atingidos por Barragens (“Peab”) instituída em 15 de janeiro de 2021, por meio da Lei Estadual nº 23.795.
A norma federal estabelece como âmbito de aplicação dois tipos de barragens. Em primeiro lugar, aplica-se às barragens destinadas à acumulação de água para quaisquer usos, à disposição final ou temporária de rejeitos e à acumulação de resíduos industriais, de acordo com as características técnicas definidas nos incisos do parágrafo único do art. 1º da Lei Federal nº 12.334/2010 (Política Nacional de Segurança de Barragens). Em segundo, às barragens não enquadradas na Política Nacional de Segurança de Barragens, mas cuja operação, construção ou desativação resultaram em danos às comunidades.
A identificação legal do grupo considerado como atingidos por barragens segue a lógica da legislação mineira, ao estabelecer a necessidade de indicação objetiva de tipologia de impacto: a) perda da propriedade ou posse; b) desvalorização do imóvel; c) perda da capacidade produtiva ou econômica do imóvel; d) perda da atividade pesqueira; e) perda da fonte de renda e trabalho; f) alteração da qualidade da água que prejudique o abastecimento. Além das hipóteses de perdas econômicas, a norma também considerada como impacto apto a classificar uma população como atingida, “mudanças de hábitos da população (…) sujeição a efeitos sociais, culturais e psicológicos negativos devidos à remoção ou à evacuação em situações de emergência”, “alteração no modo de vida de populações indígenas e comunidades tradicionais” e “interrupção de acesso a áreas urbanas e comunidades rurais”.
A norma estabelece amplo conjunto de direitos das pessoas atingidas por barragens. Destacam-se os direitos ao reassentamento coletivo, auxílio emergencial que assegure a manutenção nos níveis de vida, reparação dos danos morais, individuais e coletivos, em razão dos transtornos de sofridos do processo de remoção, instalação de equipamentos de uso comum etc. Apesar da lista não ser exaustiva, os direitos estabelecidos na norma representam linhas orientadoras a serem observadas no processo de negociação do PDPAB.
Sobre o processo de negociação, a norma estabelece a sua natureza coletiva nos casos de discussão indenizatória dos danos socioambientais (parâmetro para identificação de bens e benfeitorias, etapas e planos de reassentamento e elaboração dos projetos de moradia). Além disso, a norma garante que a assessoria técnica, de natureza multidisciplinar, deve ser de livre escolha da população, sendo que os custos de contratação da equipe devem ser suportados pelo empreendedor.
Na nova norma, o Comitê Local da PNAB possui importante função de articulação entre comunidades, órgãos públicos e empreendedores. Trata-se de instância de negociação formada por composição tripartite e de caráter provisório, responsável pelo acompanhamento, fiscalização e avaliação do PDPAB em cada caso concreto. Ministério Público e Defensoria Pública são convidados permanentes e com direito à voz nas reuniões. O Comitê terá como atribuição, dentre outras funções, analisar a viabilidade agroeconômica dos imóveis objeto de reassentamento, propor as discussões, parâmetros e critérios sobre reposição, indenização e compensação dos atingidos.
Todos os custos para elaboração e implementação do PDPAB serão de responsabilidade do empreendedor, sendo que a norma ainda estabelece a obrigação de se estabelecer plano de comunicação contínuo e eficaz que demonstre a execução de todas as fases e realizações do PNAB. Neste sentido, caso a norma seja aprovada sem qualquer veto, empreendimentos que possuem barragens destinadas à acumulação de água para quaisquer usos, à disposição final ou temporária de rejeitos e à acumulação de resíduos industriais, dentro dos critérios de classificação da norma, devem atualizar e revisar seus planos, programas e procedimentos com o objetivo de se adequar aos novos parâmetros da norma federal.
Leonardo Alves Corrêa
Sócio-executivo da área de Direito Ambiental e Negócios Sustentáveis do VLF Advogados