STJ decide que falência empresarial interrompe prazo de usucapião
Luciana Netto e Roberta Pabline
Recentemente, em decisão publicada no dia 16.10.2017 (1), o Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) fixou entendimento de que a decretação de falência interrompe o curso da prescrição aquisitiva de propriedade da massa falida.
Os autores da ação de usucapião, na origem, buscavam a aquisição de imóvel de pessoa jurídica, por possuírem-no de forma mansa, pacífica e ininterrupta desde o ano de 1971. Para tanto, eles fundamentaram seu pedido no Código Civil de 1916 (2), que previa um prazo prescricional de 20 anos.
A sentença julgou improcedente o pedido, por entender que a decretação de falência do proprietário do bem interrompeu o prazo da usucapião.
Assim, ante a ausência de decurso do prazo vintenário para alcançar a prescrição aquisitiva, a massa falida não poderia perder sua propriedade sobre o imóvel. O egrégio Tribunal do Rio de Janeiro, por ocasião do julgamento do recurso de apelação interposto pelos autores, manteve a decisão de primeiro grau.
Os ocupantes do imóvel, contudo, alegaram que a falência não deve prejudicar a usucapião, pois a decretação de quebra impossibilita o falido de dispor de seus bens, mas não afeta os terceiros que adquiriram o direito por meio da prescrição aquisitiva.
O propósito do apelo nobre, então, cuja relatoria ficou a cargo da eminente Ministra Nancy Andrighi, era decidir se houve usucapião de imóvel que compõe a massa falida da empresa recorrida, à luz do Decreto Lei n. 7.661/45 (3), tendo em vista que a decretação da falência ocorreu em 8.6.1987, quando essa norma ainda estava vigente.
A ilustre Ministra Relatora teceu interessantes considerações a respeito da decretação da falência, sobretudo porque, neste caso, ocorreu sob a égide do DL n. 7.661/45, conforme determina o art. 192 (4) da Lei n. 11.101/2005.
Consoante bem pontuado pela Ministra em seu voto, motivada pelos ensinamentos do jurista Pontes de Miranda, citado na decisão, a sentença declaratória da falência produz efeitos imediatos, tão logo prolatada pelo juízo concursal e acrescenta que:
Toda a estrutura normativa orienta o indispensável tratamento analítico com o termo legal da falência e as respectivas consequências irradiadas para os envolvidos no complexo processo falimentar. A propósito, é interessante recordar as preciosas lições de Pontes de Miranda quando acentua a constrição geral do patrimônio do falido como um ato de penhoramento abstrato decorrente da decretação da falência. Isso quer dizer que o Estado, sem necessidade do ato material, retira a posse e preestabelece outros efeitos jurídicos no tocante à extensão objetiva do concurso de credores.
A conclusão alcançada foi a de que o bem imóvel, ocupado por quem tem expectativa de adquiri-lo por meio da usucapião, passa a compor um só patrimônio afetado na decretação da falência, correspondente à massa falida objetiva. Assim, o curso da prescrição aquisitiva da propriedade de bem que compõe a massa falida é interrompido com a decretação da falência, pois o possuidor (seja ele o falido ou terceiros) perde a posse pela incursão do Estado na sua esfera jurídica.
Esta decisão do STJ representa um importante precedente, pois haveria uma grande insegurança para as empresas que, na hipótese de falência, estariam sujeitas à perda da propriedade de imóvel que compusesse a massa falida, em razão das dificuldades naturalmente enfrentadas pelos síndicos ao assumirem a gestão desses bens.
Mais informações sobre a matéria podem ser obtidas com a equipe de contencioso estratégico do VLF Advogados.
Luciana Netto
Advogada da equipe de contencioso estratégico do VLF Advogados
Roberta Pabline
Advogada da equipe de consumidor do VLF Advogados
(1) STJ, REsp 1.680.357/RJ. Decisão disponível em: https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1646000&num_registro=201500575991&data=20171016&formato=PDF
(2) Lei 3.071/16 (Código Civil de 1916). Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L3071.htm
(3) Decreto Lei 7.661/45. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del7661.htm
(4) Art. 192. Esta Lei não se aplica aos processos de falência ou de concordata ajuizados anteriormente ao início de sua vigência, que serão concluídos nos termos do Decreto-Lei no 7.661, de 21 de junho de 1945