Consulta Livre, Prévia e Informada é regulamentada para licenciamento ambiental em Minas Gerais
Leonardo Corrêa
Em 11 de setembro de 2024, o governo do Estado de Minas Gerais editou o Decreto nº 48.893/2024, que regulamenta a Consulta Livre, Prévia e Informada (“CLPI”) de que trata o art. 6º da Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho sobre Povos Indígenas e Tribais, aprovada pelo Decreto Legislativo nº 143, de 20 de junho de 2002, e promulgada pelo Decreto Federal nº 5.051, de 19 de abril de 2004. A partir da edição do decreto, no caso de licenciamento ambiental de grandes empreendimentos que afete povos indígenas, comunidades quilombolas ou povos e comunidades tradicionais, será exigível a realização CLPI.
Para a delimitação do âmbito de aplicação normativa, o decreto adota a combinação de critérios subjetivos e objetivos. Assim, no âmbito subjetivo, a aplicação da consulta limita-se aos povos indígenas reconhecidos pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas, comunidades quilombolas certificadas pela Fundação Cultural Palmares e povos e comunidades tradicionais certificados pela Comissão Estadual para o Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais de Minas Gerais.
Do ponto de vista objetivo, a norma aplica-se nas áreas em que haverá o desenvolvimento das atividades passíveis de licenciamento ambiental do empreendimento ou em faixas de restrição estabelecidas no Anexo I da Portaria Interministerial nº 60, de 24 de março de 2015.
O decreto possui diversos pontos polêmicos, inclusive com riscos de judicialização em razão de possível conflito com preceitos da Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho sobre Povos Indígenas e Tribais. O primeiro deles é a definição de uma faixa de 3 (três) quilômetros para a obrigatoriedade de consulta para atividades passíveis de licenciamento ambiental. Outro aspecto considerado controverso é a dispensa da CLPI aos povos indígenas, comunidades quilombolas ou povos e comunidades tradicionais que vivem área urbana consolidada, nos termos do inciso XXVI do art. 3º da Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de 2012.
A Associação Brasileira de Antropologia (“ABA”), por meio de seu Comite? Povos Tradicionais, Meio Ambiente e Grandes Projetos, Comitê Quilombos e o Observatório de Protocolos Comunitários de Consulta e Consentimento Prévio, Livre e Informado (“OPCPLI”) publicaram carta aberta solicitando a adoção de medidas administrativas e judiciais que visem a imediata revogação do decreto. Um dos principais argumentos da ABA é a imediata aplicabilidade da Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho sobre Povos Indígenas e Tribais e a desnecessidade do decreto regulamentador.
Empreendimentos minerários, de infraestrutura e agropecuários, possuem em comum o risco de conflito territorial, seja em razão da sobreposição com os atributos ambientais (Unidades de Conservação), históricos (tombamentos) ou socioambientais (povos indígenas e comunidades tradicionais). Apesar de eventuais falhas e equívocos conceituais, o Decreto nº 48.893/24 é importante instrumento de regulamentação da Consulta Livre, Prévia e Informada, uma vez que busca previsibilidade, segurança e construção de consensos possíveis pelos múltiplos usos territoriais.
Leonardo Corrêa
Sócio-executivo da Equipe de Direito Ambiental e Negócios Sustentáveis do VLF Advogados