STJ sedimenta jurisprudência a respeito de ocupação indevida de bem público
Matheus Roscoe e Júlia Gomide
A sessão da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (“STJ”), no dia 24 de outubro de 2018, aprovou enunciado de súmula nos seguintes termos: “A ocupação indevida de bem público configura mera detenção de natureza precária insuscetível de retenção ou indenização por acessões e benfeitorias”.
A Súmula, que recebeu o número 619, consagrou o entendimento de que a ocupação indevida de bem público, a saber, quando o invasor conhece a condição do bem e, mesmo assim, assume o risco de invadi-lo, se configura como detenção indevida, e, portanto, as alterações realizadas no bem não são passíveis de indenização.
A edição da súmula põe em evidência as diferenças entre possuidor e detentor. Conforme estabelece o Código Civil (1), o detentor, ao contrário do possuidor, não exerce os poderes inerentes à propriedade e, portanto, apenas conserva a posse para um terceiro. Por exemplo, o possuidor pode exercer a defesa de sua posse, enquanto ao mero detentor não é assegurado tal direito.
No caso da Súmula n. 619, entretanto, a detenção de bem público objeto de análise é aquela indevida, que não ocorre com a anuência da Administração Pública, mas sim de modo ilegítimo, em prejuízo de toda a coletividade. Nesse caso, o que o STJ já vinha decidindo é que as benfeitorias promovidas em tais imóveis, ainda que de boa-fé, não geram direito de retenção ou indenização, justamente porque não é possível imputar esse ônus à Administração Pública, que não anuiu com a detenção. Veja-se a ementa de um julgado nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO. BEM PÚBLICO. DETENTOR. INDENIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.[...]
1. A mera passagem do tempo não autoriza a concessão de indenização em favor de detentor de imóvel público, assim considerado o particular sem qualquer título justo de posse e que ocupa o bem ilegitimamente. Precedentes.
2. Agravo conhecido para dar provimento ao recurso especial.
(STJ, EAREsp n. 1113238 / RJ, Rel Ministro Og Fernandes, Dje: 13.03.2018).
A edição da súmula reforça a preocupação em garantir o respeito ao regime ao qual estão submetidos os bens públicos e, assim, privilegiar o interesse da coletividade, bem como contribui para um cenário de segurança jurídica.
Matheus Roscoe
Estagiário da Equipe de Contencioso Cível do VLF Advogados
Júlia Gomide
Advogada da Equipe de Contencioso Cível do VLF Advogados
(1) Art. 1196, CC: “possuidor é todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade”;
Art. 1197, CC: “aquele que, achando-se em relação de dependência para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas”