Os programas de integridade (compliance) nas contratações públicas e as novas exigências legais para as empresas contratadas
Maria Tereza Fonseca Dias, Bruna Colombarolli e Rodrigo Soares
Desde o advento da Lei Anticorrupção Empresarial (Lei n. 12.846/2013) o tema dos programas de integridade das empresas privadas passou a ser objeto de discussão no âmbito do setor público. Novas regras foram editadas recentemente e outras têm sido discutidas no âmbito dos parlamentos estaduais e municipais, propondo o estabelecimento de exigências para a contratação pública que redefinem o papel dos programas de integridade nas empresas, a partir de múltiplas opções: requisito para contratação; critério de desempate e até mesmo critério para a dosimetria na aplicação de sanções.
A primeira lei editada nesse sentido, a Lei do Estado do Rio de Janeiro (Lei Estadual n. 7.753/2017), estabelece a obrigatoriedade de a empresa ter implantado um programa de compliance para contratar com a Administração Pública daquele estado para obras, serviços e compras consideradas de maior vulto (acima de R$ 1,5 milhão para obras e serviços de engenharia e R$ 650 mil, nos casos de compras e prestações de serviços), por período superior a seis meses).
A lei editada recentemente pelo Distrito Federal (Lei Distrital n. 6.112/2018) caminha no mesmo sentido da lei carioca, ao exigir o programa de integridade para todas as contratações administrativas cujo valor estimado esteja entre R$ 80 mil e R$ 650 mil e com duração igual ou superior a 180 (cento e oitenta) dias. A lei também se aplica aos contratos em vigor, com prazo de duração superior a 12 meses e aos contratos celebrados com ou sem dispensa de licitação.
No Município de São Paulo tramita o Projeto de Lei n. 723/2017, que, diferentemente das leis estaduais precedentes estabelece que a implementação de um Programa de Integridade e Compliance pelas empresas, deverá ser utilizado como critério de desempate nas licitações, não sendo, entretanto, critério obrigatório para a contratação.
Uma das questões relativas a essas leis já editadas e as que ainda estão em discussão no legislativo que certamente será objeto de questionamento refere-se a sua possível inconstitucionalidade, vez que cabe à União editar normas gerais de licitações e contratos (art. 21, XXVII) e a obrigatoriedade de implantação e programas de integridade não consta como exigências das normas gerais de contratação pública. Há também diversos precedentes na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal nesse sentido, ou seja, de reconhecer a inconstitucionalidade de legislações dos entes federativos destoantes das normas gerais editadas pela União.
Há, entretanto, em tramitação na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei n. 7.149, de 2017 (1), que altera a Lei Anticorrupção, para estabelecer diretrizes a serem observadas nos programas de compliance implantados pelas empresas que contratam com a administração pública. Conforme a proposta do referido projeto, será introduzido na Lei n. 12.846/2013 o art. 4º-A com o objetivo de obrigar as pessoas jurídicas que celebrarem contrato com a administração pública a desenvolverem programas de compliance na definição de todas as estratégias da empresa. O referido projeto inclui ainda o art. 4º-B na Lei Anticorrupção, estabelecendo as diretrizes do Programa de Compliance a serem implantados, a saber:
I - os dirigentes ou administradores devem assumir a responsabilidade e o compromisso de combater e não tolerar a corrupção, em quaisquer de suas formas e contexto, inclusive a corrupção privada, extorsão e suborno;
II – gerenciar e rever as políticas de gestão de pessoas, juntamente com os responsáveis pela área de gestão de capital humano;
III - trabalhar na elaboração de manuais de conduta ética e desenvolver planos de disseminação do compliance na cultura organizacional;
IV - viabilizar meios de controle interno para o monitoramento e gerenciamento de práticas empresariais
V - implantar linha de “Disque denúncia” anticorrupção, preservando o anonimato do denunciante;
VI - atender aos requisitos legais e regulatórios;
VII - instituir a cultura ética empresarial, desde o momento da contratação de novos colaboradores;
VIII - estabelecer mecanismos que impeçam ou ao menos coíbam a prática de fraudes internas;
XIX - reforçar a mensagem corporativa da importância da ética, inibindo a má conduta;
XX - reduzir as vulnerabilidades que interfiram na manutenção de um ambiente ético;
XXI – realizar auditorias periódicas;
XXII - fica proibida a contratação de empresas ligadas direta ou indiretamente a agentes políticos;
XXIII - comprovada a gravidade da irregularidade, a denúncia deverá ser encaminhada ao Ministério Público para promover a apuração legal.
Diante das recentes mudanças do cenário normativo no âmbito das contratações públicas, duas conclusões mostram-se claras para as empresas que contratam com a Administração Pública: que elas devem se preparar para implantar e tornar efetivos os seus programas de integridade (compliance) e que eles devem ser tornar obrigatórios para se contratar com o Estado, em curto espaço de tempo.
Mais informações sobre o tema podem ser obtidas junto à equipe de Direito Administrativo e Regulatório do VLF Advogados.
Maria Tereza Fonseca Dias
Sócia da área de Direito Administrativo e Regulatório do VLF Advogados
Bruna Colombarolli
Sócia da área de Direito Administrativo e Regulatório do VLF Advogados
Rodrigo Soares
Estagiário da área de Direito Administrativo e Regulatório do VLF Advogados
(1) Disponível em: <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=426F9A90A2F2EDD472D4B233CA720E00.proposicoesWebExterno1?codteor=1541289&filename=Avulso+-PL+7149/2017> Acesso em: 23 de abril de 2018.