Habilitação de crédito concursal em moeda estrangeira é admitida pelo STJ
Lucas Santos Auer
Em decisão transitada em julgado no começo de fevereiro de 2024, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) definiu que, para fins de determinação do valor nominal do crédito, deve ser conservada a variação cambial, sendo cabível a habilitação do crédito na Recuperação Judicial na mesma moeda em que constituído, devidamente atualizado, nos termos ajustados ou definidos na sentença que o declarou, até a data do pedido de Recuperação Judicial.
A discussão foi instaurada perante o Tribunal de Justiça de São Paulo (“TJSP”). Ao receber habilitação de crédito de empresa estrangeira, titular de expressivo crédito constituído em dólar americano, a recuperanda reconheceu a existência do crédito, mas se opôs à inclusão dos valores nas moedas pactuadas entre as partes. Ela sustentou que o valor deveria ser convertido para a moeda nacional no momento de sua inclusão no Quadro-Geral de Credores, aplicando-se a taxa de câmbio referente à data de seu pedido de Recuperação Judicial.
De acordo com a empresa devedora, o valor do crédito teria que ser atualizado até a data da decretação de falência ou do pedido de Recuperação Judicial, a ensejar a conclusão de que estes marcos também devem ser utilizados para a conversão do crédito em moeda nacional. Em seus dizeres, o acolhimento da pretensão da habilitante representaria afronta aos princípios constitucionais da ordem econômica e social, da segurança jurídica e do par conditio creditorum.
O entendimento, contudo, não foi acolhido pelo STJ, que manteve o acórdão do TJSP. O Relator, Ministro Marco Aurélio Bellizze, destacou que o § 2º do art. 50, da Lei de Recuperações Judiciais, estabelece que, nos créditos em moeda estrangeira, a variação cambial deve ser conservada como parâmetro de indexação da obrigação e somente pode ser afastada no caso de o titular, expressamente, assentir com previsão diversa no plano de Recuperação Judicial.
A premissa que balizou o voto vencedor, portanto, foi a de que a própria lei buscou evitar a imediata conversão em moeda nacional, por ocasião de sua habilitação, com o fito de conter indesejada disparidade entre o valor do crédito e o da obrigação que o originou.
A interpretação ainda chamou atenção para a redação do parágrafo único do art. 38 da Lei nº 11.101/2005, que estabelece que o crédito em moeda estrangeira será convertido para moeda nacional ao câmbio da véspera da realização da assembleia. Assim, se somente são legitimados para participar da assembleia os credores habilitados (art. 39 do mesmo diploma legal), concluiu-se que a habilitação de créditos em moeda estrangeira não demandaria conversão para moeda nacional.
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Lucas Auer
Advogado da Equipe de Contencioso Cível do VLF Advogados