A multa do agravo interno no CPC/2015
Stefânia Bonin
O Código de Processo Civil (“CPC”) de 2015 trouxe, no art. 1.021, § 4º (1), inovação em relação à aplicação de multa nos julgamentos de agravo interno ao prever que “quando o agravo interno for declarado manifestamente inadmissível ou improcedente em votação unânime, o órgão colegiado, em decisão fundamentada, condenará o agravante a pagar ao agravado multa fixada entre um e cinco por cento do valor atualizado da causa”.
Essa inovação é mais um exemplo do viés adotado pelo Novo CPC no sentido de evitar recursos meramente protelatórios, com o objetivo de alterar a cultura do exercício automatizado do direito de recorrer.
Ocorre que a interpretação do mencionado dispositivo ainda é objeto de aprofundada discussão e causa temor às partes quanto à interposição do agravo interno, que é o recurso cabível em face das decisões proferidas pelo relator para submeter a matéria ao julgamento colegiado no mesmo Tribunal.
Enquanto no Código de 1973 (2) a multa está limitada aos casos de manifesta inadmissibilidade ou de ausência de fundamento do recurso, no Novo CPC, a penalidade pecuniária passa a incidir também em caso de improcedência do recurso em votação unânime, permanecendo a exigência de depósito para interposição de qualquer outro recurso.
A interpretação literal do conteúdo do § 4º do art. 1.021 do referido diploma legal leva ao entendimento de que o simples julgamento de improcedência do agravo interno em votação unânime pelo órgão colegiado, ainda que o recurso esteja devidamente fundamentado, seria suficiente para justificar a aplicação da multa.
Ocorre que tal interpretação não parece razoável, sobretudo ao se considerar a frágil colegialidade dos julgados, em que quase a totalidade dos julgamentos se dá por votação unânime.
Sendo assim, entende-se que o termo “manifestamente” está relacionado tanto à inadmissibilidade, quanto à improcedência. Na prática, deve ser considerado manifestamente improcedente o recurso interposto em face de decisão em que o tema tenha sido recentemente pacificado pelos mecanismos de uniformização, como é o caso do incidente de resolução de demanda repetitiva, assunção de competência e julgamentos de recursos especial e extraordinário repetitivos.
Esse entendimento, inclusive, guarda relação com o princípio de uniformização da jurisprudência. Ademais, como dito, o próprio CPC também buscou evitar a interposição de recursos meramente protelatórios e que sejam contrários ao entendimento consolidado nos tribunais superiores.
Vale ressaltar ainda outro ponto da discussão, que ressalta que uma interpretação literal do § 4º seria contraditória em relação à exigência dos tribunais superiores de que sejam esgotados os recursos ordinários antes da interposição dos recursos especial e extraordinário (arts.102, inciso III e 105, inciso III, da Constituição Federal).
Assim, o jurisdicionado encontra-se em difícil posição entre cumprir requisito de admissibilidade de recursos aos tribunais superiores e sujeitar-se ao risco da imposição de multa no julgamento unânime de improcedência de agravo interno.
Ora, a unanimidade não pode ser considerada um bom critério para se determinar se um recurso é meramente protelatório ou não.
A aplicação automática da multa pela simples improcedência do agravo interno em votação unânime significa impor gravosa sanção pecuniária à parte inconformada com a decisão recorrida, sendo que a norma apresenta alto grau de subjetivismo.
Isso porque o termo manifestamente inadmissível ou improcedente ainda é vago e causa dúvidas aos operadores do direito. Inclusive, o que se percebe é que os julgados que aplicam a multa do art. 1.021, § 4º do CPC/2015 muitas vezes não conseguem elucidar critérios objetivos para a fixação da multa.
Diante disso, ainda que se reconheça a importância da multa ora discutida para a celeridade processual e respeito aos precedentes, resta evidente a necessidade de se estabelecer critérios mais objetivos para sua fixação, para que as partes possam avaliar com propriedade o cabimento do recurso, bem como as eventuais consequências da sua interposição.
Assim, aguarda-se a consolidação da jurisprudência, que vem tomando forma gradualmente, para saber exatamente como será aplicado o art. 1.021, § 4º do CPC/2015. Enquanto isso, as partes devem atentar-se quanto à decisão a respeito da interposição do agravo interno, considerando os riscos da aplicação da multa de 1 a 5%, prevista no dispositivo em estudo.
Mais informações sobre o assunto podem ser obtidas com a equipe de contencioso do VLF Advogados.
Stefânia Bonin
Advogada da Equipe de Contencioso Estratégico do VLF Advogados
(1) Art. 1.021. Contra decisão proferida pelo relator caberá agravo interno para o respectivo órgão colegiado, observadas, quanto ao processamento, as regras do regimento interno do tribunal. (...)
§ 4º Quando o agravo interno for declarado manifestamente inadmissível ou improcedente em votação unânime, o órgão colegiado, em decisão fundamentada, condenará o agravante a pagar ao agravado multa fixada entre um e cinco por cento do valor atualizado da causa.
(2) Art. 557, §2º, CPC/73 - Quando manifestamente inadmissível ou infundado o agravo, o tribunal condenará o agravante a pagar ao agravado multa entre um e dez por cento do valor corrigido da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depósito do respectivo valor.