Inovações no processo licitatório: primeiras impressões do PLS nº 559/2013 e do PL nº 6814/2017
Maria Tereza Fonseca Dias
O Senado Federal brasileiro, em 03/06/2013, constituiu Comissão Especial para atualizar e modernizar a Lei nº 8.666/1993, que regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências (1).
Em dezembro do mesmo ano em que a comissão foi constituída, o relatório final foi concluído com a apresentação do projeto de lei que se propôs a revogar expressamente, não só a Lei n.º 8 666/1993, mas também a Lei nº 10.520/2001 (Lei do Pregão) e a Lei nº 12.462/2011, que institui o Regime Diferenciado de Contratações Pública (RDC).
Após tramitar nas comissões parlamentares pertinentes do Senado Federal, o Plenário da Casa aprovou em primeiro turno, no dia 08/12/2016, o Projeto de Lei do Senado – PLS n.º 559/2013 (2) que trata da modernização da Lei de Licitações e Contratos, a partir de substitutivo apresentado ao relatório da citada Comissão (3). Aprovado em segundo turno de votação, o citado projeto foi submetido à revisão da Câmara dos Deputados, em fevereiro de 2017, nos termos do art. 65 da Constituição Federal, em 03/02/2017, passando a tramitar sob o nº 6.814/2017 (4). Assim, longa ainda será a discussão e a tramitação da matéria e não há qualquer indicativo de prazo para que o novo marco jurídico da contratação pública brasileira seja aprovado.
Em entrevista sobre o tema, antes mesmo de constituída a Comissão de Estudos, a administrativista brasileira Maria Sylvia Zanella Di Pietro contextualiza a necessidade da reforma da legislação atual devido, sobretudo, em razão do seu excesso de formalismo, que culmina em desvios de conduta das autoridades e corrupção (5).
Sob a visão dos economistas (6), dois elementos são centrais para a reforma legislativa e sua mudança: 1) a eficiência do arcabouço institucional, para melhoria da qualidade das regras, harmonização de procedimentos, favorecimento da “inteligência” das compras em detrimento do seu formalismo e comportamento burocrático; 2) a eficiência dos próprios contratos e dos critérios de adjudicação. Quanto a esse segundo aspecto, Eduardo Fiúza propõe seis modificações no modelo atual:
“a) os tipos de contratos ou empreitadas utilizados na contratação de obras públicas podem ser expandidos e aperfeiçoados, com vistas a reduzir os custos de transação com aditamentos;
b) devem ser feitas pesquisas sobre o impacto da complexidade de obras na ocorrência de aditamentos, para que se possa pensar em melhores critérios e regras de remuneração e de garantia dos contratos;
c) a habilitação dos fornecedores deve ser integrada num grande cadastro positivo, que daria maiores incentivos ao bom desempenho dos fornecedores, especialmente nos quesitos de qualidade não-contratáveis;
d) o melhor planejamento de compras e financeiro é fundamental para se baixar os custos financeiros dos fornecedores e obter melhores preços para a Administração Pública. Os atrasos de pagamentos só prejudicam o Estado, pois favorecem a corrupção e/ou elevam os custos financeiros embutidos nos preços pagos;
e) precisa ser avaliado o impacto das regras de inexequibilidade atuais sobre os preços obtidos nos leilões licitatórios;
f) o uso de critérios de adjudicação a propostas economicamente mais vantajosas ajudaria a melhorar a qualidade dos bens e serviços adquiridos” (7).
Dois elementos sobressaem dessas propostas: o problema da corrupção e o excessivo formalismo da legislação em vigor.
Conforme divulgado pelo próprio Senado (8), as principais inovações do projeto foram:
a) a inversão de fases da licitação (julgamento das propostas antes da habilitação) como regra geral do certame, vez que na atual legislação este procedimento somente é obrigatório no pregão;
b) a contratação de seguro, que poderá garantir a conclusão de uma obra pública, em caso de dificuldades enfrentadas pela empresa responsável;
c) a criação da figura do projeto completo, em substituição aos atuais projeto básico (9) e executivo (10);
d) a responsabilização solidária da empresa ou prestador de serviços pelo dano causado ao erário na contratação direta indevida, por dispensa ou inexigibilidade de licitação;
e) estabelece como crime a omissão de dados ou informações;
f) estimula a administração a recorrer ao pregão e à concorrência;
g) cria a modalidade de diálogo competitivo, já usada em muitos países da Europa.
