Seguro garantia e execução trabalhista
Cássia Ribeiro Araújo
Com o avento da Lei nº 13.043/2014, que acrescentou o seguro garantia às hipóteses de caução da execução fiscal (art. 16 da Lei nº 6.830/80, conhecida como Lei de Execuções Fiscais), intensificaram-se as discussões quanto à aplicação do referido instituto às execuções trabalhistas.
Analisando-se o art. 889 da Consolidação das Leis do Trabalho (“CLT”), verifica-se que ele é claro ao dispor que a Lei de Execuções Fiscais (“LEF”) tem aplicabilidade imediata e direta no âmbito das execuções trabalhistas, desde que não contrarie os preceitos celetistas.
O Tribunal Superior do Trabalho (“TST”), ao interpretar o art. 655 do Código de Processo Civil de 1973 (“CPC/1973”), que enumerava o dinheiro “em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira” como o primeiro na ordem de penhora das execuções trabalhistas, equiparou, no ano 2000, a carta fiança ao dinheiro, mediante a edição da Orientação Jurisprudencial nº 59 (“OJ nº 59”) pela Subseção Especializada de Dissídios Individuais (“SBDI-2”):
“OJ Nº 59. MANDADO DE SEGURANÇA. PENHORA. CARTA DE FIANÇA BANCÁRIA. A carta de fiança bancária equivale a dinheiro para efeito da gradação dos bens penhoráveis, estabelecida no art. 655 do CPC.”
Ocorre que, com o advento do Novo Código de Processo Civil (“CPC/2015”), e visando à adequação do processo do trabalho às novas regras processuais, o TST, em junho de 2016, alterou a OJ nº 59, incluindo o seguro garantia judicial como caução passível de ser apresentada na fase executória das reclamações trabalhistas, desde que o valor segurado corresponda ao débito exequendo acrescido de 30% (trinta por cento). A seguir:
“59. MANDADO DE SEGURANÇA. PENHORA. CARTA DE FIANÇA BANCÁRIA. SEGURO GARANTIA JUDICIAL (nova redação em decorrência do CPC de 2015) - Res. 209/2016, DEJT divulgado em 01, 02 e 03.06.2016. A carta de fiança bancária e o seguro garantia judicial, desde que em valor não inferior ao do débito em execução, acrescido de trinta por cento, equivalem a dinheiro para efeito da gradação dos bens penhoráveis, estabelecida no art. 835 do CPC de 2015 (art. 655 do CPC de 1973).”
Mesmo diante da exigência de que o valor segurado seja equivalente ao do débito acrescido de 30%, a apresentação de apólice de seguro garantia judicial mostra-se vantajosa, por evitar que a executada sofra grandes impactos em seu fluxo de caixa, como ocorre com o depósito em dinheiro – situação em que grandes quantias ficam “congeladas” em contas judiciais, prejudicando a realização de investimentos na própria atividade explorada pela empresa.
Outras – e importantes – vantagens da utilização do seguro garantia judicial consistem no afastamento do risco da penhora online, no não comprometimento dos limites de crédito junto às instituições financeiras e, ainda, na possibilidade de oposição de Embargos à Execução para a discussão dos débitos executados sem o dispêndio de numerário da empresa.
A possibilidade de utilização do seguro garantia na fase de execução do processo judicial trabalhista, embora se coadunasse com os preceitos constitucionais da celeridade, da efetividade jurisdicional e da duração razoável do processo (Constituição da República, art. 5º, LXXVIII), sofria dura resistência dos Tribunais Regionais do Trabalho (1).
Em síntese, os Tribunais resistiam ao uso das apólices de seguro garantia aos argumentos de que: (i) o seu prazo de vigência seria limitado; (ii) não haveria liquidez imediata; (iii) as apólices estariam sujeitas a renovação, a qual, ainda que automática, dependeria da concordância da seguradora; e (iv) haveria a impossibilidade de liberação de valores incontroversos, uma vez que o valor não ficaria à disposição do juízo.
Não obstante, alguns Tribunais – com destaque para o Tribunal da 5ª Região (2) – já aceitavam a utilização do referido instrumento como garantia da execução provisória, ao argumento de que o art. 656 do CPC/1973 era aplicável ao processo trabalhista e, portanto, uma vez observado o acréscimo do valor da execução, a apólice do seguro garantia poderia ser aceita para a garantia do juízo.
Neste sentido, é salutar a recente alteração da OJ nº 59 da SBDI-2, promovida pelo TST em decorrência da entrada em vigor do CPC/2015, para admitir o uso das apólices de seguro garantia como caução idônea, pois representa enorme avanço na necessária modernização do processo trabalhista.
Importante salientar que a nova redação da OJ nº 59 não limita a aplicação do seguro garantia à fase de execução provisória, sendo possível, em tese, utilizar-se de tal instrumento em execuções definitivas nas quais a parte devedora irá apresentar embargos à execução.
Resta saber, todavia, se as Varas do Trabalho admitirão o manejo do seguro garantia judicial pelas reclamadas tanto na execução provisória quanto na definitiva, ou se persistirão com a arcaica ideia de que apenas o dinheiro consiste garantia suficiente à caução dos débitos trabalhistas.
Cássia Ribeiro Araújo
Advogada da equipe trabalhista do VLF Advogados
(1) AGRAVO DE PETIÇÃO. APÓLICE DE SEGURO OFERECIDA COMOGARANTIA DO JUÍZO. IMPRESTABILIDADE. Seguro garantia se assemelha à carta de fiança bancária, que, segundo entendimento contido na Orientação Jurisprudencial nº 59 da SDI - 2 do e. TST, equivale a dinheiro para efeito da gradação dos bens penhoráveis, estabelecida no artigo 655 do CPC. Entretanto, para que efetivamente possa garantir o juízo, é necessário que a apólice do seguro garantia seja expedida com prazo de validade indeterminado ou condicionada até a solução final do processo, sob pena de não atender a finalidade do artigo 884 da Consolidação das Leis do Trabalho. Apelo patronal improvido. (TRT-1 - Agravo de Petição AP 02380006720065010246 RJ).
(2) GARANTIA DO JUÍZO. SEGURO-GARANTIA. Observado o acréscimo do valor da execução, é aceita para garantir o Juízo a apólice do seguro-garantia, em conformidade com o disposto no § 2º do art. 656 do CPC. (TRT-5 - Agravo de Petição AP 00011255220105050013 BA 0001125-52.2010.5.05.0013. Data de publicação: 17/02/2014).