Lei 13.726/2018 propõe desburocratizar e racionalizar atos e procedimentos junto à Administração Pública
Laís Mascarenhas e Lucas Sávio Oliveira
A Lei nº 13.726, de 8 de outubro de 2018 (“Lei 13.726/2018”), apelidada de “Lei da Desburocratização” (1), entrou em vigor no último dia 23 de novembro com uma proposta promissora: facilitar a relação entre os cidadãos e os órgãos dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, por meio da dispensa ou simplificação de formalidades e/ou exigências desnecessárias, que tornavam o trato com os referidos entes públicos exageradamente burocrático.
A Lei 13.726/2018 se originou de um substitutivo da Câmara dos Deputados ao Projeto de Lei nº 214/2014 (“PL 214/2014”), cujo objetivo era tornar menos complexa e burocrática a tramitação de processos perante as repartições públicas. De acordo com o autor do PL 214/2014, o senador Armando Monteiro (PTB-PE), algumas legislações criam diversos embaraços burocráticos, caracterizados pelo excesso de formalismos e exigências – burocracia esta que embute um custo econômico ou social, tanto para o tesouro quanto para o cidadão, maior do que o eventual risco de fraude (2).
Antes de adentrar nas novidades propriamente ditas, é importante assinalar que apesar de a Lei utilizar o termo “cidadão” para definir o alvo das normas ali dispostas, tal conceito deve ser interpretado de forma mais ampla. Deve abranger, portanto, não só as pessoas físicas e jurídicas, mas também os chamados “entes despersonalizados” – como o condomínio, a massa falida e o espólio.
As principais mudanças introduzidas pela Lei da Desburocratização estão reunidas em seu art. 3º. Por ele, na relação com a Administração Pública, o cidadão fica dispensado das seguintes exigências:
(i) reconhecimento de firma – a partir de agora, basta que o agente público compare a assinatura no documento com aquela que consta na carteira de identidade do cidadão;
(ii) autenticação de cópia de documento, dado que o próprio servidor público, ao comparar o original e a cópia, pode atestar sua autenticidade; e
(iii) juntada de documentos pessoais do cidadão, que podem ser substituídos por cópias que o próprio agente autenticou.
Ainda sobre os documentos, o referido art. 3º também determina que o cidadão está desobrigado a apresentar certidão de nascimento, sempre que for possível substituí-la por outro documento público, tal como carteira de identidade, carteira de trabalho ou passaporte. O referido dispositivo também dispensa a apresentação de título de eleitor, salvo para votar ou registrar a candidatura. Além disso, não há mais a exigência de firma reconhecida na autorização de viagem para o menor, se os pais estiverem presentes no momento do embarque.
Convém destacar que quando não for possível fazer a comprovação de regularidade da documentação por motivos alheios ao cidadão, ele poderá firmar uma declaração escrita atestando a veracidade das informações ali contidas. No entanto, é imperativo se atentar para o fato de que se a declaração restar falsa, o indivíduo estará sujeito às sanções administrativas, civis e penais.
Outra novidade introduzida pelo art. 3º diz respeito à impossibilidade de órgãos públicos exigirem que o cidadão apresente certidão ou documento expedido por outro órgão ou entidade do mesmo Poder, salvo no caso de certidão de antecedentes criminais, informações sobre pessoa jurídica e outras previstas expressamente em lei. Da mesma forma, se um documento for entregue em determinado momento do processo, para comprovar um fato, ele será válido até o fim, sendo vedada a exigência de nova apresentação – como era comum em processos licitatórios, por exemplo.
Nesse ponto, necessário reforçar que a dispensa dessas formalidades, nos moldes do previsto pelo art. 3º da Lei de Desburocratização, só se aplica às relações entre a Administração Pública e o cidadão. Portanto, no que toca à relação entre os particulares, como no caso de um contrato de compra e venda, permanece a exigência de reconhecimento de firma e outras formalidades correlatas que garantem a veracidade do negócio.
Além do exposto acima, a Lei 13.726/2018 prevê, ainda, a criação do Selo de Desburocratização e Simplificação, “destinado a reconhecer e a estimular projetos, programas e práticas que simplifiquem o funcionamento da administração pública e melhorem o atendimento aos usuários dos serviços públicos”, conforme dispõe a própria norma (3).
A partir dos critérios de racionalização de procedimentos administrativos, eliminação de formalidades, ganhos sociais e redução do tempo de espera no atendimento, além da adoção de soluções que possam ser replicadas em outras esferas da Administração, os órgãos públicos serão avaliados por uma comissão específica e poderão receber o referido Selo – a partir de quando também serão inscritos no Cadastro Nacional de Desburocratização.
Por fim, um alerta merece destaque: os cartórios, apesar de exercerem função pública, não são considerados órgãos públicos. Como a Lei de Desburocratização não estabelece expressamente que as regras também se aplicam a eles, até que haja um posicionamento por parte do Poder Judiciário definido o alcance interpretativo dessa norma, a situação permanece controversa. O presidente do Instituto de Registro de Títulos e Documentos de Pessoas Jurídicas do Estado de São Paulo – IRTDPJ, por exemplo, já se posicionou nesse exato sentido (4).
Não obstante a isso, não há dúvidas de que a Lei de Desburocratização reflete uma tentativa de colocar em prática o Princípio da Eficiência da Administração Pública, previsto no art. 37 da Constituição Federal de 1988, e simplificar o contato entre o cidadão e o poder público. Resta saber se essa novidade legislativa surtirá os efeitos esperados.
Mais informações podem ser obtidas com a equipe de consultoria do VLF Advogados.
Laís Mascarenhas
Estagiária da Equipe de Consultoria do VLF Advogados
Lucas Sávio Oliveira
Advogado da Equipe de Consultoria do VLF Advogados
(1) BRASIL. Lei nº 13.726, de 08 de outubro de 2018. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/Lei/L13726.htm>. Acesso em: 07 dez. 2018.
(2) Disponível em: <https://www.armandomonteiro.com.br/entra-em-vigor-hoje-lei-proposta-por-armando-que-desburocratiza-vida-do-cidadao/>. Acesso em: 19/12/2018.
(3) Redação do art. 7º da Lei nº 13.726/2018.
(4) Disponível em: <https://dcomercio.com.br/categoria/leis-e-tributos/lei-da-desburocratizacao-nao-beneficia-empreendedor>. Acesso em: 19/12/2018.