Receita restringe conceito de insumo traçado pelo STJ
Henrique Coimbra
A controversa definição do conceito de insumos ganhou novos episódios com a recente edição do Parecer Normativo Cosit/RFB n. 5 de 17 de dezembro de 2018 (“Parecer”). O ato normativo foi publicado para facilitar a aplicação do conceito, em decorrência do que fora decidido pela 1ª Seção do STJ no julgamento do Recurso Especial (“REsp”) n. 1.221.170, sob a sistemática dos recursos repetitivos (1).
A decisão é vinculante para a Administração Fazendária e pacificou o entendimento no sentido de que são considerados insumos os bens e serviços essenciais ou relevantes para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte. Em suma, caracterizam-se como insumos aqueles itens intrinsicamente ligados ao processo produtivo ou à execução do serviço, ou cuja ausência lhes cause prejuízo em qualidade ou suficiência, ou, ainda, aqueles que integrem o processo de produção, seja pelas singularidades da cadeia produtiva ou por imposição legal.
Sob a justificativa de que a aplicação concreta dos critérios definidos pelo STJ “demanda um processo de análise que muitas vezes pode ser complexo e em alguns casos pode gerar conclusões divergentes”, o referido Parecer pretendeu esclarecer o entendimento da Fazenda sobre como se daria essa aplicação às principais categorias analisadas no âmbito da Receita Federal do Brasil (“RFB”).
Todavia, embora adote interpretações favoráveis aos contribuintes, o Parecer restringiu os limites e parâmetros estabelecidos pelo precedente do STJ. Aduz que a expressão “atividade econômica desempenhada pelo contribuinte”, contida na ementa do acórdão do aludido REsp, deve ser interpretada como aquela atividade atinente ao processo de produção de bens ou de prestação de serviços, não abrangendo atividades de comercialização.
Nesta linha, a RFB também não considera como insumo aqueles gastos posteriores à conclusão do processo produtivo ou da prestação do serviço. Afirmou que não são passíveis de creditamento os gastos com transporte (frete) de produtos acabados de produção própria entre estabelecimentos da pessoa jurídica para centros de distribuição ou para entrega direta ao adquirente.
No mesmo sentido foi a conclusão de que somente seriam passiveis de creditamento os bens ou serviços inseridos em processo produtivo do qual resultasse efetivamente em bem destinado à venda ou em um serviço disponibilizado ou prestado (esforço bem-sucedido). Assim, não ensejariam direito a crédito as atividades que não gerem tais resultados, “como em pesquisas, projetos abandonados, projetos infrutíferos, etc.”.
Ao que tudo indica, o Parecer não alcançará o objetivo de reduzir a litigiosidade com os contribuintes sobre o tema. Muito antes pelo contrário, nossa aposta é que ocorrerá exatamente o oposto. É que os critérios abarcados pelo ato normativo não foram aqueles estipulados pelo STJ no julgamento do recurso repetitivo. As premissas adotadas para possibilitar o creditamento resumem-se à aferição da essencialidade ou da relevância que os insumos venham a ter na atividade econômica desempenhada pelo contribuinte. Essas características permanecem presentes a esses bens ou serviços independentemente do momento em que eles forem utilizados.
Por exemplo, é evidente a essencialidade do frete das mercadorias acabadas para o escoamento da produção ao estabelecimento que as industrializou. A ausência desses insumos inviabilizaria o processo produtivo. O direito ao crédito nessa situação é reconhecido em vários precedentes da própria administração, pela plena da Câmara Superior de Recursos Fiscais (2).
Ademais, em diversos segmentos econômicos, as fases de pesquisa, desenvolvimento e exploração são indissociáveis a um conjunto de atividades que viabilizam os resultados pretendidos pela indústria, ainda que as expectativas se frustrem futuramente. Como no caso da mineração, em que o CARF tem entendido que as atividades de pesquisa mineral, cujo resultado esperado (extração da commodity) é incerto, são permissivas de creditamento (3).
Dessa maneira, as iniciativas da Fazenda de reduzir a litigiosidade, uniformizar as distorções concorrenciais e garantir maior segurança jurídica podem não alcançar o efeito pretendido e exigirão mais cautela na análise sobre a importância de determinado item para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte, para fins de apuração de crédito do PIS e da COFINS.
Mais esclarecimentos sobre o tema podem ser obtidos com a equipe tributária do VLF Advogados.
Henrique Coimbra
Advogado da Equipe Tributária do VLF Advogados
(1) STJ, REsp 1221170/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/02/2018, DJe 24/04/2018. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1350777&num_registro=201002091150&data=20180424&formato=PDF>. Acesso em: 24 de janeiro de 2018.
(2) Acórdão 9303¬007.562, 3ª Turma, Sessão de 20/11/2018.
(3) Acórdãos 3403-003.492, 3ª Turma, Sessão de 27/01/2015; 3402-002.669, 2ª Turma, Sessão de 24/02/2015; e 3403-003.378, 3ª Turma, Sessão de 11/11/2014.