STF julga constitucionalidade de CIDE-Tecnologia
Giovanna Villegas
Em 13 de agosto de 2025, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (“STF”) encerrou o julgamento do Recurso Extraordinário 928.943 (1), com repercussão geral reconhecida no Tema 914, que havia sido afetado em setembro de 2016. Na ocasião, o STF determinou a constitucionalidade da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (“CIDE”), destinada a financiar o Programa de Estímulo à Interação Universidade-Empresa para o Apoio à Inovação, incidente sobre remessas de valores ao exterior, conhecida como CIDE-Remessas ou CIDE-Tecnologia.
A CIDE foi instituída no ano 2000 pela Lei nº 10.168/2000, com o objetivo de intervir no domínio econômico para incentivar o desenvolvimento tecnológico brasileiro, estimulando a pesquisa e a cooperação entre universidades, centros de pesquisa e o setor produtivo. Inicialmente, a CIDE incidia sobre os valores pagos, creditados ou remetidos ao exterior a título de remuneração por contratos de transferência de tecnologia e royalties. Contudo, a Lei nº 10.332/2001 ampliou significativamente seu campo de incidência, passando a abranger também os serviços técnicos e de assistência administrativa e semelhantes, o que intensificou o debate jurídico.
As empresas – no RE 928.943 (Tema 914) a parte interessada é a Scania Latin America Ltda. – levaram a questão ao Judiciário, sustentando uma série de argumentos contra a validade da exação. Entre os principais pontos, alegava-se o desvio de finalidade, pois a contribuição estaria custeando atividades da ordem social (pesquisa e ensino) e não da ordem econômica, o que seria inconstitucional já que esse custeio cabe aos impostos. Questionava-se também a ausência de referibilidade, um dos pilares das contribuições, defendendo que não havia benefício direto ou sequer indireto para os contribuintes da CIDE. Outro ponto central era a violação da isonomia, pois a lei criava discriminação contra as empresas que importavam tecnologia em detrimento daquelas que utilizavam soluções nacionais.
A Suprema Corte, por sua vez, declarou a constitucionalidade da CIDE-Remessas, instituída pela Lei nº 10.332/2001. A decisão foi marcada por clara divergência interna, que expôs duas visões distintas sobre os limites constitucionais da contribuição. O Ministro Luiz Fux, relator do caso, votou pela constitucionalidade parcial, defendendo que a CIDE somente poderia incidir sobre contratos que envolvessem efetivamente a importação ou transferência de tecnologia. No entanto, a corrente vencedora, inaugurada pelo Ministro Flávio Dino, entendeu que a Constituição não exige correlação direta entre cada fato gerador e a exploração de tecnologia. Para a maioria, o requisito constitucional estaria satisfeito desde que a arrecadação total fosse destinada ao setor de desenvolvimento científico e tecnológico.
Com base nessa premissa, o STF validou a cobrança da CIDE sobre uma gama mais ampla de operações, não sendo necessário haver correlação entre o fato gerador da contribuição com a exploração de tecnologia, sendo o único requisito a destinação integral da arrecadação para a área em que se pretende fazer a intervenção econômica.
Conforme justificativa fornecida (2), o alargamento da incidência da Contribuição decorreu de opção de política econômica, acompanhada de redução na alíquota do imposto de renda retido na fonte sobre essas remessas, de modo a evitar aumento do ônus para o setor produtivo.
O julgamento do Tema 914 pelo STF representa, portanto, marco nos precedentes e ponto importante de reflexão em uma das mais duradouras controvérsias do direito fiscal. Ao validar a CIDE-Tecnologia em sua concepção mais ampla, a Suprema Corte privilegiou a natureza extrafiscal do tributo como legítima ferramenta de política econômica, cujo propósito de fomentar a inovação nacional se sobrepõe à necessidade de correlação direta entre fato gerador, contribuintes e destinação. Assim, a decisão consolida o entendimento de que a destinação da arrecadação é o elemento central para a validade da contribuição, conferindo bastante discricionariedade para o legislador definir o grupo de contribuintes que serão chamados ao esforço fiscal, que torna mais fluído o regime jurídico constitucional das contribuições de intervenção no domínio econômico.
Apesar de o acórdão ainda não ter sido publicado, deve-se voltar a atenção para a incidência do tributo, com análise tributária criteriosa dos contratos que envolvam pagamentos ao exterior.
Para mais informações sobre o assunto, consulte a equipe tributária do VLF Advogados.
Giovanna Villegas
Advogada da Equipe de Consultoria Tributária do VLF Advogados
(1) STF. RE 928.943. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4882983. Acesso em: 25 ago. 2025.
(2) STF. Informação à Sociedade. Disponível em: https://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/InfoSociedadeRE928943.pdf. Acesso em: 25 ago. 2025.