A responsabilidade jurídica do dono da obra pelos débitos trabalhistas do empreiteiro
Roberto Gallo
A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho (“TST”) (“SBDI I”) decidiu restringir o alcance da Tese Jurídica nº 4 (“Tese 4”) – firmada no Acórdão do IRR 190-53.2015.5.03.0090 (1) – que determina a responsabilização subsidiária do dono da obra por culpa in eligendo quando constatada a inidoneidade econômico-financeira do empreiteiro –. O recurso de revista paradigma do caso foi patrocinado pelo VLF Advogados (2).
Agora, a Tese 4 só poderá ser aplicada aos contratos celebrados depois de 11 de maio de 2017. A decisão confere, assim, maior segurança jurídica ao fixar, por meio da Tese Jurídica nº 5 (“Tese 5”), marco temporal para aplicabilidade do disposto na Tese 4.
O entendimento que estabeleceu a Tese 5 foi proferido na decisão que julgou os Embargos de Declaração opostos pela Associação Brasileira do Agronegócio nos autos do IRR 190-53.2015.5.03.0090, proferida em 9 de agosto de 2018, e ainda não publicada (3) (“Decisão”).
Cabe ressaltar que, nessa mesma matéria, há também a Orientação Jurisprudencial 191 (“OJ 191”), do TST. Esta traz que, diante da inexistência de previsão legal específica, o contrato de empreitada e de construção civil firmado entre dono da obra e empreiteiro não enseja a responsabilidade solidária ou subsidiária nas obrigações trabalhistas contraídas pelo empreiteiro, salvo se o dono da obra for uma empresa construtora ou incorporadora.
Não obstante tal entendimento, os Tribunais vinham proferindo decisões, antes da referida modulação, no sentido de que a excludente de responsabilidade prevista na OJ 191 não era aplicável aos casos em que havia suposta inidoneidade das empreiteiras.
Assim, a Tese 4, antes da modulação dada pela Tese 5, violava o princípio da segurança jurídica e ato jurídico perfeito. Além de conferir aos Tribunais Regionais e aos juízos de 1º grau respaldo jurisprudencial para aplicar exceção à OJ 191, mesmo nos casos de contratos de empreitada celebrados antes mesmo da prolação da Tese 4, qualificava como “inidôneas” empreiteiras pelo simples fato de haver ajuizamento de ação pleiteando o pagamento de verbas trabalhistas – sem sequer ocorrer o trânsito em julgado ou mesmo o julgamento pelas instâncias superiores –.
E, além das violações acima mencionadas, a equivocada atribuição de responsabilidade ao dono da obra tomava como base a culpa in elegendo (4) ou in vigilando (5), sem, contudo, estabelecer parâmetros claros acerca do momento em que tal inidoneidade deveria ser constatada por ele.
Em suma, a interpretação da Tese 4 aplicada pelos Tribunais, antes de sua expressa modulação, dava margem à interpretação equivocada de que, basicamente, sempre ocorreria a responsabilização do dono da obra em caso de inadimplemento da empregadora/empreiteira, afastando, assim, a excludente de responsabilidade prevista na OJ 191.
Dessa forma, a Tese 5, ao delimitar temporalmente a aplicabilidade da Tese 4, preserva o princípio da segurança jurídica e o ato jurídico perfeito, afastando a temerária interpretação de que este seria aplicável a contratos celebrados antes mesmo da vigência da Tese 4. No entanto, como acima mencionado, ainda restam dúvidas acerca do próprio conceito de inidoneidade ou da forma de verificação e acompanhamento dos contratos de trabalho firmados entre empreiteira e obreiro pela tomadora de serviços.
Mais informações sobre o tema podem ser obtidas com a equipe trabalhista do VLF Advogados.
Roberto Gallo
Advogado da Equipe Trabalhista do VLF Advogados
(1)” Decisão: nos termos do voto do Exmo. Ministro Relator, fixar as seguintes teses jurídicas para o Tema Repetitivo Nº 0006 - "RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA - DONA DA OBRA - APLICAÇÃO DA OJ 191 DA SbDI-1 LIMITADA À PESSOA FÍSICA OU MICRO E PEQUENAS EMPRESAS": I) A exclusão de responsabilidade solidária ou subsidiária por obrigação trabalhista a que se refere a Orientação Jurisprudencial n.º 191 da SDI-1 do TST não se restringe à pessoa física ou micro e pequenas empresas, compreende igualmente empresas de médio e grande porte e entes públicos (decidido por unanimidade); II) A excepcional responsabilidade por obrigações trabalhistas prevista na parte final da Orientação Jurisprudencial n.º 191, por aplicação analógica do art. 455 da CLT, alcança os casos em que o dono da obra de construção civil é construtor ou incorporador e, portanto, desenvolve a mesma atividade econômica do empreiteiro (decidido por unanimidade); III) Não é compatível com a diretriz sufragada na Orientação Jurisprudencial n.º 191 da SDI-1 do TST jurisprudência de Tribunal Regional do Trabalho que amplia a responsabilidade trabalhista do dono da obra, excepcionando apenas "a pessoa física ou micro e pequenas empresas, na forma da lei, que não exerçam atividade econômica vinculada ao objeto contratado" (decidido por unanimidade); IV) Exceto ente público da Administração Direta e Indireta, se houver inadimplemento das obrigações trabalhistas contraídas por empreiteiro que contratar, sem idoneidade econômico-financeira, o dono da obra responderá subsidiariamente por tais obrigações, em face de aplicação analógica do art. 455 da CLT e culpa in eligendo (decidido por maioria, vencido o Exmo. Ministro Márcio Eurico Vitral Amaro).” Acórdão disponível em: <http://aplicacao4.tst.jus.br/consultaProcessual/resumoForm.do?consulta=1&numeroInt=35317&anoInt=2016#>. Acesso em: 25/09/2018.
(2) Conforme publicado neste informativo. <http://www.vlf.adv.br/noticia_aberta.php?id=395>.
(3) “Decisão: por unanimidade, (i) dar provimento aos embargos de declaração interpostos por Associação Brasileira do Agronegócio para, ao sanar omissão, mediante a atribuição de efeito modificativo, acrescer ao acórdão originário a tese jurídica nº 5, de seguinte teor: "5ª) O entendimento contido na tese jurídica nº 4 aplica-se exclusivamente aos contratos de empreitada celebrados após 11 de maio de 2017, data do presente julgamento"; (ii) julgar prejudicado o exame dos embargos de declaração interpostos por APINE, CNI e ANGLO AMERICAN MINÉRIO DE FERRO BRASIL S.A. quanto à modulação e, no mais, negar-lhes provimento. Obs.: I - Juntará voto convergente ao pé do acórdão o Exmo. Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho; II - O Exmo. Ministro Renato de Lacerda Paiva não participou do julgamento em razâo de impedimento..” Disponível em: <http://aplicacao4.tst.jus.br/consultaProcessual/decisaoForm.do?numInt=35317&anoInt=2016&codOrgaoJudic=53&anoPauta=2018&numPauta=20&tipSessao=O>. Acesso em 25/09/2018.
(4) A culpa in eligendo, ou culpa na escolha, pressupõe uma escolha realizada – nesse caso, a escolha do empreiteiro – sem a devida cautela.
(5) A culpa in vigilando se verifica quando há falta de supervisão ou fiscalização, nesse caso, falta de supervisão do dono da obra.