Sociedades nacionais e estrangeiras devem atualizar seu cadastro na Receita até 31/12/2018
Marcus Drumond, Laís Sacchetto e Guilherme Sofal
Em 2016 e 2017, a Receita Federal do Brasil (“RFB”) publicou a Instrução Normativa nº 1.634/2016 (“IN 1.634/2016”) – que atualizou as normas de regência do Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (“CNPJ”) – e as Instruções Normativas nº 1.684/2016 (“IN 1.684/2016”) e nº 1.729/2017 (“IN 1.729/2017”), que, por sua vez, alteraram dispositivos da IN 1.634/2016.
Entre suas demais disposições, a grande novidade observada na IN 1.634/2016 (1) foi introduzida por seu artigo 8º, que estabeleceu que as informações cadastrais relativas a determinadas entidades nacionais e estrangeiras deverão abranger não só as pessoas autorizadas a representá-las, como, também, sua cadeia de participação societária, até alcançar seus beneficiários finais ou qualquer das entidades mencionadas no §3º do dispositivo em menção.
Mas, o que viria a ser um “beneficiário final”? O §1º do artigo 8º da IN 1.634/2016 define a figura como sendo: (i) “a pessoa natural que, em última instância, de forma direta ou indireta, possui, controla ou influencia significativamente a entidade”; ou (ii) “a pessoa natural em nome da qual uma transação é conduzida”. Neste ponto, a referida “influência significativa”, importa explicar, é entendida como presumida quando a pessoa natural, nos termos do §2º do dispositivo em menção, (i) “possui mais de 25% (vinte e cinco por cento) do capital da entidade, direta ou indiretamente”; ou (ii) “detém ou exerce, direta ou indiretamente, a preponderância nas deliberações sociais e o poder de eleger a maioria dos administradores da entidade, ainda que sem controlá-la”.
As regras de informação de beneficiários finais foram consolidadas conforme previu o inciso IV do artigo 51 da IN 1.634/2016 (2), ou seja, por meio do Anexo Único do Ato Declaratório Executivo COCAD n° 9, de 23 de outubro de 2017 ("ADE Cocad 9/2017"). Em síntese, o ADE Cocad 9/2017 (3) trata: (i) da discriminação das entidades, nacionais e estrangeiras, que estão ou não sujeitas à obrigação de informar beneficiários finais; (ii) do procedimento a ser realizado no sistema Coletor Nacional, da RFB; e (iii) dos documentos que deverão, juntamente do ato em que se presta a referida informação, ser apresentados à RFB por cada uma das entidades obrigadas.
As informações devem ser prestadas no sistema Coletor Nacional, por meio de uma ficha específica de inclusão, alteração ou exclusão de beneficiários finais (evento 267). Após seu preenchimento, é gerado um Documento Básico de Entrada (“DBE”), o qual deve ser juntado aos documentos exigidos conforme o caso e submetido à apreciação da RFB por meio de dossiê digital de atendimento. Para cada beneficiário final, é necessário informar, no próprio sistema, entre outros dados, o nome, a data de nascimento, o país de nacionalidade, o país de residência e, se brasileiro, o respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas.
No caso das entidades nacionais, os documentos a serem apresentados incluem, mas sem se limitar a, quadros de sócios e demais documentos que possibilitem verificar a eventual existência de beneficiário final, conforme conceituado pelo artigo 8º da IN 1.634/2016. Neste ponto, ressalta-se que, caso as informações relativas à cadeia de participações societárias da entidade já constem na base de dados da RFB, é dispensada a apresentação desses documentos.
Já para as entidades estrangeiras, devem ser apresentados os diversos documentos indicados nos artigos 19 a 21 da IN 1.634/2016 a depender do órgão pelo qual as entidades foram registradas no país (se, por exemplo, pela própria RFB, pelo Cadastro de Empresas do Banco Central do Brasil, ou pela Comissão de Valores Mobiliários).
Em qualquer caso, se as pessoas apontadas como beneficiários finais não possuírem, direta ou indiretamente, mais de 25% (vinte e cinco por cento) do capital da entidade, deverão ser apresentados documentos que reflitam o quadro societário atual, além de outros que permitam comprovar a inexistência de pessoa com influência significativa conforme o disposto no inciso II do § 2º do art. 8º da IN RFB 1.634/2016, tais como deliberações sociais e atas de eleição de administradores da entidade.
