Possibilidade de revisão dos atos administrativos punitivos pelo Poder Judiciário
Mariana Cavalieri
Os órgãos de defesa do consumidor, cujas competências são normatizadas no Código de Defesa do Consumidor (“CDC”) (1) e no Decreto n. 2.181/97 (2), têm como função primordial a fiscalização das relações de consumo e a aplicação das penalidades administrativas correspondentes em caso de transgressão ao CDC.
Embora existam entendimentos divergentes quanto a legitimidade dos órgãos integrantes do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor no que tange a imposição de penalidades administrativas, ambas defendem o não cabimento da solução do litígio por parte do Programa de Proteção e Defesa do Consumidor (‘’PROCON’’).
Assim, seria nula qualquer decisão que determinasse a obrigação de entregar, devolver ou ressarcir eventuais prejuízos suportados pelo consumidor.
Mesmo diante deste entendimento, já consolidado nos Tribunais Superiores, inúmeros órgãos de defesa do consumidor extrapolam o limite do seu poder de polícia e condenam os fornecedores ao cumprimento de obrigações de natureza individual, como a rescisão do contrato de compra e venda e a substituição de produtos.
Nestes casos, estar-se-ia diante de uma usurpação das funções do poder judiciário, tendo em vista que a submissão de um dos litigantes a decisão que favorece a outra parte é prerrogativa exclusiva da jurisdição.
Para uma das correntes existentes sobre o tema, os órgãos de defesa do consumidor sequer teriam o condão de aplicar sanções administrativas em reclamações individuais, nas quais a suposta conduta do fornecedor não atinge a coletividade e o mercado de consumo.
A possibilidade de aplicação de sanções por autoridade administrativa alheia à jurisdição estatal abriria, então, uma nova via de solução de conflitos e implicaria em um obstáculo ao acesso à justiça.
Tal inobservância aos limites impostos demanda a intervenção do poder judiciário que, conforme decisão do Superior Tribunal de Justiça (3), pode imiscuir-se na análise do ato administrativo punitivo se provocado quando este tratar de violação aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
A análise e o controle dos atos administrativos pelo poder judiciário, dentro das possibilidades da revisão judicial, garantem o Estado Democrático de Direito. Caso contrário, inobservâncias a princípios básicos da administração pública não seriam passíveis de reforma, validando-se eventuais transgressões aos ditames das leis e da própria Constituição Federal de 1988.
Mais informações sobre o tema podem ser obtidas com a equipe de contencioso consumerista do VLF Advogados.
Mariana Cavalieri
Advogada da Equipe do Contencioso Consumerista do VLF Advogados
(1) Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8078.htm>.
(2) Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D2181.htm>.
(3) EDcl no MS 9.526/DF, Rel. Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 24/06/2009, DJe 03/08/2009