Água Funda, livro de Ruth Guimarães, e Bebê Rena, série da Netflix
Rafhael Frattari e Katryn Rocha
Água Funda, livro de Ruth Guimarães
A indicação do mês chegou até mim pelo clube de assinaturas da TAG, que recebeu a curadoria de Emicida para enviar aos seus leitores o livro de Ruth Guimarães. Confesso que fiquei surpreso, já que nunca havia sequer ouvido falar na autora, que escreveu dezenas de obras, a partir do seu primeiro livro: Água Funda.
O livro foi escrito na década de 1940 e trata das relações sociais e do modo de vida da população rural do Vale do Ribeira, mas que poderia se passar em várias localidades de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, no crepúsculo do ciclo do café.
A prosa do livro é maravilhosa, seja quando ouvimos o narrador, seja quando os vários personagens aparecem, com frase diretas, saídas da boca de qualquer trabalhador rural ou fazendeiro da época. O enredo gira em torno de duas histórias, uma da sinhazinha dura e poderosa a quem a vida reserva um destino infeliz. Outra, a do trabalhador Joca que é tomado pela loucura, disfarçada de crendices populares radicalizadas, e de sua relação com a esposa, apelidada de Curiango.
O livro é uma aula de Brasil, de cultura, religião e regionalismo. Merece ser conhecido, lido e divulgado. Uma ótima aula de literatura, tanto em conteúdo, como em relação à estética pela qual conta as histórias que se cruzam. Vale muito a pena.
Rafhael Frattari
Sócio-fundador responsável pela Área Tributária do VLF Advogados
Bebê Rena, série da Netflix
Baseada em uma envolvente história verídica, a peça sucesso de 2019, Bebê Rena, é adaptada para as telas e acompanha o relacionamento distorcido do escritor e performer Richard Gadd com sua perseguidora, e o impacto que isso tem sobre ele quando se vê forçado a enfrentar um trauma recalcado e muito mais profundo.
Na minissérie original da Netflix, Gadd interpreta Donny Dunn, um comediante que trabalha em um pub em Camden. Lá ele conhece uma mulher chamada Martha (Jessica Gunning), que parece um pouco sem sorte. Então, Donny oferece a ela um pequeno ato de gentileza, na forma de uma bebida gratuita. Logo, Martha passa a frequentar o pub todos os dias, falando alto durante todo o turno, inventando todo tipo de fantasias óbvias sobre sua vida “ocupada” e “glamourosa” e rapidamente fica claro que Martha tem uma obsessão por Donny.
Não demora muito para que a perseguição comece a se manifestar de outros modos, e os e-mails começam. Centenas por dia, cheios de erros ortográficos, sobre nada e ao mesmo tempo demonstrando uma clara intenção de flerte.
Donny é frustrantemente incapaz de estabelecer limites e acaba perdendo o controle da situação, mas em determinado ponto aprendemos sobre a bagagem que ele carrega, entendendo tanto o que o motiva, mas também o que o impede. E nesse ponto, a série toma um rumo muito mais sombrio e difícil.
Contendo representações gráficas de agressão sexual e tratando de problemas desafiadores de saúde mental, traumas e abusos, Gadd enquanto roteirista, diretor e intérprete da própria história se coloca numa posição de vulnerabilidade, ao nos apresentar todas essas questões com nuances e cuidado e ilustrando, de maneira fenomenal e angustiante, como os ciclos de abuso podem ocorrer, mesmo que para um observador externo não façam sentido.
Bebê Rena está disponível na Netflix.
Katryn Rocha
Auxiliar de Comunicação do VLF Advogados