Ainda que traga diversas inovações pontuais, duas críticas preliminares podem ser feitas ao PLS nº 559/2013 e PL nº 6814/2017: 1) ele mantém uma estrutura analítica e pormenorizada da legislação, deixando pouca – ou praticamente nenhuma – margem de adaptação dos seus preceitos por parte dos Estados-membros e Municípios com realidades bastante distintas entre si (sociais e economicamente); 2) antes de renovar o sistema de contratação pública brasileira, o PL tem por escopo muito mais consolidar a legislação, que se tornou deveras esparsa nas últimas décadas. Nesse sentido, poder-se-ia avançar muito mais, considerando, inclusive, as experiências de outros países. Essas críticas tendem a demonstrar que os principais problemas identificados e que ensejariam a reforma da legislação – o formalismo e a corrupção – provavelmente não serão superados na experiência da Administração brasileira, após a aplicação da nova legislação.
O atual modelo das contratações públicas enfrenta uma série de problemas. No processo licitatório, se destacam: assimetria de informações, seleção adversa e custos de transação. Na execução contratual, a administração enfrenta o problema do risco moral (moral hazard), tornando a Administração refém do contratado, situação denominada “hold up”.
As primeiras impressões a serem apresentadas aos Projetos de Lei estudados, visam ressaltar os aspectos positivos propostos que podem colaborar na solução dos problemas apontados, tomando como base o texto oficial remetido pelo Senado à Câmara dos Deputados em 03/02/2017 (PLS nº 559/2013).
O PLS contém alguns instrumentos para enfrentar os problemas do processo licitatório apontados, entre os quais destacam-se:
a) Projeto completo (art. 5º, inciso XXIII (11) do PLS)
Em que pese bastante semelhante ao conceito do Projeto Básico que há na Lei nº 8.666/1993 (art. 6.º, inciso IX), o projeto completo aperfeiçoa as exigências acerca da identificação dos serviços a executar (alínea “c”) especialmente quanto ao problema da “[...] segurança executiva na utilização do objeto, para os fins a que se destina, considerados os riscos e perigos identificáveis” (12). Há, portanto, a proposta de seu aperfeiçoamento quanto aos riscos a serem estimados, que é um dos elementos mais importantes na futura execução contratual, evitando-se, a todo tempo, pedidos de aditamento do contrato e de seu reequilíbrio econômico-financeiro.
O projeto completo, no contexto do PLS, também passou a integrar a previsão do art. 16, que trata da fase preparatória da licitação. Essa fase, que inexistia de maneira clara e detalhada na Lei nº 8.666/1993, passa a ser orientada pelo planejamento, devendo abordar todas as considerações técnicas, mercadológicas e de gestão que podem interferir na contratação, compreendendo, conforme previsão do inciso II, do citado artigo “[...] a definição do objeto para atender à necessidade, por meio de anteprojeto, projeto completo, projeto executivo ou termo de referência [...]” (13).
Para o Presidente do Conselho de Arquitetura do Brasil, Haroldo Pinheiro, “Licitar uma obra sem um projeto completo é se aventurar. Sem o projeto não se sabe se a obra vai durar um, seis ou 24 meses. Os aditivos aos projetos também acabam virando uma rotina. É um convite para se rasgar dinheiro público” (14).
Assim, a fase preparatória da licitação e a definição precisa do objeto da contratação são importantes para corrigir, notadamente, o problema da assimetria de informações, que desemboca na seleção adversa do contratado.
b) Diálogo competitivo
Previsto no art. 25, inciso VI, como nova modalidade de licitação, permite que a administração pública divulgue suas necessidades e obtenha dos licitantes, antes mesmo do julgamento do certame, propostas de solução mais adequada e que atenda às suas necessidades ou que apresente requisitos técnicos aptos a concretizar a solução já definida; ou, ainda, defina uma estrutura jurídica ou financeira do contrato.
