A guerra dos bastardos (livro), de Ana Paula Maia, e Lutar, lutar, lutar: um filme que aborda a essência da atleticanidade ao longo de suas gerações de jogadores e torcedores
Rafhael Frattari e Bruno Fontenelle
A guerra dos bastardos (livro), de Ana Paula Maia
Esse foi o primeiro livro que conheci da autora e fiquei muito bem impressionado. Literatura nacional visceral, de um realismo tão brutal, que chega a parecer fantástico, com personagens que estão à margem da sociedade, mas não deixam de ser tantos. Assassinos, traficantes, putas, açougueiros, cineastas desiludidos fazem parte da fauna que transita no romance ambientado no Rio de Janeiro.
Depois da obra, Ana Paula Maia ficou famosa por criar uma espécie de mundo alternativo para os seus demais livros, também incríveis, mas que se passam em espaços rurais indefinidos, onde a religião também ganha um papel importante nas tramas.
Hoje a autora também atua como roteirista e é uma das responsáveis pela produção da Rede Globo Desalma. Pode-se dizer que já alcançou algum sucesso de público, bem diferente do tempo em que concebeu o livro indicado.
Talvez a sua juventude à época tenha sido importante para deixar A Guerra dos Bastardos tão direta e bruta. Há todo tipo de aventura do submundo carioca, descritas numa prosa empolgante e com finais malucos. Mas para não dar spoilers, deixo vocês com uma passagem impagável do livro, a sua dedicatória: “Aos degenerados, desmedidos e renegados”, escreve a Autora.
Rafhael Frattari
Sócio da área Tributária do VLF Advogados
Lutar, lutar, lutar: um filme que aborda a essência da atleticanidade ao longo de suas gerações de jogadores e torcedores
25 de julho, 2013
Ganhou. Meu Deus, o Galo ganhou! O título impossível, aquele que no fundo, o atleticano já cogitava morrer sem comemorar, como muitos que morreram e não viram. O título da nossa redenção definitiva, a conquista que vai nos ensinar, de novo e de novo, que desistir não vale. Que a justiça, seja dos homens ou de Deus, ela pode falhar e tripudiar da gente – mas que tem uma hora que nem ela se aguenta, e nessa hora ela não falha (1).
No dia 11 de novembro, o documentário Lutar, Lutar, Lutar – O Filme do Galo, dirigido por Sérgio Borges e Helvécio Marins, estreou nacionalmente em salas de cinema de todo o Brasil. O filme aborda a história centenária do Clube Atlético Mineiro, desde sua fundação, em 1908, no Parque Municipal, até a conquista da Copa do Brasil, em 2014, contra o rival Cruzeiro. De acordo com o filme, desde a sua fundação, o Clube buscava juntar pessoas ricas e pobres, pretas e brancas, em prol de criar um só time em Belo Horizonte em que todos podiam torcer, ao contrário de seus dois rivais, que se proclamavam time da elite (América) ou de colônia italiana (Cruzeiro).
Selecionado para o Festival de Roterdã, o filme aborda a odisseia do Galo na busca e conquista de títulos, com enfoque especial nas décadas de 1970 e 1980, época em que o atleticano vivenciou o considerado melhor time de sua história (com jogadores como Reinaldo, Eder Aleixo e Nelinho) e viveu algumas de suas passagens mais trágicas: a final do Campeonato Brasileiro de 1977, a final do Campeonato Brasileiro de 1980 e o jogo da Copa Libertadores de 1981, contra o Clube de Regatas Flamengo. O documentário aborda um paralelo interessante entre a resistência feita por Reinaldo, considerado o melhor jogador da história do Clube, inspirado pelo grupo Panteras Negras, em oposição à Ditadura Militar (1964-1985), e os resultados de tais jogos, com notável perseguição de interesses representados pelo Galo naquela época. Por exemplo, é impossível não se chocar com o jogo de 1981, em que o Atlético teve cinco jogadores expulsos ao longo da partida, contra o time do Rio de Janeiro.
De acordo com o filme, o período sem conquistas fora de Minas Gerais combinado com as injustiças articuladas nos bastidores do futebol brasileiro marca a fase de resistência da torcida atleticana, com sucessivas demonstrações de devoção ao Clube. Conforme Fred Melo Paiva, personagem do filme e cronista torcedor, tal sentimento de injustiça favoreceu o sentimento de pertencimento atleticano, fazendo com que o Atlético tivesse uma das torcidas mais apaixonadas do Brasil: “A gente não é forjado na derrota, mas na injustiça. E a injustiça é muito poderosa. Você seja injusto com qualquer grupo que ele vai se tornar muito forte. Ele vai se unir. Ele vai encontrar forças, que você não sabe de onde, para ir para cima”.
No entanto, seja pela mão de Deus ou pela do homem, o Clube não conseguiu conquistar os títulos que tanto almejava nos anos seguintes, culminando em crises financeiras e administrativas, e levando o time a cair para a segunda divisão em 2005. Mesmo diante de tantas adversidades, a torcida do Galo continuava presente, batendo seguidos recordes de público ao longo dos anos. Anos mais tarde, após muito esforço, o Atlético conquistou os títulos da Libertadores e da Copa do Brasil, em 2013 e 2014, com a ajuda de jogadores como Ronaldinho Gaúcho, Victor e Diego Tardelli, fazendo com que o atleticano vivenciasse verdadeira redenção em âmbito nacional.
Atualmente, no ano de 2021, é impossível não desvencilhar o atual momento que o Galo vivencia, com a possibilidade de conquistar o título do Campeonato Brasileiro em 50 anos. O filme demonstra de maneira clara como a torcida se mantém fiel mesmo nos momentos de adversidade e injustiça, fazendo com que este sentimento passe de geração em geração. Apesar de tantas dificuldades, o atleticano fez de sua travessia a felicidade.
Particularmente, vivenciar este momento enquanto atleticano me faz refletir de como gerações de herdeiros dos anos 1970 e 1980 só conseguirão gritar este grito entalado de campeão enquanto pais e não filhos. De tantos atleticanos e atleticanas que se preparam durante décadas para ver seu time ganhar o campeonato brasileiro, mas infelizmente não conseguiram ver. Meu pai foi um desses atleticanos.
Creio, portanto, que quando um torcedor do Atlético ver este filme, percebe que nossa história é clara quanto ao verdadeiro merecimento de sermos campeões nacionais. Não só este filme, mas como todo este ano de campeonato brasileiro deve ser celebrado e assistido de perto. De fato, nossa história é de lutar, lutar e lutar. Está na hora de vencer, vencer e vencer.
Bruno Fontenelle
Advogado da Equipe de Direito Administrativo e Regulatório do VLF Advogados
(1) PAIVA, Fred Melo. O Atleticano vai ao paraíso. São Paulo, Ed. do Autor, 2013. p. 193.