Duas Viagens ao Brasil, livro de Hans Staden, e Conclave, filme de Edward Berger
Artur Cronemberger e Vinícius Vasconcelos
Duas Viagens ao Brasil, livro de Hans Staden
Duas Viagens ao Brasil é um livro que se tornou best-seller na Europa na década de 1550 e conta o relato do jovem Staden, mercenário alemão com vinte anos de idade, que viajou para o Brasil e foi capturado pelos tamoios.
Staden narra com detalhes tudo o que viu durante o cárcere indígena: conflitos tribais, expansão colonial, guerreiros indígenas, fé, piratas franceses e antropofagia. O livro é resultado de testemunho ocular da história em um momento especial do Brasil, em que ocorriam os primeiros contatos entre europeus e indígenas e as diferenças culturais ainda eram significativas.
Porém não há dúvidas de que o que mais chamava a atenção dos europeus na época era o canibalismo ritual dos indígenas. E o forasteiro Staden descreve com detalhes o banquete antropofágico, no que é considerado por historiadores como a fonte primária mais confiável para o estudo do canibalismo.
O livro fez tanto sucesso na Europa que teve dez edições nos primeiros cinco anos. No Brasil, contudo, a obra só foi redescoberta durante a Semana da Arte Moderna de 1922, quando Eduardo Prado apresentou o livro aos poetas Raul Bopp e Oswald de Andrade, e à pintora Tarsila do Amaral. Dizem que teria sido uma frase específica do relato de Staden que levou Tarsila a pintar o Abaporu: “Lá vem a sua comida pulando”, frase que um prisioneiro europeu foi obrigado a dizer aos seus captores indígenas no centro de uma aldeia tupinambá de Ubatuba, SP.
Sobre o tema, vale conferir o filme Como é Gostoso Meu Francês, de Nelson Pereira dos Santos, que propõe releitura do relato de Staden e que já conta com resenha na Newsletter do VLF Advogados.
Artur Cronemberger
Advogado da Equipe de Contencioso Cível do VLF Advogados
Conclave, filme de Edward Berger
Um dos fortes concorrentes ao Oscar de Melhor Filme de 2025, o longa-metragem Conclave, dirigido por Edward Berger, conta a história fictícia do processo de escolha de um novo papa, momento definidor dos caminhos e das políticas que definem a condução da Igreja Católica.
O filme acompanha o decano Thomas Lawrence (interpretado por Ralph Fiennes, indicado ao Oscar de Melhor Ator pelo papel), cardeal responsável por conduzir o conclave, que também está imbuído do dever de votar no melhor candidato possível enquanto enfrenta uma crise pessoal sobre seu papel na Igreja. Quando diferentes visões sobre a religião se chocam, o lado humano dos candidatos a papa aflora e parece impossível haver algum candidato à altura do posto de Sua Santidade, situação atormentadora para Lawrence.
Ao apostar na humanidade dos seus personagens, o filme traz à tona as complexidades de qualquer tipo de empreendimento coletivo, sempre sujeito a erros e acertos, assim como a certeza da incerteza que todo tipo de escolha envolve, mas que, mesmo assim, deve ser feita. Nessa construção, muito mais do que abordar um conclave, o filme faz defesa vigorosa das instituições coletivas, rechaça a tentação de caminhos autoritários e da isenção política, além de pôr em xeque a justificativa para determinadas tradições, preservando, por outro lado, sempre o espaço da dúvida, que não pode ser desculpa para a paralisia.
Clássico em sua estética, o filme é habilmente dirigido, mas seu final, embora coerente com o tom do filme, pareça um pouco abrupto. Nada, entretanto, que apague a intepretação impecável de Ralph Fiennes, que, além de entregar um monólogo memorável no início, conclui o filme com uma expressão que sintetiza toda a tese da obra.
Vinícius Vasconcelos
Advogado da Equipe de Consultoria Tributária do VLF Advogados