Legal Operations e otimização da gestão contratual
Daniele Persegani e Karem Barcelos
1) Conceito de Legal Operations e sua utilização em departamentos jurídicos e escritórios de advocacia
Legal Operations, conhecido como Legal Ops, representa a gestão estratégica das atividades jurídicas. Seu objetivo é modernizar, tornar eficientes e produtivas essas práticas pelo emprego de tecnologias gerenciais e operacionais.
Inicialmente considerada como mero suporte administrativo, a concepção de Legal Operations, embora recente no Brasil, evoluiu rapidamente, tornando-se ferramenta essencial para o planejamento e desempenho dos operadores do Direito. Reconhecida por sua capacidade de otimizar custos, indicadores e fornecer informações mais precisas por meio de práticas inovadoras, as Legal Operations têm contribuído significativamente para o crescimento dos negócios no país.
Dentro desse escopo, as Legal Operations abrangem desde análises financeiras até a implementação de técnicas aperfeiçoadas para melhorar a gestão de pessoas, projetos e documentos. Especificamente na área consultiva contratual, foco deste artigo, as Legal Operations têm impulsionado avanços consideráveis.
2) Importância das Legal Operations na gestão de contratos
Os contratos são o alicerce das transações comerciais e, longe da visão burocrática e morosa que é comumente atribuída à fase de desenvolvimento e formalização desses documentos, desempenham papel crucial na mitigação de riscos em negociações.
Os desafios enfrentados pelos gestores de contratos incluem o grande volume de documentos a administrar, falta de visibilidade sobre contratos existentes, dificuldades no controle dos prazos de renovação ou, até mesmo, em relação às inconsistências nos termos descritos, escopos contratados etc.
Nesse cenário, destacam-se como elementos das Legal Operations:
a) Smart Contracts ou contratos inteligentes, que são programas de computador autoexecutáveis que funcionam com base em condições pré-definidas e são executados por meio de blockchain (1). Esses programas automatizam e facilitam a verificação, execução de contratos digitais sem a necessidade de intermediários, garantindo transações mais rápidas, transparentes e seguras;
b) Visual Law, que se refere ao conjunto de técnicas para desenvolver documentos com informações claras e, sobretudo, didáticas, simplificando etapas de negociação e tornando os contratos visualmente mais atrativos e compreensíveis (2);
c) Automação e tecnologia, que envolvem o uso de softwares para automatizar fluxos contratuais, gerenciando prazos de vigência, renovação, prazos de pagamentos conforme marcos contratuais, assinaturas e outras funções para atender às necessidades específicas da gestão de contratos; e
d) Padronização e templates, que são modelos contratuais pré-formatados que aceleram a criação e revisão de contratos, mantendo conformidade com as políticas da empresa.
Além desses recursos, o desenvolvimento de processos padronizados tem se mostrado eficiente na revisão e redação de contratos, reduzindo erros e garantindo consistência nos documentos. A redução das etapas de revisão dos contratos facilita a colaboração entre diferentes departamentos envolvidos nas negociações e partes interessadas, acarretando eficiência operacional.
O aprimoramento da gestão de contratos por meio das Legal Operations também ajuda na mitigação de riscos legais e financeiros, podendo incluir a identificação de cláusulas ambíguas, prazos não cumpridos ou condições desfavoráveis para uma das partes contratantes. Nota-se que ao estabelecer clareza e precisão aos termos contratuais e garantir a conformidade das contratações com regulamentos e leis específicas reduz-se significativamente o número de litígios e aplicação de penalidades por descumprimentos.
A padronização de processos, automatização de tarefas repetitivas, simplificação de fluxos de trabalho e organização de informações contratuais por meio das Legal Operations reduzem o tempo gasto na busca por dados relevantes, o que, por sua vez, aumenta a produtividade do corpo técnico. Ao identificarem oportunidades para renegociação de termos contratuais ou para eliminar contratos redundantes (3), as organizações podem minimizar seus custos operacionais.
A centralização de informações acessíveis a todas as áreas envolvidas, aliada à interpretação uniforme dos termos contratuais é capaz de reduzir mal-entendidos e conflitos, promover maior colaboração entre equipes e, consequentemente, garantir decisões cada vez mais alinhadas aos objetivos estratégicos da organização.
