Decisão do STF possibilita o enquadramento da COVID-19 como doença ocupacional
Roberto Gallo de Andrade
O Supremo Tribunal Federal (“STF”) decidiu, por maioria, suspender a eficácia do artigo 29 da Medida Provisória nº 927 (“MP 927”) (1) que determinava que os casos de contaminação por COVID-19 não seriam considerados como doença ocupacional. Com a decisão do STF, não é mais exigida a comprovação de nexo causal pelo trabalhador.
A decisão do STF também suspendeu o artigo 31 da MP 927 editada pelo presidente Jair Bolsonaro, que previa a limitação do exercício dos auditores fiscais do trabalho, no período de cento e oitenta dias, a “ações orientadoras”, exceto em casos excepcionais, e partiu de divergência aberta pelo Ministro Alexandre de Morais, tendo sido seu voto acompanhado pela maioria dos Ministros (7 a 3).
O Ministro Alexandre de Morais entendeu (2) que o artigo 29 da MP, ao prever que casos de contaminação por COVID-19 não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação de nexo causal, ofende inúmeros trabalhadores de atividades essenciais que continuam expostos ao risco.
Por outro lado, o Ministro Marco Aurélio, que votou pelo indeferimento do pedido liminar de suspensão da MP 927 (suscitado através de sete ações diretas de inconstitucionalidade) (3) também em relação aos artigos 29 e 31, entendeu que não há na norma transgressão a preceito da Constituição Federal. Na visão do Ministro, a edição da medida provisória “visou atender uma situação emergencial e preservar empregos, a fonte do sustento dos trabalhadores que não estavam na economia informal”.
Portanto, com a suspensão do art. 29 da referida MP, o empregado acometido pela COVID-19 tem assegurado os mesmos benefícios do auxílio doença acidentário, tendo em vista o enquadramento como doença ocupacional.
Dessa forma, ficam resguardados os direitos ao recebimento do benefício e recolhimento de FGTS, bem como o direito à estabilidade provisória pelo prazo mínimo de 12 (doze) meses após o seu retorno ao trabalho, sendo possível ainda pleitear eventuais indenizações em caso de morte ou dano permanente.
A referida decisão não deixa claro, contudo, como serão tratados os casos em que o empregado trabalha, por exemplo, em regime de home office, pois nesse caso a empresa não tem ingerência nas casas desses empregados. Como se trata de doença em que nem sempre é possível verificar o local e o momento da infecção, a suspensão da determinação de que o contágio por COVID-19 não seja enquadrado como doença ocupacional, em tese, transfere o ônus da comprovação para o empregador, devendo este demonstrar que não houve exposição de seus empregados contaminados a situações de risco.
No sentido de se evitar a referida exposição dos empregados, a Secretaria do Trabalho expediu o Ofício Circular SEI nº 1088/2020/ME (4), que determina a implementação de medidas de higiene e conduta para a prevenção e redução de contágio da COVID-19.
No mesmo sentido, o Ministério Público do Trabalho (“MPT”) publicou Notas Técnicas (5) visando a proteção dos trabalhadores e implementação de medidas de controle em ambientes laborais.
É importante ressaltar que o fornecimento de máscaras, álcool em gel e a manutenção de distância física entre os trabalhadores sejam observados pelos empregadores, sendo de extrema relevância o cuidado com a prova documental, onde devem constar levantamentos, monitoramentos, medidas de controles, registros de treinamentos dos trabalhadores, além de conter as diretrizes da Política de Segurança e Saúde do Trabalho da empresa, com respectiva revisão e atualização de documentos como o PPRA, PCMSO, EPI’s e demais documentos relativos à segurança e saúde de empregados, adaptados para o contexto da pandemia.
Mais informações sobre o tema podem ser obtidas com a equipe trabalhista do VLF Advogados.
Roberto Gallo de Andrade
Advogado da Equipe Trabalhista do VLF Advogados
(1) BRASIL. Medida Provisória nº 927, de 22 de março de 2020. Dispõe sobre as medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19), e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/Mpv/mpv927.htm. Acesso em: 20 maio 2020.
(2) STF afasta trechos da MP que flexibiliza regras trabalhistas durante pandemia da Covid-19. Disponível em: http://stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=442355&caixaBusca=N. Acesso em: 20 maio 2020.
(3) STF prossegue nesta quarta-feira (29) julgamento de ações contra flexibilização de regras trabalhistas. Disponível em: http://stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=442248&caixaBusca=N. Acesso em: 20 maio 2020.
(4) BRASIL. Ofício Circular SEI nº 1088/2020/ME. Disponível em: http://trabalho.gov.br/images/Noticias/OFCIO_CIRCULAR_SEI_n_1088_de_2020_ME2.pdf. Acesso em: 20 maio 2020.
(5) PANDEMIA Covid-19: veja aqui notas técnicas, recomendações e a atuação do MPT nos estados. Disponível em: https://mpt.mp.br/pgt/noticias/coronavirus-veja-aqui-as-notas-tecnicas-do-mpt. Acesso em: 20 maio 2020.