Da supervalorização do mero aborrecimento à caracterização do dano moral
Diego Murça
Em nosso cotidiano, vivenciamos inúmeras circunstâncias capazes de nos causar sentimentos desconfortáveis ou, simplesmente, nos “tirar do sério”. Em que pese à concretização de tais circunstâncias, poucas são aquelas que se tornam suscetíveis a causar dano moral indenizável.
Especialmente no âmbito dos Juizados Especiais, é preciso que os “litigantes de primeira viagem”, se atentem à diferenciação entre o mero aborrecimento, que não é indenizável, e o dano moral passível de indenização.
Carlos Roberto Gonçalves (1) ensina que o dano moral é a “lesão de bem que integra os direitos da personalidade, como a honra, a dignidade, intimidade, a imagem, o bom nome, (...) e que acarreta ao lesado dor, sofrimento, tristeza, vexame e humilhação”.
Neste sentido, os tribunais brasileiros, cada vez mais, têm consolidado o entendimento de que nem toda circunstância que nos leva a um “desgaste emocional” extrapolaria a esfera do mero dissabor e se tornaria causadora de dano moral.
Em atenção a este processo de consolidação do entendimento, o TJDFT, por meio do acórdão proferido por sua Segunda Turma Recursal, reformou a sentença dos autos de nº 0012014-70.2016.8.07.0006, que havia julgado como procedente o pedido indenizatório por danos morais ao consumidor que recebia insistentes ligações de uma instituição bancária, com o oferecimento de serviços. Acesse aqui a íntegra da decisão.
A sentença que julgou procedente o pedido indenizatório foi reformada pela Turma Recursal, que no voto do seu Juiz Relator indicou que “permitir que qualquer evento que traga desgosto seja capaz de atrair reparação de cunho moral é banalizar o instituto e fomentar a indústria da indenização moral”.
Trata-se de decisão que ilustra uma tendência jurisprudencial que não pode ser ignorada por demandantes e demandados diante do cenário em que muitos buscam o Poder Judiciário na falsa perspectiva de recebimento de boladas financeiras.
Entre a supervalorização do mero aborrecimento e a caracterização do dano moral, há uma linha que tem se mostrado cada vez menos tênue e que deve ser ressaltada para afastar o enriquecimento sem causa.
Diego Murça
Advogado da equipe de Contencioso Consumerista do VLF Advogados
(1) GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008. v. IV.