O modelo de diálogo competitivo proposto tem como fonte de inspiração o regulamento de compras públicas da Comunidade Econômica Europeia, utilizado, entre outras situações, nas hipóteses em que a especificação dos produtos/serviços finais a serem adquiridos não pode ser desenvolvida previamente (15).
Na PLS n.º 559/2013, o diálogo competitivo foi definido como (art. 5.º, inciso XLI): “[...] modalidade de licitação em que a Administração Pública realiza diálogos com licitantes previamente selecionados com o intuito de desenvolver uma ou mais alternativas capazes de atender às suas necessidades, devendo os licitantes apresentar proposta final após o encerramento do diálogo”(16).
O diálogo competitivo, em conformidade com o que foi definido no art. 6º, incisos I e II, do PLS n.º 559/2013, será restrito a contratações que envolvam objetos referentes a inovação tecnológica ou técnica; possibilidade de execução com diferentes metodologias; possibilidade de execução com tecnologias de domínio restrito no mercado.
A modalidade permite a redução da assimetria de informações, considerando que as partes venham a definir e identificar os meios e as alternativas que possam vir a satisfazer as necessidades da Administração Pública, vez que os modos de disputa aberto e fechado (17) não permitem apreciação adequada das variações entre propostas.
c) Responsabilização penal do projetista por omissão grave de dado ou informação
Trata-se de novidade do PLS nº 559/2013, que introduziu a responsabilização penal do projetista, crime que ficou denominado como “Omissão grave de dado ou de informação por projetista”(18), com previsão de pena privativa de liberdade (reclusão), de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, e multa (19).
Ao responsabilizar o projetista, tenta-se evitar o problema da assimetria de informação e da seleção adversa, vez que o efeito esperado dessa regra é também o aperfeiçoamento do objeto da contratação, a partir do qual assegura-se a seleção da proposta “[...] apta a gerar o resultado de contratação mais vantajoso para a Administração Pública” (art. 9.º, I, do PLS n.º 559/2013).
d) Limitação e vedação a aceitação de propostas agressivas
A ideia de constranger a aceitação de propostas incompatíveis com os orçamentos elaborados na fase preparatória do certame, pela Administração, pode também colaborar na solução do problema da seleção adversa.
O art. 53 do PLS n.º 559/2013(20) inclui várias medidas nesse sentido, entre as quais devem-se destacar: 1) a regra que desclassifica a proposta inexequível ou acima do preço fixado pela Administração (art. 53, III); 2) no caso das obras de engenharia, os valores sobre os quais poderá recair a avaliação do sobrepreço – o preço global, os quantitativos e os preços unitários considerados relevantes, visando evitar a prática do “jogo de planilha”(21) que gera assimetria informacional e seleção adversa (art. 53, § 3º); 3) a definição objetiva das hipóteses do que se considera proposta manifestamente inexequível, que são as propostas cujos valores sejam inferiores a 80% (oitenta por cento) do menor dos seguintes valores: I – média aritmética dos valores das propostas superiores a 80% (oitenta por cento) do valor orçado pela Administração; II – valor orçado pela Administração (art. 53, § 4º).
Além dessas regras, na hipótese em que o licitante for escolhido por ter apresentado proposta inferior a 85% do menor dos valores possíveis (o valor orçado pela Administração ou da média aritmética dos valores das propostas superiores a 80% do valor orçado) passa-se a exigir prestação de garantia adicional para assinatura do contrato, sem prejuízo das demais garantias (art. 53, § 5º)(22).
e) Modelagem contratual (contratação integrada e semi-integrada)
Visando aprimorar a eficiência dos contratos, notadamente os de obras públicas, bem como seus critérios de adjudicação, foi proposta a expansão e aperfeiçoamento das modelagens de sua execução indireta, a partir dos modelos de contratação integrada e semi-integrada. O modelo de contratação integrada – hoje expressamente previsto no Regime Diferenciado de Contratação Pública (Lei nº 12.462/2011 – art. 9.º) – já estava descrito no Decreto nº 2.745/1998, que tratava do regime especial de contratação da Petrobrás (item 1.9 (23)). Encontra-se também em vigor, na Lei nº 8.666/1993 o regime de execução indireta denominado “empreitada integral”, com a diferença de que ele ainda mantém sob a responsabilidade da Administração Pública a elaboração dos projetos básico e executivo(24).
