Medida Provisória que dispensava publicações legais das sociedades anônimas em jornais perde a validade
Laís Sacchetto e Pedro Ernesto Rocha
No último dia 3 de dezembro, a Medida Provisória nº 892/2019 (“MP 892/2019”), que alterou as disposições do art. 289 da Lei nº 6.404/1976 (“Lei das S.A.”) para flexibilizar as regras de publicação dos atos societários e das demonstrações financeiras das sociedades anônimas abertas e fechadas, teve seu prazo de vigência encerrado e perdeu sua eficácia, após não ter sido apreciada pelo Congresso Nacional e convertida em lei no prazo legal.
Publicada em 6 de agosto deste ano, a MP 892/2019 previa, em curta síntese, que as companhias não mais estariam obrigadas a proceder às publicações ordenadas pela Lei das S.A. na imprensa oficial e em jornal de grande circulação, de acordo. Ao invés disso, (i) no caso das companhias abertas, nos termos da Deliberação da Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”) nº 829/2019, tais publicações seriam feitas no site da CVM e da entidade administradora do mercado em que os valores mobiliários da companhia estivessem admitidos à negociação (1); e (ii) no caso das companhias fechadas, conforme a Portaria nº 529/19 do Ministério da Economia, na Central de Balanços do Sistema Público de Escrituração Digital (2).
Por se tratar de medida provisória, nos termos do art. 62, §3º da Constituição Federal, a norma teria 60 dias, prorrogáveis por igual período, para ser convertida em lei (3), sob pena de perder sua eficácia e não mais produzir seus efeitos. Contudo, a MP 892/2019 não chegou a ser votada nos plenários da Câmara dos Deputados e do Senado dentro deste prazo.
Destaca-se, a esse propósito, que a norma já havia sido rejeitada na comissão mista do Congresso em 12 de novembro deste ano. Para justificar a rejeição, a Comissão entendeu que a norma dava azo a fraudes de documentos eletrônicos, e que não havia relevância e urgência na edição da norma – requisitos essenciais às medidas provisórias –, tendo em vista a edição da Lei nº 13.818, em abril deste ano (“Lei 13.818/2019”), que disciplinou o assunto (4).
A partir de 1º de janeiro de 2022, nos termos do art. 1º da Lei 13.818/2019, as publicações dos atos societários, bem como das demonstrações financeiras das sociedades anônimas, deverão ser efetuadas de forma resumida em jornal de grande circulação e, simultaneamente, no site do mesmo jornal, sendo que, no último caso, devem estar acompanhadas da íntegra dos documentos (5).
Portanto, a menos que haja alguma outra nova iniciativa legislativa, até 2022, as sociedades anônimas abertas e fechadas estão novamente obrigadas a realizar suas publicações na forma da redação anterior da Lei das S.A., isto é, na imprensa oficial e em outro jornal de grande circulação da localidade da sede da companhia, devendo, para tanto, arcar com os custos das publicações.
Cabe salientar, por fim, que ainda resta ao Congresso disciplinar os efeitos da MP 892/2019 em relação aos atos que foram praticados antes da norma perder a eficácia, nomeadamente as publicações feitas exclusivamente por meio eletrônico. Por meio de decreto legislativo, o Congresso poderá preservar os respectivos efeitos, de forma que as publicações eletrônicas sejam consideradas válidas, ou exigir publicação retroativa dos atos, com circulação impressa. Porém, caso o referido decreto não seja editado e aprovado em até 60 dias, contados da perda da vigência da MP (6), todos os atos praticados conforme a MP 892/2019 serão integralmente preservados.
Nossa equipe está à inteira disposição para sanar eventuais dúvidas sobre o assunto e prestar outros esclarecimentos que se façam necessários.
Laís Sacchetto
Estagiária da Equipe de Consultoria do VLF Advogados
Pedro Ernesto Rocha
Coordenador da Equipe de Consultoria do VLF Advogados
(1) Conforme considerando “a” da Deliberação CVM nº 829/2019, agora revogada pela Deliberação CVM nº 838/2019. Ambas disponíveis em: http://www.cvm.gov.br/legislacao/deliberacoes/deli0800/Deli829.html. Acesso em: 16 dez. 2019.
(2) Conforme art. 1º da Portaria do Ministério da Economia nº 529/2019. Disponível em: http://www.in.gov.br/web/dou/-/portaria-n-529-de-26-de-setembro-de-2019-218820660. Acesso em: 16 dez. 2019.
(3) Art. 62. (…) §3º As medidas provisórias, ressalvado o disposto nos §§ 11 e 12 perderão eficácia, desde a edição, se não forem convertidas em lei no prazo de sessenta dias, prorrogável, nos termos do § 7º, uma vez por igual período, devendo o Congresso Nacional disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas delas decorrentes (cf. Constituição Federal, disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 23 dez. 2019).
(4) Conforme notícia divulgada no site da Câmara dos Deputados. Disponível em: https://www.camara.leg.br/noticias/621986-perde-validade-mp-que-dispensa-empresas-de-publicar-demonstracoes-financeiras-em-jornais/. Acesso em: 17 dez. 2019.
(5) Lei 13.818/2019. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13818.htm. Acesso em: 17 dez. 2019.
(6) Conforme art. 11 e parágrafos da Resolução da Câmara dos Deputados nº 1/2002. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/rescon/2002/resolucao-1-8-maio-2002-497942-normaatualizada-pl.html. Acesso em: 18 dez. 2019.