STF decide que o sujeito ativo do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços Importação deve levar em consideração o destinatário jurídico do importado
Yuri Brizon
Em 27 de abril, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (“STF”), através do julgamento do Agravo em Recurso Extraordinário nº 665.134/MG (“SER 665.134/MG”) (1), em sede de repercussão geral, objetivando traçar os contornos normativos do sujeito ativo da obrigação tributária referente ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – Importação (“ICMS-Importação”), à luz do art. 155, § 2º, IX, “a”, da Constituição da República de 1988 (“CR/88”) (2), fixou a seguinte tese:
O sujeito ativo da obrigação tributária de ICMS incidente sobre mercadoria importada é o Estado-membro no qual está domiciliado ou estabelecido o destinatário legal da operação que deu causa à circulação da mercadoria, com a transferência de domínio.
Na oportunidade, foi, ainda, utilizada a técnica de declaração de inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, ao art. 11, I, “d”, da Lei Complementar federal nº 87/96 (3), para fins de afastar o entendimento de que o local da operação ou da prestação, para os efeitos da cobrança do imposto e definição do estabelecimento responsável pelo tributo, é apenas e necessariamente o da entrada física de produto importado, tendo em conta a legalidade de circulação ficta de mercadoria emanada de uma operação documental ou simbólica, desde que haja efetivo negócio jurídico.
O contexto fático do caso analisado envolvia a importação de insumos por sociedade empresária localizada no Estado de São Paulo, com posterior remessa para industrialização por encomenda para estabelecimento localizado em Minas Gerais e retorno ao primeiro local do produto acabado, para que se desse a sua comercialização ao consumidor final.
Segundo o Fisco mineiro, a referida operação seria, na verdade, uma “importação indireta” promovida pela pessoa jurídica localizada no Estado de Minas Gerais, uma vez que não teria havido a entrada física da mercadoria na sociedade empresária paulista, mas logo que desembaraçada, foi transportada diretamente ao industrializador. Tal entendimento foi adotado tanto pelo juízo de primeira instância, quanto pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (“TJMG”).
Observa-se, portanto, que até então, o TJMG entendia como destinatário final da mercadoria, nos termos do art. 155, § 2º, IX, “a” da CR/88, o destinatário físico. No mesmo sentido decidiu quando do julgamento da Apelação Cível nº 1.0194.06.055617-3/001 (4). Pode-se encontrar decisões similares em outros tribunais de justiça, como a exarada pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul na Apelação Cível nº 70075924498 (5).
Contudo, outros órgãos já vinham decidindo com base no conceito de destinatário jurídico, como, por exemplo, o Tribunal de Justiça de São Paulo, nos termos do acórdão prolatado na Apelação Cível nº 1019956-35.2014.8.26.0053 (6). O próprio STF já havia se manifestado nesse sentido diversas vezes, conforme se extrai do Agravo de Instrumento nº 651.352/MG (7) e no Recurso Extraordinário nº 299.079/RJ (8), apesar de nunca sob a sistemática da repercussão geral ou de recursos repetitivos.
Evidente, portanto, que a decisão do STF veio em boa hora, afastando a insegurança jurídica sobre o tema.
Sendo assim, nos termos fixados no ARE 665.134/MG, serão considerados como destinatários finais, para fins de estabelecimento do sujeito ativo do ICMS-Importação:
a) na importação por conta própria, a destinatária econômica coincide com a jurídica, uma vez que a importadora utiliza a mercadoria em sua cadeia produtiva;
b) na importação por conta e ordem de terceiro, a destinatária jurídica é quem dá causa efetiva à operação de importação, ou seja, a parte contratante de prestação de serviço consistente na realização de despacho aduaneiro de mercadoria, em nome próprio, por parte da importadora contratada;
c) na importação por conta própria, sob encomenda, a destinatária jurídica é a sociedade empresária importadora (trading company), pois é quem incorre no fato gerador do ICMS com o fito de posterior revenda, ainda que mediante acerto prévio, após o processo de internalização.
Mais informações podem ser obtidas com a equipe de Direito Tributário do VLF Advogados.
Yuri Brizon
Advogado da Equipe Tributária do VLF Advogados
(1) ARE 665134, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 27/04/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-123 DIVULG 18-05-2020 PUBLIC 19-05-2020.
(2) "Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
IX - incidirá também:
a) sobre a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade, assim como sobre o serviço prestado no exterior, cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o domicílio ou o estabelecimento do destinatário da mercadoria, bem ou serviço."
(3) "Art. 11. O local da operação ou da prestação, para os efeitos da cobrança do imposto e definição do estabelecimento responsável, é:
I - tratando-se de mercadoria ou bem:
d) importado do exterior, o do estabelecimento onde ocorrer a entrada física."
(4) TJMG - Apelação Cível 1.0194.06.055617-3/001, Relator(a): Des.(a) Silas Vieira, 3ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 23/04/2009, publicação da súmula em 26/06/2009.
(5) Apelação Cível, nº 70075924498, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Torres Hermann, Julgado em: 20-02-2018.
(6) TJSP - Apelação Cível 1019956-35.2014.8.26.0053; Relator (a): Leonel Costa; Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Público; Foro Central - Fazenda Pública/Acidentes - 1ª Vara de Fazenda Pública; Data do Julgamento: 21/02/2018; Data de Registro: 21/02/2018.
(7) AI 651352 AgR-segundo-AgR-ED, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 25/08/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-178 DIVULG 09-09-2015 PUBLIC 10-09-2015.
(8) RE 299079, Relator(a): Min. CARLOS BRITTO, Primeira Turma, julgado em 30/06/2004, DJ 16-06-2006 PP-00020 EMENT VOL-02237-03 PP-00461 RTJ VOL-00200-03 PP-01356 LEXSTF v. 28, n. 331, 2006, p. 268-275.