Nesses modelos levantam-se comumente a vantagem da economia de escala e a assunção dos riscos pelos particulares contratados.
Conforme descrito no art. 5.º, inciso XXX, do PLS n.º 559/2013:
“Art. 5º Para os fins desta Lei, consideram-se: [...]
XXX – contratação integrada – regime de contratação no qual o contratado fica responsável pela elaboração e o desenvolvimento do projeto completo e executivo, além da execução de obras e serviços de engenharia, do fornecimento de bens ou da prestação de serviços especiais, bem como da montagem, realização de testes, pré-operação e por todas as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto, ao fornecimento dos bens ou à prestação dos serviços, com remuneração por preço global, em conformidade com as etapas de avanços da execução contratual”(25).
Na contratação integrada, o particular fica responsável por toda o processo de entrega do objeto contratado, incluindo os projetos necessários a sua elaboração ficando a Administração com a obrigatoriedade de apresentar apenas anteprojeto (art. 41, § 6.º)(26).
Como anota Juliano Heinen, em relação ao modelo de contratação integrada, “[...] o Estado está entregando ao particular uma tarefa que tradicionalmente era sua, qual seja, a confecção do projeto básico. Para tanto, é importante definir a matriz de risco já quando da confecção do instrumento convocatório”(27).
Destaca-se, ainda, que é bastante criticada esta modelagem de contratação integrada, justamente em virtude dessa questão assinalada por Heinen. Isso porque, como assinala Renato Rezende, “[...] o Poder Público realizará certame sem dispor de balizamento mínimo daquilo que deseja ver executado. A deficiência de parâmetros comparativos prejudica a aferição do grau de adequação das propostas às necessidades do Poder Público e abre margem ao subjetivismo no julgamento. Ademais, dá-se um poder excessivo ao contratado para definir o que e como será executado”(28).
Mesmo no âmbito do PLS nº 559/2013, Alécia Bicalho e Flávio Unes Pereira criticam a modelagem ao afirmarem que, na contratação integrada, “[...] o legislador pretende (a nosso ver sem muita eficiência) extirpar de vez a insuficiência de conteúdo do projeto (básico) licitado, que tem marcado a maioria dos projetos cujas lacunas e inconsistências são causa das patológicas e persistentes alterações supervenientes à contratação, com conhecidas consequências”(29).
Nesse sentido, o que se propõe para solucionar a questão da assimetria de informações e seleção adversa pode produzir o efeito exatamente contrário, gerando ainda mais problemas na execução do contrato. Importante assinalar que o PLS nº 559/2013, no entanto, em atenção a essas eventuais falhas, cuida, entre outras medidas, de restringir as hipóteses de alteração do valor do contrato quando de sua execução (art. 101, § 9.º, PLS n.º 559/2013)(30).
A contratação semi-integrada, por sua vez – em que pese já introduzida no art. 42, inciso V, da Lei n.º 13 303/2016, que instituiu o Estatuto Jurídico das Estatais –, é considerada uma das grandes novidades do PLS. A principal diferença em relação a contratação integrada é que, nesta hipótese, a Administração deverá elaborar o projeto relacionado ao objeto contratado (obras e serviços), ficando sob a responsabilidade do particular o projeto completo, que hoje é denominado “projeto executivo” na Lei nº 8.666/1993.