3) Benefícios e desafios das Legal Ops no cenário empresarial
As Legal Operations oferecem benefícios significativos para o cenário empresarial, impactando positivamente vários setores e processos. Aqui estão algumas das principais vantagens:
a) Aumento da eficiência operacional: ao adotar Legal Operations na gestão contratual, empresas testemunham mitigação de riscos legais e financeiros, economia de tempo e recursos, e colaboração mais eficaz entre equipes, resultando em processos mais ágeis e transparentes;
b) Maior transparência e compliance: as Legal Operations facilitam a implementação de processos transparentes e de conformidade. Ao padronizar procedimentos e documentação, as empresas garantem maior nível de transparência em suas operações. Além disso, asseguram o cumprimento de regulamentos e padrões legais relevantes;
c) Colaboração eficaz e melhorias na comunicação empresarial: a integração de Legal Operations promove colaboração mais eficaz entre departamentos, equipes e partes interessadas. Ferramentas e processos compartilhados facilitam a comunicação, garantindo compreensão comum das necessidades contratuais e ajudando na resolução rápida de problemas.
Embora ofereçam amplos benefícios para a gestão contratual e jurídica das empresas, as Legal Operations também enfrentam desafios significativos que muitas vezes podem dificultar sua implementação e adoção efetiva.
Um dos principais entraves é a resistência à mudança e o conformismo com a cultura organizacional existente. A introdução de novas práticas e tecnologias regularmente enfrenta barreiras quando confrontadas com estruturas organizacionais consolidadas, especialmente em empresas que têm cultura avessa a transformações ou são relutantes quanto à adoção de novas abordagens.
Além disso, a integração de novas tecnologias a sistemas legados é obstáculo considerável. Muitas organizações possuem sistemas preestabelecidos que podem dificultar a incorporação das inovações propostas pelas Legal Operations. Assim sendo, essa transição requer planejamento aplicado, de modo a evitar interrupções indesejáveis nos processos empresariais em andamento.
Questões relacionadas à segurança de dados e conformidade regulatória também são desafios críticos. A utilização de novas tecnologias para gerenciar informações contratuais deve estar pautada em rigorosas medidas de segurança, garantindo proteção adequada dos dados sensíveis e o cumprimento das leis de privacidade vigentes, como a Lei Geral de Proteção de Dados no Brasil (4).
Aliás, a implementação eficaz de Legal Operations muitas vezes demanda investimentos significativos em tecnologia e pessoal. A alocação adequada desses recursos pode ser obstáculo em empresas que enfrentam restrições orçamentárias, ou que não priorizam investir na modernização de processos.
Outro fator complexo é a necessidade de customização. As particularidades trazidas pelas empresas, muitas vezes, demandam alto nível de customização das estratégias de Legal Operations. Adaptar essas práticas para atender realidades específicas exige trabalho minucioso.
A mudança de mentalidade e a capacitação das equipes envolvidas também são fatores de alerta. A adoção de novas ferramentas, processos e abordagens requer não apenas investimento em tecnologia, mas também mudança cultural e capacitação profissional para que sejam exercidos de forma eficaz.
Por fim, é importante que os padrões implementados pelas Legal Operations sejam constantemente revistos, pois a busca pela eficiência e qualidade confiadas à automação excessiva e à manutenção de padrões elevados podem, por outro lado, comprometer a flexibilidade dos processos e execução de tarefas triviais no cotidiano das organizações.
4) Olhar para o futuro
O futuro das práticas jurídicas será fortemente influenciado pela evolução contínua das Legal Operations. Tendências emergentes indicam agregação de inteligência artificial à análise de dados, prometendo maior eficiência para diversos seguimentos, incluindo a gestão de contratos. Por conta disso, a implementação de estratégias de Legal Operations é essencial para empresas que buscam não apenas sobreviver no mercado, mas prosperar em ambientes cada vez mais competitivos. Ao abraçar a automação responsável, melhores práticas e colaboração efetiva, as empresas podem não apenas otimizar o gerenciamento contratual, como também impulsionar operações e estratégias, garantindo futuro sólido e seguro.
O VLF Advogados está sempre atento às novidades que surgem para facilitar o cotidiano de seus clientes. Se quiser saber mais sobre esse tema ou se necessita de apoio na implementação de processos de Legal Operations como revisão de minutários, simplificação de contratos, elaboração de templates para contratos, notificações, aplicação de visual law em normas, políticas e outros documentos jurídicos, entre em contato com a equipe de Consultoria em Contratos e Legal Design.
Daniele Persegani
Advogada da Equipe de Consultoria e Compliance do VLF Advogados
Karem Barcelos
Advogada da Equipe de Consultoria e Compliance do VLF Advogados
(1) A blockchain consiste em espécie de registro digital seguro e transparente que guarda informações em blocos interligados, protegidos por criptografia, impedindo modificações nos documentos e permitindo transações confiáveis sem intermediários.
(2) Esse tema foi abordado no Informativo VLF – 70/2020, disponível em: www.vlf.advbr/noticia_aberta.php?id=806. Acesso em: 15 dez. 2023.
(3) Contratos redundantes são aqueles que contêm termos, cláusulas ou disposições que se repetem, reiterando informações e condições de forma exaustiva.
(4) BRASIL. Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018. Dispõe sobre o tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado, com o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural.