Os efeitos do depósito judicial na fase de execução e a proposta de revisão do Tema Repetitivo 677 do STJ
Diego Oliveira Murça e Raphael de Campos Silva
Ao julgar o REsp 1.820.963/SP, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) acolheu questão de ordem para que a Corte Especial se manifeste sobre o Tema 677, que tem a seguinte redação: “Na fase de execução, o depósito judicial do montante (integral ou parcial) da condenação extingue a obrigação do devedor, nos limites da quantia depositada”. (Tema 677/STJ)
Em 2014, o tema havia sido consolidado no Recurso Especial 1.348.640/RS, sob relatoria do Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, no sentido de que o depósito judicial transferia para a instituição financeira depositária a atualização financeira do depósito, isso é, livrando o devedor dos encargos da mora previstos no título executivo, independentemente da liberação da quantia ao credor (1).
Porém, a atualização dos depósitos quase nunca corresponde aos valores que seriam devidos caso fossem aplicados os critérios ajustados no título executivo. Assim, a demora no processamento da execução pode gerar uma diferença significativa em desfavor do credor, especialmente porque não há a incidência de juros remuneratórios nas correções realizadas pelas instituições financeiras depositárias (2).
Sob essa premissa, em 2016, a Terceira Turma do STJ deu novos contornos ao tema, ao julgar o REsp 1.475.859, com relatoria do ministro João Otávio de Noronha. Naquela oportunidade, se entendeu que
a obrigação da instituição financeira pelo pagamento dos juros e correção sobre valor depositado, convive com a obrigação do devedor de pagar os consectários próprios da sua mora, [ou seja], quando do efetivo pagamento, os valores depositados com os acréscimos pagos pela instituição bancária devem ser deduzidos do montante da condenação calculado na forma do título judicial ou extrajudicial.
Nessa linha, o valor será liberado ao credor com as atualizações feitas pela instituição financeira, mas será devida, também, a diferença em relação aos encargos da mora exigíveis do devedor até a data do efetivo levantamento do dinheiro.
Desde então, a divergência de entendimento das Turmas do STJ quanto aos efeitos do depósito judicial e a responsabilidade pelos encargos da mora nas hipóteses em que o depósito judicial não é feito com o propósito de pagamento ao credor ganhou força, repercutindo também nos Tribunais Estaduais.
Em outubro do ano passado, o Ministro Paulo de Tarso Sanseverino levantou questão de ordem durante o julgamento do Recurso Especial nº 1.820.963/SP, com a intenção de afetar o assunto à Corte Especial, ressaltando que, a partir do julgamento do REsp 1.475.859/RJ, a jurisprudência do STJ teria passado a divergir acerca da aplicação do Tema 677. A questão de ordem foi acolhida, com destaque da Relatora do acórdão, Ministra Nancy Andrighi, para a importância de se “uniformizar a jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente”.
A decisão de nova afetação da matéria suspende os recursos sobre o mesmo tema, até que a Corte Especial se posicione. Ainda não há previsão para o julgamento, mas, caso haja a revisão do Tema 677, o novo entendimento pode ter profundas repercussões jurídicas e econômicas, especialmente se não houver a modulação dos efeitos da nova decisão do STJ (3).
Para mais informações sobre o assunto ou para esclarecer suas dúvidas, procure a equipe de contencioso do VLF Advogados.
Diego Oliveira Murça
Advogado da Equipe de Contencioso Cível do VLF Advogados
Raphael de Campos Silva
Trainee da Equipe de Contencioso Cível do VLF Advogados
(1) Nesse sentido, cf. EREsp 1.306.735/MG, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, CORTE ESPECIAL, julgado em 15/05/2013, DJe 29/05/2013; EREsp 119.602/SP, Rel. Ministro MILTON LUIZ PEREIRA, CORTE ESPECIAL, julgado em 02/09/1998, DJ 17/12/1999.
(2) Há duas hipóteses de remuneração dos depósitos judiciais, a depender da sua natureza e finalidade: i) depósitos judiciais de valores referentes a tributos, contribuições federais e acessórios, administrados pela Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda, que são recolhidos junto à Caixa Econômica Federal e por esta repassada à Conta Única do Tesouro Nacional, onde são corrigidos e remunerados pela SELIC, sendo a responsabilidade por tal pagamento exclusiva da Fazenda Nacional; e, ii) os demais casos, que devem ser atualizados pelas mesmas regras de caderneta de poupança, no que se refere à remuneração básica e ao prazo. A remuneração dos depósitos judiciais, por força do art. 12, inciso I da Lei 8.177/91, ficaria adstrita à correção monetária pela Taxa Referencial – TR, uma vez que apenas o indexador se identifica com o conceito de “remuneração básica” imposto pelo art. 11, § 1º da Lei nº 9289/96 e definido pelo art. 12, inciso I da Lei nº 8.177/91, sem incidência de quaisquer juros remuneratórios.
(3) Sob a lógica econômica, por exemplo, a reversão do Tema 677 pode gerar um grande desincentivo ao depósito judicial, já que o devedor, muito provavelmente, vai preferir manter para si o dinheiro, no intuito de ter uma melhor remuneração pelo capital e fazer frente aos encargos da mora ao final da discussão judicial, se for o caso. Já sob a lógica jurídica, será preciso decidir, por exemplo, a responsabilidade pela diferença de remuneração que o devedor deixou de ter com o depósito, caso ele venha a ganhar eventual discussão judicial contra o credor, ou seja, neste caso, o suposto credor teria feito o pretenso devedor submeter seu capital à simples correção, quando as taxas médias de mercado costumam ser maiores e comportar a incidência de juros.