Como descrevem Alécia Bicalho e Flávio Unes Pereira, na contratação semi-integrada, “[...] o contratado fica responsável pela elaboração e o desenvolvimento do projeto executivo, além da execução de obras e serviços de engenharia, do fornecimento de bens ou da prestação de serviços especiais, bem como da montagem, realização de testes, pré-operação e por todas as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto, ao fornecimento dos bens ou à prestação dos serviços”(31).
Eis a definição da contratação semi-integrada no PLS n.º 559/2013:
“Art. 5º Para os fins desta Lei, consideram-se: [...]
XXXI – contratação semi-integrada – regime de contratação no qual o contratado fica responsável pela elaboração e o desenvolvimento do projeto executivo, além da execução de obras e serviços de engenharia, do fornecimento de bens ou da prestação de serviços especiais, bem como da montagem, realização de testes, pré-operação e por todas as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto, ao fornecimento dos bens ou à prestação dos serviços, a ser remunerado de forma mista, em função dos quantitativos apurados em medições das prestações executadas ou em função das fases de avanço das etapas de execução, conforme o caso”.
A contratação semi-integrada, no entanto, “[...] apresenta maior utilidade ao transferir ao contratado a elaboração do projeto básico (ou, nos termos do Projeto, do “completo”), na parte em que sua expertise for efetivamente essencial, executando-se todo o mais com base em projeto completo da própria Administração”.
Como visto, a contratação semi-integrada pode colaborar – melhor do que na contratação integrada - na eficiência e resultados do contrato ao mesmo tempo que coíbe o problema da seleção adversa.
f) Redução dos custos de transação
Foi introduzida regra específica, no PLS n.º 559/2013, no sentido de se considerar os custos de transação nas hipóteses de escolha dos critérios de julgamento de menor preço ou maior desconto (art. 31, § 1º) (32).
Tal previsão, entre outros problemas, pode evitar a assimetria de informações, a seleção a diversa e o risco moral da execução dos contratos.
Assim, como descrito, várias propostas do PLS n.º 559/2013 descritas anteriormente contribuem para evitar o risco moral e que a Administração fique refém no contratado na execução contratual.
Considerando os problemas da contratação pública brasileira, persiste o grande dilema da legislação em vigor, que é lidar com o paradoxo da eficiência versus o da legalidade. Primeiramente, a própria compreensão da noção de eficiência deve ser problematizada para que não fique restrita a ideia de maximização da riqueza ou da simples noção de custo-benefício, vez que o sistema de contratação pública deve também considerar critérios de bem-estar e ainda um dos próprios objetivos da licitação que é incentivar o desenvolvimento socioeconômico (art. 9.º, inciso III, do PLS n.º 559/2013).
A complexa e intrincada legislação brasileira dos contratos públicos determina a escolha da proposta mais vantajosa para a Administração Pública e a isonomia dos participantes. Ao mesmo tempo determina alguns fins sociais da contratação, tais como o combate ao trabalho infantil, a proteção social do trabalho e a quitação dos encargos sociais das empresas contratadas (art. 55, inciso III, do PLS n.º 559/2013).
Não se pode desconsiderar que houve esforço do legislador nacional em aprimorar o processo de contratação pública e a percepção de que o arcabouço legal existente é insuficiente e causa das mazelas da contratação pública brasileira.
Entretanto, por mais que se busque a reformulação legislativa para a resolução dos problemas apontados, há uma reforma comportamental necessária a ser feita, que modifique como os atores sociais – públicos e privados – lidam com a coisa pública no País.
Maria Tereza Fonseca Dias
Coordenadora da área de direito administrativo e regulatório do VLF Advogados
(1) Os dados da tramitação dos trabalhos da comissão e os documentos produzidos podem ser consultados em: <http://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/112987>.
(2) Os dados da tramitação do projeto do Senado, já concluída, podem ser conferidos em: https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/115926.
(3) Cf. as informações oficiais publicadas sobre a tramitação do projeto em Brasil, Senado Federal, aprovado em primeiro turno projeto que atualiza lei de licitações, disponível em: http:// www12.senado.leg.br/noticias/materias/2016/12/08/aprovado-em-primeiro-turno-projeto-que-atualiza-lei-de-licitacoes, acesso em: fev. 2017.
