A incidência de contribuição patronal sobre o salário-maternidade é inconstitucional, segundo o STF
Laís Araújo
Em julgamento finalizado em 4 de agosto de 2020 na sessão do plenário virtual, o Supremo Tribunal Federal (“STF”), por 7 votos a 4, declarou a inconstitucionalidade da contribuição patronal sobre o salário-maternidade.
A decisão por maioria de votos foi tomada no Recurso Extraordinário 576.967, com repercussão geral reconhecida (tema 72).
O contribuinte defendeu que o salário-maternidade não tem natureza remuneratória, já que, durante tal período, a empregada está afastada do trabalho, tendo natureza, portanto, indenizatória. A União, por sua vez sustentou que a empregada continuava a fazer parte da folha de salários e que, pela lei, salário-maternidade é considerado salário de contribuição.
A contribuição patronal sobre a folha de salários é devida pelos empregadores para o custeio da seguridade social. Incide sobre a remuneração total paga aos seus empregados e trabalhadores avulsos, aplicando-se uma alíquota de 20% (vinte por cento).
O centro do debate entre o contribuinte e o fisco está na interpretação do artigo 195, inciso I, alínea ‘a’ da Constituição da República de 1988 e do art. artigo 28, parágrafo 2º da Lei n. 8.212/91, in verbis:
Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:
a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício;
Art. 28. Entende-se por salário-de-contribuição:
§ 2º O salário-maternidade é considerado salário-de-contribuição.
Em seu voto, o Ministro Luís Roberto Barroso (relator) destacou que a CR/88, em seu art. 195, I, ‘a’, prevê como base de cálculo da contribuição previdenciária os valores pagos como contraprestação a trabalho ou serviço prestado ao empregador. Para o Ministro, o fato de a empregada continuar integrando formalmente a folha de salários decorre da manutenção do vínculo empregatício e não atribui natureza salarial ao benefício recebido por ela.
Sob o aspecto formal, o art. 28, § 2º, da Lei nº 8.212/91 criou nova fonte de custeio diferente daquelas contidas no art. 195, I, ‘a’ da CR/88, ao arrepio do Texto Constitucional, que exige lei complementar neste caso.
Quanto ao conteúdo material, o Relator lembrou que a cobrança da contribuição patronal que inclui como base de cálculo salário-maternidade torna mais onerosa a mão de obra feminina, gerando discriminação das mulheres no mercado de trabalho se comparado às oportunidades oferecidas aos homens.
Ainda que o voto tenha se fundamentado em uma análise formal e material quanto à aplicação dos dispositivos constitucionais e infraconstitucionais, não menos importante foi a questão social levantada pelo relator com relação ao papel da mulher no mercado de trabalho e que foi acompanhada pelos ministros que votaram com ele.
Como a contribuição patronal sobre a folha de salários paga pelo empregador é uma das fontes de custeio da previdência social, não raras vezes, a contratação de mão de obra feminina é desestimulada em razão da maternidade, justamente por compor a folha de salários e o empregador ter de pagar a contribuição patronal incluindo a empregada que está afastada de suas atividades.
Quando há incidência de tributação que diferencia o gênero feminino, isso gera uma discriminação incompatível com os preceitos constitucionais.
Por maioria de votos, foi declarada a inconstitucionalidade da contribuição patronal sobre o salário-maternidade, prevista no art. 28, § 2º da Lei nº 8.212/91 e a parte final do § 9º, alínea ‘a’.
A decisão do STF é um importante passo tanto por reafirmar que a contribuição previdenciária patronal apenas incide sobre valores de natureza remuneratória quanto por reforçar a igualdade de gênero protegida constitucionalmente.
Mais informações sobre o tema podem ser obtidas com a Equipe de Direito Tributário do VLF Advogados.
Laís Araújo
Advogada da Equipe de Direito Tributário do VLF Advogados
(1) BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 13 ago. 2020.
(2) BRASIL. Lei 8.212, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre a organização da Seguridade Social, institui Plano de Custeio, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8212cons.htm. Acesso em: 13 ago. 2020.
(3) BRASIL. Lei 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8213cons.htm. Acesso em: 13 ago. 2020.