Em regra, os documentos que estiverem redigidos em língua estrangeira e devidamente apostilados na forma da Convenção de Haia devem ser traduzidos por tradutor juramentado, ficando, contudo, a critério exclusivo da RFB dispensar tal tradução, conforme §§7º e 8º do artigo 19 da IN 1.634/2016 (4).
Nos termos do artigo 52 da IN 1.634/2016 (5), para as entidades nacionais e estrangeiras inscritas no CNPJ antes de 1º de julho de 2017, as informações e documentos referentes a beneficiários finais – caso estejam elas obrigadas a tanto – devem ser repassados à RFB até 31 de dezembro de 2018. Já as entidades inscritas no CNPJ a partir de 1º de julho de 2017 devem cumprir com essas obrigações dentro do prazo de 90 (noventa) dias contados a partir de sua efetiva inscrição, prorrogável pelo mesmo período por requerimento formalizado pelo representante da entidade no Brasil.
Nesse sentido, é importante assinalar que o descumprimento das exigências estabelecidas pela IN 1.634/2016 poderá suspender a inscrição da entidade no CNPJ, impedindo-a de transacionar com instituições bancárias, movimentar contas-correntes, realizar aplicações financeiras e obter empréstimos, conforme seu artigo 9º (6).
Por fim, deve-se reconhecer que a inserção dessas novas regras na dinâmica do CNPJ – embora tenha como objetivo louvável garantir uma maior transparência de informações à RFB a fim de desestimular a prática de ilícitos – pode significar maior burocracia às entidades já constituídas e operantes e maiores obstáculos ainda às entidades interessadas em passar a investir e desenvolver negócios no Brasil.
Diante da complexidade do tema e da proximidade da data limite para que algumas entidades cumpram com suas obrigações relativas a beneficiários finais, a equipe de consultoria do VLF Advogados coloca-se inteiramente à disposição para prestar quaisquer esclarecimentos e tomar eventuais providências que se façam necessárias.
Marcus Drumond
Trainee da Equipe de Direito Societário do VLF Advogados
Laís Sacchetto
Estagiária da Equipe de Direito Societário do VLF Advogados
Guilherme Sofal
Coordenador da Equipe de Direito Societário do VLF Advogados
(1) BRASIL. Instrução Normativa da Receita Federal do Brasil, nº 1.634/2016, de 06 de maio de 2016. Disponível em: <http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?idAto=73658>. Acesso em: 21 nov. 2018.
(2) Art. 51. A Cocad pode editar atos complementares a esta Instrução Normativa, inclusive para: [...] IV - estabelecer as regras de informação de beneficiários finais.
(3) BRASIL. Ato Declaratório Executivo COCAD n° 9, de 23 de outubro de 2017. Receita Federal. Disponível em: <http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?visao=anotado&idAto=87392>. Acesso em: 21 nov. 2018.
(4) Art. 19 [...] §7º Estão dispensados da autenticação por repartição consular os documentos públicos emitidos por autoridade ou agente público, por notários e cartórios de registro civil e certificados oficiais do Estado estrangeiro, de acordo com o disposto na Apostila da Convenção de Haia. §8º Os documentos redigidos em língua estrangeira devem ser traduzidos para o vernáculo por tradutor juramentado, podendo ser dispensada a critério da RFB.
(5) Art. 52. A obrigatoriedade prevista nos arts. 8º e 19 a 21, em relação à necessidade de informação do beneficiário final e da entrega de documentos, tem início em 1º de julho de 2017 para as entidades que efetuarem sua inscrição a partir dessa data. §1º As entidades já inscritas no CNPJ antes de 1º de julho de 2017 que procederem a alguma alteração cadastral a partir dessa data deverão informar os beneficiários finais na forma prevista no art. 8º ou informar a inexistência de beneficiários finais, quando aplicável o disposto no §2º do art. 9º, e entregar os documentos previstos nos arts. 19 a 21 até a data limite de 31 de dezembro de 2018.
(6) Art. 9º As entidades a que se referem os incisos XV e XVI do caput do art. 4º que não preencherem as informações referentes ao beneficiário final no prazo solicitado ou que não apresentarem os documentos na forma prevista nos arts. 19 e 20 terão sua inscrição suspensa no CNPJ e ficarão impedidas de transacionar com estabelecimentos bancários, inclusive quanto à movimentação de contas-correntes, à realização de aplicações financeiras e à obtenção de empréstimos.