(4) O Projeto de Lei "Institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e revoga a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, a Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002, e dispositivos da Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2011.
(5) Na entrevista a jurista afirmou: “Eu comecei a achar que a Lei nº 8.666/1993 deveria ser alterada assim que ela foi promulgada. Ela é excessivamente formalista. Naquela época se falava muito na moralidade das licitações... Hoje ficou mais do que provado que o formalismo da lei não contribuiu em nada para acabar com a corrupção. Uma licitação pode ser formalmente tida como perfeita, só que não se sabe quais as trocas, as coisas que «são feitas por trás». Talvez seja a própria Lei n.º 8.666/93 que leve as autoridades a procurarem «caminhos paralelos». São muitas exigências. Não há liberdade alguma” (Maria Sylvia Zanella Di Pietro, “Entrevista”, in Revista do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, n.º 1, v. 82, a. XXX, jan./mar. 2012, pp. 15-26, p. 26).
(6) Eduardo P. S. Fiúza, “Licitações e governança de contratos: a visão dos economistas”, in Lucia Helena Salgado e Eduardo. P. S. Fiúza (Org.), Marcos Regulatórios no Brasil: é tempo de rever regras?, Rio de Janeiro: IPEA, 2009.
(7) Idem, pp. 271-272.
(8) BRASIL, Senado Federal, Agenda Brasil: Comissão aprova projeto que atualiza lei de licitações, disponível em: http://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2016/11/09/agenda-brasil-comissao-aprova-projeto-que-atualiza-lei-de-licitacoes, acesso em: fev. 2017
(9) Em conformidade com o art. 6.º, IX, da Lei n.º 8 666/1993, o Projeto Básico é definido como “[...] conjunto de elementos necessários e suficientes, com nível de precisão adequado, para caracterizar a obra ou serviço, ou complexo de obras ou serviços objeto da licitação, elaborado com base nas indicações dos estudos técnicos preliminares, que assegurem a viabilidade técnica e o adequado tratamento do impacto ambiental do empreendimento, e que possibilite a avaliação do custo da obra e a definição dos métodos e do prazo de execução, devendo conter os seguintes elementos: [...]” (Brasil, Lei n.º 8 666/1993, disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8666cons.htm, acesso em: mar. 2017).
(10) Em conformidade com o art. 6.º, X, da Lei n.º 8 666/1993 (cit.), o Projeto Executivo é o “[...] conjunto dos elementos necessários e suficientes à execução completa da obra, de acordo com as normas pertinentes da Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT”.
(11) “Art. 5º. Para os fins desta Lei, consideram-se: [...] XXIII – projeto completo: conjunto de elementos necessários e suficientes, com nível de precisão adequado, para caracterizar a obra ou o serviço, ou o complexo de obras ou de serviços objeto da licitação, elaborado com base nas indicações dos estudos técnicos preliminares, que assegure a viabilidade técnica e o adequado tratamento do impacto ambiental do empreendimento e que possibilite a avaliação do custo da obra e a definição dos métodos e do prazo de execução, devendo conter os seguintes elementos:
a) desenvolvimento da solução escolhida, de forma a fornecer visão global da obra e a identificar todos os seus elementos constitutivos com clareza;
b) soluções técnicas globais e localizadas, suficientemente detalhadas, de forma a minimizar a necessidade de reformulação ou de variantes durante as fases de elaboração do projeto executivo e de realização das obras e montagem;
c) identificação dos tipos de serviços a executar e de materiais e equipamentos a incorpo- rar à obra, bem como suas especificações , de modo a assegurar os melhores resultados para o empreendimento e a segurança executiva na utilização do objeto, para os fins a que se destina, considerados os riscos e perigos identificáveis , sem frustrar o caráter competitivo para a sua execução;
d) informações que possibilitem o estudo e a dedução de métodos construtivos , instalações provisórias e condições organizacionais para a obra, sem frustrar o caráter competitivo para a sua execução;
e) subsídios para montagem do plano de licitação e gestão da obra, compreendendo a sua programação, a estratégia de suprimentos, as normas de fiscalização e outros dados necessários em cada caso;
f) orçamento detalhado do custo global da obra, fundamentado em quantitativos de serviços e fornecimentos propriamente avaliados”.
