Solidariedade do apresentante de título a protesto por danos morais é confirmada pelo STJ
Luciana de Lourdes Marques Corrêa Netto
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça ("STJ"), por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 1.653.151/SP (1), ocorrido neste mês, sedimentou o entendimento de que as instituições financeiras respondem solidariamente pela ilicitude da irregularidade da extração das duplicatas, quando não se acautelam em confirmar a procedência das cambiais.
O caso fático trata de uma Ação Declaratória de Inexigibilidade de Obrigação Cambiária cumulada com Indenização por Danos Morais, ajuizada contra determinada empresa, responsável por sacar duplicatas e endossa-las para instituições financeiras, também Rés na Ação, as quais foram protestadas indevidamente.
Na primeira instância, os pedidos foram julgados parcialmente procedentes, para declarar a nulidade das duplicatas e condenar a endossante/mandante ao pagamento de indenização por danos morais, cujo valor foi fixado em R$6.000,00 (seis mil reais). Com relação às instituições financeiras, o juízo de primeiro grau entendeu serem elas ilegítimas para responder pelos danos e acabou por extinguir o feito sem resolução do mérito.
Em recurso de Apelação manejado ao egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo (“TJSP”), a parte autora/recorrente se insurgiu contra a exclusão dos Bancos, pleiteando fossem estes reintegrados ao polo passivo e, consequentemente, reconhecida a sua responsabilidade pelos danos decorrentes do protesto indevido de duplicatas.
O TJSP, por ocasião do julgamento da Apelação, acolheu as razões recursais e deu provimento ao apelo, para reincluir as instituições financeiras no polo passivo da lide, “[...] condenando-as no pagamento, cada uma, dos honorários de 10% sobre o valor da condenação, bem como na repartição das custas e despesas processuais, e nos danos morais majorados para R$10.000,00, atualização da sentença de primeira instância, juros de 1% da citação, mantida no mais a decisão monocrática.” (2)
Iniciado o cumprimento de sentença, as instituições financeiras depositaram apenas o valor que consideravam devido, porquanto tinham o entendimento de que não havia expressa solidariedade na condenação, argumento este que não foi acolhido pelo juízo de primeira instância.
Em vista disso, foi interposto Agravo de Instrumento (autos nº 2259665-07.2015.8.26.0000), por uma das instituições financeiras executadas, sustentando em suas razões que, não estando a solidariedade expressa no aresto, não há que aplicar-se ao caso. Acrescentou se tratar de mera manobra da parte exequente para que os Bancos fossem responsabilizados pelo pagamento da indenização.
O TJSP, por meio de decisão monocrática proferida pelo douto Relator do Agravo de Instrumento, entendeu de forma contrária, consignando não haver dúvidas de que, com a reintegração das instituições financeiras ao polo passivo da demanda, estas estavam solidariamente responsáveis pelo pagamento da indenização fixada.
Daí a interposição do Recurso Especial ora noticiado (nº 1.653.151/SP), por meio do qual se sustentou violação ao artigo 265 do Código Civil, que assim estabelece:
“A solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes.” (3)
O STJ, por meio da análise feita pela Relatora do Recurso Especial, Ministra Nancy Andrighi, interpretou a lei e ressaltou, inicialmente, que quando pairar dúvida quanto ao dispositivo da sentença, este deverá ser interpretado de forma integrada com a fundamentação. Acrescentou que, ao analisar o voto condutor do acórdão, concluiu que o TJSP reconheceu expressamente a responsabilidade solidária das endossatárias (instituições financeiras). Confira:
"Com efeito, para aferir se houve ou não a condenação solidária dos demandados, no tocante aos danos morais, oportuno ressaltar que a jurisprudência desta Corte possui o entendimento no sentido de que, quando houver dúvida em relação ao dispositivo da sentença, este deve ser interpretado de forma integrada com a sua fundamentação, que lhe dá sentido e alcance, em conformidade com o pedido formulado, estabelecendo os limites da lide. [...]
Verifica-se que o Tribunal de origem, ao reincluir as instituições financeiras no polo passivo da demanda, reconheceu expressamente a responsabilidade solidária da endossante e das endossatárias."
Ainda de acordo com a Ministra, a conclusão dada ao caso pelo tribunal de origem está em consonância com a jurisprudência do STJ, a qual considera que o endossante/mandante e o endossatário/mandatário respondem solidariamente pelos danos causados, ainda que a culpa seja exclusiva do mandatário, pois não há a transferência da propriedade do título. Citou como precedentes o REsp nº 1.387.236/MS, da Terceira Turma, o AgRg no AREsp nº 698.938/SC, também da Terceira Turma e o AgRg no AREsp nº 586.453/PR, da Quarta Turma, todos do STJ.
O entendimento do STJ está amparado pelo artigo 932, III, do Código Civil que dispõe que o empregador ou comitente, são responsáveis também pela reparação civil, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele.
Leia o acórdão aqui.
Luciana de Lourdes Marques Corrêa Netto
Advogada do contecioso estratégico do VLF Advogados
(1) STJ – Recurso Especial nº 1.637.094/SP, Terceira Turma, Relatora Ministra Nancy Andrighi. Julgado em 06/06/2017. Publicado em 12/06/2017. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1610554&num_registro=201603020979&data=20170612&formato=PDF>. Último acesso em 16 de junho de 2017.
(2) TJSP – Apelação Cível nº 0115828-60.2008.8.26.0100, 14ª Câmara de Direito Privado, Relator Desembargador Carlos Henrique Abrão. Julgado em 14/06/2013. Publicado em 19/06/2013. Disponível em: <https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=6818827&cdForo=0>. Último acesso em 16 de junho de 2017.
(3) Art. 265. A solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes.
(4) Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:[...]
III – o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele.