É possível penhorar veículo automotor objeto de alienação fiduciária utilizado pelo devedor no exercício da sua profissão?
Eduardo Metzker Fernandes
A alienação fiduciária é um tipo de garantia que consiste na transferência da propriedade do bem adquirido pelo devedor ao credor até que a dívida seja completamente paga. Nessa forma de garantia, o devedor obtém o direito de utilizar o bem, mas só adquire a sua propriedade depois do pagamento total da dívida, podendo a propriedade do bem ser consolidada pelo credor em caso de inadimplemento.
Essa garantia é muito utilizada nas operações de crédito e, dentre as razões que justificam a sua preferência e popularidade, pode-se destacar as seguintes: baixo custo em relação a outras formas de garantia; bom nível de segurança para o credor, que fica na propriedade do bem; e facilidade na recuperação do crédito em caso de não pagamento.
Para evitar que o devedor fiduciante utilize o instituto da alienação fiduciária como ferramenta para frustrar a consecução de crédito de outros credores, o Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) possui o entendimento de que é possível a penhora dos direitos aquisitivos do devedor (executado) relativos ao contrato de alienação fiduciária em garantia. Ou seja, ainda que o devedor fiduciante não seja titular da propriedade do bem objeto de alienação fiduciária, é possível que outro credor se valha daquela situação para garantir o recebimento do seu crédito por meio da penhora do direito aquisitivo do devedor.
Há, contudo, hipóteses em que o bem móvel objeto da alienação fiduciária é utilizado como ferramenta de trabalho pelo devedor, como acontece comumente nos casos de aquisição de veículo automotor, por exemplo. E, como se sabe, o artigo 833, V, do CPC prevê a impenhorabilidade dos bens móveis necessários ao exercício da profissão do executado:
Art. 833. São impenhoráveis:
(...)
V – os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício da profissão do executado.
Nesses casos, a questão que coloca é a seguinte: a impenhorabilidade do veículo automotor necessário ao exercício da profissão também deve ser observada nos casos em que o executado possui apenas o direito aquisitivo derivado de contrato de alienação fiduciária em garantia?
Em 18 de novembro de 2024, foi publicado o acórdão do REsp 2.173.633/PR, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi, no qual o STJ firmou o entendimento de que a impenhorabilidade de veículo automotor necessário ao exercício da profissão se estende, de maneira reflexa, aos direitos aquisitivos derivados de contrato de alienação fiduciária em garantia que tem por objeto o referido bem.
Para o STJ, os direitos do devedor fiduciante em relação ao contrato de alienação fiduciária estão vinculados à aquisição total da propriedade do bem. E se esse bem for essencial para o exercício da profissão, esses direitos de aquisição também estarão relacionados à obtenção do bem que não pode ser penhorado. Por isso, enquanto essa situação perdurar, a garantia de impenhorabilidade prevista no art. 833, V, do CPC deve ser aplicada, assegurando, assim, o direito do devedor à sua própria subsistência, que é o objetivo da proteção legal.
A equipe de Contencioso Cível do VLF Advogados está pronta para esclarecer quaisquer dúvidas sobre o tema.
Eduardo Metzker Fernandes
Coordenador da Equipe de Contencioso Cível do VLF Advogados