(12) BRASIL., Senado Federal, PLS n.º 559/2013, disponível em: https://www25.senado.leg.br/web/ atividade/materias/-/materia/115926, acesso em: mar. 2017.
(13) BRASIL. Senado Federal, PLS n.º 559/2013, cit.
(14) Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR), disponível em: http://www. caubr.gov.br/haroldo-pinheiro-defende-projeto-completo-em-entrevista-ao-el-pais/, acesso em: 16 mar. 2016.
(15) Sobre o tema, cf. Flávia de Holanda Schimidt Squeff, “Compras públicas e inovação: notas iniciais sobre a experiência da União Europeia”, in Radar, São Paulo, n.º 42, dez. 2015, pp. 19-28, disponível em: http://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/5981/1/Radar_n42_compras.pdf, acesso em: fev. 2017.
(16) Brasil, Senado Federal, PLS n.º 559/2013, cit.
(17) Em conformidade com o previsto no art. 50 do PLS 559/2013, “Regulamento disporá sobre a apresentação de propostas e lances, que poderá ser, isolada ou conjuntamente: [...] I – aberta, hipó-tese em que os licitantes apresentarão suas ofertas por meio de lances públicos e sucessivos, crescentes ou decrescentes, conforme o critério de julgamento adotado; II – fechada, hipótese em que as propostas permanecerão em sigilo até a data e hora designadas para sua divulgação” (Brasil, Senado Federal, PLS n.º 559/2013, cit.).
(18) “Art. 337-0. Omitir, modificar ou entregar à Administração levantamento cadastral ou condição de contorno em relevante dissonância com a realidade, em frustração ao caráter competitivo da licitação ou em detrimento do princípio fundamental da obtenção da melhor vantagem, seja em contrato para a elaboração de projeto completo, projeto executivo ou anteprojeto, seja em procedimento de manifestação de interesse”.
(19) Em conformidade com a previsão do art. 337-P do PLS 559/2013, a pena de multa cominada não poderá ser inferior a 2% (dois por cento) do valor do contrato licitado ou celebrado com contratação direta.
(20) “Art. 53. Serão desclassificadas as propostas que: [...] III – apresentarem preços manifestamente inexequíveis ou permanecerem acima do orçamento estimado para a contratação; IV – não tiverem sua exequibilidade demonstrada, quando exigido pela Administração; [...] § 3.º. No caso de obras e serviços de engenharia, para efeito de avaliação da exequibilidade e de sobrepreço, serão considerados o preço global, os quantitativos e os preços unitários considerados relevantes, conforme dispuser regulamento. § 4.º. Consideram-se manifestamente inexequíveis as propostas cujos valores sejam inferiores a 80% (oitenta por cento) do menor dos seguintes valores: I – média aritmética dos valores das propostas superiores a 80% (oitenta por cento) do valor orçado pela Administração; II – valor orçado pela Administração”.
(21) Segundo Marcos Nóbrega, no “jogo de planilha” o licitante apresenta proposta “[...] com base em planilhas de custos aparentemente vantajosas por apresentarem um preço final abaixo dos demais competidores. No entanto, o licitante consegue esse resultado subestimando ou até omitindo custos de outros insumos” (NÓBREGA, Marcos “Análise Econômica do Direito Administrativo”, cit., p. 409).
(22) Eis a regra introduzida no art. 53, § 5.º, do PLS n.º 559/2013: “Art. 53 [...] § 5.º Dos licitantes classificados na forma do § 4.º que houverem apresentado proposta com valor global inferior a 85% (oitenta e cinco por cento) do menor dos valores a que se referem os incisos do § 4.º, será exigido, para assinatura do contrato, prestação de garantia adicional, sem prejuízo das demais garantias exigíveis, de acordo com esta Lei, igual à diferença entre o valor da proposta e 85% (oitenta e cinco por cento) do menor dos valores a que se referem os incisos do § 4.º.
