Projeto de Lei nº 6.233/2023 define o IPCA como índice de correção monetária e a taxa Selic, deduzido o IPCA, para os juros de mora
Fernanda Ciancaglio Valentim
Em decisão significativa, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei nº 6.233/2023 (1), que, entre outros aspectos, altera as regras de atualização monetária e juros aplicáveis aos casos de descumprimento de obrigação de natureza civil. O projeto passou por intensos debates e negociações no intuito de sanar as lacunas e inconsistências do Código Civil quanto ao ponto, que muitas vezes resultavam em litígios prolongados e interpretações divergentes dos contratantes e aplicadores do direito.
Isso, porque a redação do artigo 389 do referido diploma menciona apenas que se não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e correção monetária “segundo índices oficiais regularmente estabelecidos”, sem prever expressamente o índice aplicável (2).
A redação do artigo 406 também não prevê com clareza o índice aplicável aos juros moratórios, já que se limita a dizer que eles “serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional” (3).
Com o objetivo de sanar a controvérsia, a Câmara dos Deputados aprovou, em 4 de junho, o Projeto de Lei nº 6.233/2023, que altera o art. 389 do Código Civil (“CC”) para estabelecer que a atualização monetária será realizada mediante a aplicação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (“IPCA”), quando outro não houver sido convencionado pelas partes ou não estiver previsto em legislação específica. Utilizado pelo Banco Central para estabelecer metas de inflação, o IPCA reflete, de maneira mais precisa, as variações de preços e recompõe o poder de compra do consumidor.
O Relator do projeto, deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), destacou a importância das mudanças para a estabilidade econômica e a segurança jurídica ao afirmar que “a unificação dos critérios de correção monetária pelo IPCA trará mais segurança jurídica, evitando interpretações divergentes que geram litígios intermináveis e insegurança para investidores e credores”.
Quanto aos juros, o Projeto de Lei alterou o art. 406 do CC para dispor que o cômputo para os casos não convencionados se dará de acordo com o cálculo aritmético simples entre a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia (“Selic”) menos a inflação (IPCA). O texto aprovado acatou o substitutivo do Senado que, ao invés de prever o menor índice entre Nota do Tesouro Nacional série B (“NTB-N”) e taxa Selic, estabelece simplesmente a incidência da última, subtraída a correção monetária (IPCA).
Além disso, o Projeto de Lei inseriu mecanismos que garantem maior transparência no cálculo dos juros e da atualização monetária ao prever que a metodologia de cálculo da taxa legal será definida pelo Conselho Monetário Nacional (“CMN”), com a obrigatoriedade de divulgação pelo Banco Central.
Segundo o Relator, essa medida é crucial para um mercado de crédito mais justo e equilibrado, pois “a obrigatoriedade de publicação dos índices e taxas em plataformas oficiais garante que todas as partes interessadas possam acompanhar as atualizações de forma clara e acessível, promovendo um ambiente de negócios mais transparente”.
A aprovação do Projeto de Lei nº 6.233/2023 representa passo importante na legislação financeira brasileira. Ao uniformizar as regras de atualização monetária e juros, o projeto promove ambiente econômico mais transparente, previsível e justo. Agora, com a aprovação pela Câmara dos Deputados, a expectativa é que a lei contribua para maior segurança jurídica dos contratos e para redução do custo Brasil, isto é, o custo para realizar negócios no país.
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Fernanda Ciancaglio Valentim
Advogada da Equipe de Contencioso Cível do VLF Advogados
(1) PROJETO de Lei nº 6.233/2023. Altera a Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), para dispor sobre atualização monetária e juros. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2416729&fichaAmigavel=nao. Acesso em: 24 jun. 2024.
(2) Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.
(3) Art. 406. Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional.