Decisão do STJ confirma a validade da cláusula de limitação de responsabilidade prevista em contratos empresariais
Fernanda Ciancaglio Valentim e Mariana Novaes Costa Gonçalves
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) formou maioria para confirmar a validade da cláusula de limitação de responsabilidade prevista em contratos empresariais, no julgamento do Recurso Especial (“REsp”) nº 1.989.291/SP (1).
No caso que originou o julgado, a empresa RC Sistemas Ltda. ajuizou ação em face da Helwlett-Packard Brasil Ltda. (“HP”) para afastar a cláusula penal prevista no contato de representação comercial firmado entre as partes, que limitava expressamente o valor de eventual indenização a ser paga pela HP por danos causados à Representante ao montante de US$ 1.000.000,00 (um milhão de dólares).
A RC pretendia, basicamente, a nulidade da cláusula, para que pudesse receber a integralidade dos danos que alega ter suportado em virtude do contrato, incluindo desde a multa prevista na Lei nº 4.886/1965 (“Lei de Representação Comercial”) (2), até valores de comissões, indenização por lucros cessantes, encampação de clientes e danos morais.
No juízo de origem, a validade da cláusula foi afastada para determinar a apuração das perdas e danos em liquidação de sentença. A decisão foi mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (“TJSP”), ao entendimento de que a quebra do equilíbrio contratual causada pelo aumento excessivo da dependência econômica da Representante frente à Representada possibilitaria a flexibilização da cláusula para coibir eventual infração à ordem econômica, sendo necessário apurar os reais prejuízos sofridos, sob pena de enriquecimento ilícito da outra parte.
A Terceira Turma do STJ, no entanto, confirmou a validade da cláusula no julgamento do REsp nº 1.989.291/SP, por maioria dos votos. O Ministro Moura Ribeiro, acompanhado pelos Ministros Marco Aurélio e Nancy Andrighi, entendeu que o reconhecimento da infração à ordem econômica serve para justificar o rompimento do contrato e não o afastamento da cláusula penal, que serve, exatamente, para casos em que o contratante deixa de cumprir a obrigação (art. 408, CC) (3), independentemente da alegação de prejuízo (art. 416, CC) (4).
O Ministro ressaltou, ainda, o consentimento das partes em relação aos termos do contrato, bem como que não haveria hipossuficiência ou vulnerabilidade da Representante que a impedisse de compreender uma cláusula limitativa de responsabilidade no valor vultuoso de US$ 1.000.000,00 (um milhão de dólares). Também destacou que a cláusula que regula os prejuízos advindos da relação negocial poderia ser desconsiderada apenas se comprovado o dolo ou se o contrato tivesse previsão expressa de cobrança dos prejuízos excedentes.
O Ministro Ricardo Villas Bôas, por sua vez, apresentou voto divergente, sendo acompanhado pelo Ministro Humberto Martins. Para eles, não haveria, em princípio, empecilhos para atenuar a regra da reparação integral prevista no art. 944 do CC (5).
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Fernanda Ciancaglio Valentim
Advogada da Equipe de Contencioso Cível do VLF Advogados
Mariana Novaes Costa Gonçalves
Advogada da Equipe de Contencioso Cível do VLF Advogados
(1) STJ, REsp nº 1.989.291/SP, Relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em, 03/10/2023, DJe de 07/11/2023.
(2) Art. 27. “Do contrato de representação comercial, além dos elementos comuns e outros a juízo dos interessados, constarão obrigatoriamente: (...) j) indenização devida ao representante pela rescisão do contrato fora dos casos previstos no art. 35, cujo montante não poderá ser inferior a 1/12 (um doze avos) do total da retribuição auferida durante o tempo em que exerceu a representação.”
(3) Art. 408. “Incorre de pleno direito o devedor na cláusula penal, desde que, culposamente, deixe de cumprir a obrigação ou se constitua em mora.”
(4) Art. 416. “Para exigir a pena convencional, não é necessário que o credor alegue prejuízo. Parágrafo único. Ainda que o prejuízo exceda ao previsto na cláusula penal, não pode o credor exigir indenização suplementar se assim não foi convencionado. Se o tiver sido, a pena vale como mínimo da indenização, competindo ao credor provar o prejuízo excedente.”
(5) Art. 944. “A indenização mede-se pela extensão do dano.”