(23) O item 1.9 do Regulamento do Procedimento Licitatório Simplificado da Petróleo Brasileiro, S.A. – PETROBRÁS previu que “Sempre que economicamente recomendável, a PETROBRÁS poderá utilizar-se da contratação integrada, compreendendo realização de projeto básico e/ou detalhamento, realização de obras e serviços, montagem, execução de testes, pré-operação e todas as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto, com a solidez e segurança especificadas” (Brasil, Decreto n.º 2 745/1998, disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ decreto/d2745.htm, acesso em: mar. 2017).
(24) Empreitada integral – quando se contrata um empreendimento em sua integralidade, compreendendo todas as etapas das obras, serviços e instalações necessárias, sob inteira responsabilidade da contratada até a sua entrega ao contratante em condições de entrada em operação, atendidos os requisitos técnicos e legais para sua utilização em condições de segurança estrutural e operacional e com as características adequadas às finalidades para que foi contratada (Brasil, Lei n.º 8 666/1993, cit.).
(25) Brasil, Senado Federal, PLS n.º 559/2013, cit.
(26) “Art. 41 [...] § 6.º. A Administração é dispensada da elaboração de projeto completo nos casos de contratação integrada, hipótese em que deverá ser elaborado anteprojeto de acordo com metodologia definida em ato do órgão competente, que conterá: I – demonstração e justificativa do programa de necessidades, visão global dos investimentos e definições quanto ao nível de serviço desejado; II – condições de solidez, segurança e durabilidade; III – prazo de entrega; IV – diretrizes para a concepção estética do projeto arquitetônico ; V – parâmetros de adequação ao interesse públi-co, de economia na utilização, de facilidade na execução, de impacto ambiental e de acessibilidade” (Brasil, Senado Federal, PLS n.º 559/2013, cit.).
(27) Juliano Heinen, “A contratação integrada no regime diferenciado de contratações (Lei n.º 12 462/11)”, in Revista de Direito PGE-GO, Goiânia, v. 28, 2013, disponível em: http://www.pge.go. gov.br/revista/index.php/revistapge/article/viewFile/446/404, acesso em: mar. 2013.
(28) Renato Monteiro de Rezende, “O Regime Diferenciado de Contratações Públicas: comentários à Lei n.º 12 462, de 2011”, in Textos para Discussão, n.º 100, Brasília: Senado Federal, 2011, p. 46.
(29) Alécia Paolucci Nogueira Bicalho e Flávio Henrique Unes Pereira, “As mudanças na nova Lei de Licitações e Contratos”, disponível em: https://jota.info/especiais/mudancas-na-nova-lei-de-licitacoes-e-contratos-19122016, acesso em: mar. 2017.
(30) “Art. 101. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos: [...] § 9.º Nas hipóteses em que for adotada a contratação integrada, é vedada a alteração dos valores contratuais, exceto nos seguintes casos: I – para recomposição do equilíbrio econômico-financeiro decorrente de caso fortuito ou força maior; II – por necessidade de alteração do projeto ou das especificações para melhor adequação técnica aos objetivos da contratação, a pedido da Administração, desde que não decorrente de erros ou omissões por parte do contratado, observados os limites estabelecidos no § 1.º”.
(31) Alécia Paolucci Nogueira Bicalho e Flávio Henrique Unes Pereira, “As mudanças na nova Lei de Licitações e Contratos”, cit.
(32) “Art. 31. O julgamento por menor preço ou maior desconto considerará o menor dispêndio para a Administração, atendidos os parâmetros mínimos de qualidade definidos no edital de licitação. § 1.º Os custos indiretos, relacionados com as despesas de manutenção, utilização, reposição, depreciação e impacto ambiental, entre outros fatores, poderão ser considerados para a definição do menor dispêndio, sempre que objetivamente mensuráveis, conforme dispuser regulamento”.