Dias Toffoli derruba liminar que exigia CND para homologação de plano de recuperação judicial
Eduardo Metzker Fernandes
No Informativo VLF – 72/2020, de 28 de setembro de 2020, noticiamos que o Ministro Luiz Fux havia proferido decisão liminar exigindo a Certidão de Regularidade Fiscal da empresa devedora para a homologação do plano de recuperação judicial (1).
Na oportunidade, ressaltamos que a literalidade do texto legal (2) aponta para a necessidade de o devedor apresentar as certidões negativas de débitos tributários para postularem a recuperação judicial. Destacamos também que a jurisprudência sempre se inclinou em considerar a exigência inadequada, pois representaria nítido conflito com o espírito e o objetivo da lei de recuperação judicial e falência de viabilizar a superação de crise econômico-financeira do devedor.
Antes de tratarmos da recente decisão do ministro Dias Toffoli, abrimos um parênteses para ressaltar que a denominada nova lei de falências, sancionada no dia 24 de dezembro de 2020, não trouxe alterações nos dispositivos que se relacionam com a necessidade de apresentação das Certidões de Regularidade Fiscal para homologação do plano de recuperação judicial.
Neste Informativo VLF de nº 75/2020, o leitor encontrará o texto “A Nova Lei de Recuperação Judicial e Falências” dedicado exclusivamente à Lei nº 14.112/2020, que atualizou a legislação referente à recuperação judicial, à recuperação extrajudicial e à falência do empresário e da sociedade empresária.
Pois bem, a recente decisão do ministro Dias Toffoli, proferida na Reclamação nº 43.169, baseou-se no entendimento de que “não há repercussão direta no texto constitucional, senão reflexa, na controvérsia envolvendo a exigência de regularidade fiscal no processo de recuperação judicial”. Para Toffoli, a matéria não é constitucional, o que afasta o seu enfrentamento pelo Supremo Tribunal Federal (“STF”).
A decisão de Toffoli, que tornou sem efeito a liminar deferida pelo ministro Luiz Fux, representa a retomada do entendimento da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) (3), que analisou o caso anteriormente e manteve a orientação no sentido da dispensa da exigência das certidões de regularidade fiscal para homologação do plano de recuperação judicial, fazendo-o sob o fundamento principal de que deve preponderar o princípio da preservação da empresa, insculpido no artigo 47 da lei de recuperação judicial e falência (4).
De acordo com o STJ, ainda, a exigência das CNDs não garante o adimplemento do crédito tributário e acaba impondo dificuldade ainda maior ao Fisco, pois essa categoria de crédito, na hipótese de falência, encontra-se em terceiro lugar na ordem de preferências.
Nesse sentido, Toffoli destacou o seguinte:
O que fez a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça foi olhar a teleologia da Lei nº 11.101/05 [Lei de Recuperação Judicial], como um todo, e procurar a solução que apresentava menor restrição possível às normas legais que nortearam o instituto da recuperação judicial que é viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.
Como já havíamos mencionado no Informativo VLF – 72/2020, de 28 de setembro de 2020, o instituto da recuperação judicial foi criado para propiciar a sobrevivência das empresas com dificuldade econômico-financeira. Desta forma, ainda que o artigo 57 da Lei nº 11.101/05 determine a apresentação das certidões de regularidade fiscal, tal exigência não deve ser considerada de modo absoluto.
Reiteramos, assim, na esteira do que assinalou o ministro Dias Toffoli, que parece bastante razoável o entendimento de que o artigo 47 da Lei nº 11.101/05 e 170 da Constituição da República (5) permitem a mitigação da exigência da apresentação de CND para homologação de plano de recuperação judicial.
Eduardo Metzker Fernandes
Coordenador da Equipe de Contencioso Cível do VLF Advogados
(1) Rcl 43.169.
(2) Lei 11.101/05. Art. 57. Após a juntada aos autos do plano aprovado pela assembleia-geral de credores ou decorrido o prazo previsto no art. 55 desta Lei sem objeção de credores, o devedor apresentará certidões negativas de débitos tributários nos termos dos arts. 151, 205, 206 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional.
(3) REsp 1.864.625.
(4) Lei 11.101/05. Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.
(5) Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
I - soberania nacional;
II - propriedade privada;
III - função social da propriedade;
IV - livre concorrência;
V - defesa do consumidor;
VI - defesa do meio ambiente;
VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;
VII - redução das desigualdades regionais e sociais;
VIII - busca do pleno emprego;
IX - tratamento favorecido para as empresas brasileiras de capital nacional de pequeno porte.
IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.
Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.