Substitutos, livro de Bernardo Carvalho, e O Samurai de Olhos Azuis, série da Netflix
Rafhael Frattari e Pedro Ernesto Rocha
Substitutos, livro de Bernardo Carvalho
Novo romance do aclamado autor de Nove Noites (2002), Bernardo Carvalho inicia a sua narrativa numa aventura de pai e filho voando para uma fazenda na região amazônica. O filho é o narrador da história, que tem como pano de fundo a exploração da selva e o genocídio dos povos indígenas pela expansão do garimpo ilegal e da pecuária baseada na grilagem de terras, quase sempre comandada por pessoas protegidas pela ditadura militar.
A história conta com uma meta narrativa relacionada a um livro de ficção científica lido pelo garoto, e contado ao seu pai durante as suas viagens. Há momentos bastantes sensíveis na relação entre pai e filho, algumas vezes baseada na brutalidade dos anos 1970 e na dominância de um pai que deseja o sucesso financeiro a qualquer custo, outras no reconhecimento do pai pelas diferenças entre eles.
A política exploratória da floresta, o contato com compradores estrangeiros da nossa riqueza, e a proximidade de práticas ilegais do pai contrasta com a futura carreira de antropólogo escolhida pelo menino, mas com a qual ele não consegue também se destacar, tema que perpassa o livro de ficção científica que o acompanhou na infância.
Durante boa parte da obra há uma quebra da linearidade da narrativa, mas isso não prejudica a leitura, ao contrário. Ao fim e ao cabo, o narrador – já adulto – lembra as suas memórias em meio ao término de um relacionamento amoroso fadado ao fim. Um livro muito bonito, a um só tempo intimista e engajado. Recomendo.
Rafhael Frattari
Sócio-fundador responsável pela Área Tributária do VLF Advogados
O Samurai de Olhos Azuis, série da Netflix
Durante os primeiros minutos de O Samurai de Olhos Azuis tive a sensação de voltar alguns anos na vida. A princípio, relembrei com prazer de na adolescência assistir a Cavaleiros do Zodíaco, Jiraya, Samurai Warriors e outras pérolas dos anos 1980 e 1990. Mas, logo na sequência, ao terminar a cena de abertura que se passa em um restaurante no Japão do Século XVII, percebi que não foi o saudosismo que me fez criar conexão imediata com a série. Na verdade, senti-me envolvido pelo texto preciso, objetivo e muitas vezes rascante; pelos traços nipônicos adultos; e, sobretudo, pela percepção imediata de que Mizu – o samurai do título – tem objetivo e obstinação para atingi-lo.
Apesar de ser uma animação, a produção da Netflix lançada em 2023 não se trata, em nenhum aspecto, de algo destinado a menores. A história é de vingança e há muito sangue e sexo na jornada de Mizu. E a jornada é realmente sensacional de se acompanhar.
As temáticas abrangidas vão desde preconceitos e machismo estrutural até algo que a mim soa como psicopatia, e a abordagem não é superficial. O “herói” aqui é ambíguo, os homens são dobrados e as mulheres têm papéis de destaque.
A série inteira é de alta qualidade, tanto em texto quanto em imagem. O protagonista é impagável de tão bem construído e os coadjuvantes são de primeira linha; bem desenvolvidos, eles vivem suas batalhas e agregam substancialmente à história de Mizu. É por isso que a série é capaz de despertar, na mesma medida, sincera empatia por Akemi, que é filha de um senhor rico e com pretensões de poder, e verdadeiro ódio a Abijah Fowler, o contrabandista que faz as vezes de principal oponente de Mizu na primeira temporada.
Com capítulos de cerca de cinquenta minutos, O Samurai de Olhos Azuis é, a meu ver, essencial: ou você vê ou perderá algo primoroso.
Pedro Ernesto Rocha
Coordenador da Equipe de Consultoria Societária do VLF Advogados