Desvendando conceitos no direito de empresa: ativo circulante e ativo não circulante
Vitória Fiorini e Paulo Vítor Ângelo
Embora a compreensão de conceitos associados ao direito de empresa seja fundamental para a gestão eficiente de qualquer organização, muitos empreendedores, gestores, investidores e/ou clientes atuam no ambiente de negócios sem possuir nível adequado de conhecimento sobre o tema, o que pode comprometer a tomada de decisões estratégicas. Neste artigo, exploraremos as noções de ativo circulante e de ativo não circulante, conforme estabelecidas pela Lei nº 6.404/1976 (“Lei das S.A.”), examinando suas subdivisões e a relevância de ambos os conceitos para o dia a dia das organizações.
Com o encerramento do exercício social, surge para a sociedade a obrigação de elaborar, com base em sua escrituração mercantil, as demonstrações contábeis correspondentes. E dentre essas demonstrações, tem destaque o balanço patrimonial, que fornece retrato estático da situação patrimonial da organização (complexo de ativos e passivos que compõem sua esfera patrimonial) (1) na data-base estabelecida para a respectiva elaboração.
Conforme disposto na Lei das S.A., o balanço patrimonial deve ter suas contas classificadas de acordo com os elementos do patrimônio que registrem, sendo agrupadas de modo a facilitar o conhecimento e a análise da situação financeira da organização. Nesse sentido, as contas referentes ao ativo, comumente localizadas na porção esquerda do balanço patrimonial, deverão subdividir-se entre os grupos “macro” do ativo circulante e do ativo não circulante, e serão dispostas em ordem decrescente do grau de liquidez dos elementos que registrem (2), evidenciando a expectativa da organização em relação à facilidade ou à velocidade com que tais ativos poderão ser realizados (3) – ou seja, convertidos em moeda ou em quaisquer outros benefícios econômicos para a sociedade.
O ativo circulante, de modo objetivo, compreende as disponibilidades e os bens e direitos realizáveis pela organização até o fim do curso do exercício social subsequente (4). Incluem-se neste grupo comumente as contas de caixa e equivalentes de caixa, de investimentos financeiros, de direitos a receber (contas a receber de clientes), de estoques (mercadorias para revenda, matérias-primas, produtos em elaboração e/ou produtos acabados), e quaisquer outros ativos que sejam realizáveis pela organização no curto prazo.
A principal característica do ativo circulante é a sua alta liquidez, ou seja, a facilidade e a velocidade com que os ativos ali agrupados tendem a ser realizados no curto prazo. Nos termos do Pronunciamento Técnico CPC 26 (R1) – Apresentação das Demonstrações Contábeis, em seu item 66, o ativo, para que seja classificado como circulante, deve satisfizer a qualquer um dos seguintes critérios: (a) esperar-se que seja realizado, ou pretender-se que seja vendido ou consumido no decurso normal do ciclo operacional da entidade; (b) estar mantido essencialmente com o propósito de ser negociado; (c) esperar-se que seja realizado até doze meses após a data do balanço; ou (d) corresponder a caixa ou equivalente de caixa, a menos que sua troca ou uso para liquidação de passivo se encontre vedada durante pelo menos doze meses após a data do balanço (5).
O ativo não circulante, por sua vez, compreende todos os demais ativos que não atendam a nenhum dos critérios acima indicados, incluindo todos os bens e direitos da organização realizáveis em prazo superior ao fim do curso do exercício social subsequente. Compõem o grupo em referência os subgrupos dos ativos realizáveis a longo prazo, dos investimentos, do ativo imobilizado e do intangível (6).
O subgrupo dos ativos realizáveis a longo prazo é composto por todos os direitos da sociedade realizáveis após o término do exercício social subsequente, assim como pelos direitos derivados de vendas, adiantamentos ou empréstimos a partes relacionadas que não constituam negócios usuais realizados na exploração do objeto social. O subgrupo dos investimentos, por sua vez, é composto pelas participações permanentes em outras sociedades e pelos direitos de qualquer natureza que, além de não se classificarem no ativo circulante, não sejam destinados à manutenção das atividades da organização (como, por exemplo, os imóveis adquiridos para geração de renda com aluguéis). Já o subgrupo do ativo imobilizado é composto pelos bens corpóreos destinados à manutenção das atividades da organização ou exercidos com essa finalidade (como, por exemplo, os imóveis nos quais a sociedade exerça atividades, as máquinas e/ou os equipamentos). Por fim, o subgrupo do intangível é composto pelos direitos que tenham por objeto bens incorpóreos destinados à manutenção das atividades da organização ou exercidos com essa finalidade (como, por exemplo, as marcas, as patentes e/ou os direitos autorais), incluindo o fundo de comércio adquirido.
Cabe destacar que os ativos circulantes desempenham papel crucial no cotidiano das sociedades, fornecendo a liquidez necessária para que haja resposta às suas necessidades financeiras imediatas, e garantindo assim a solvência da organização. A gestão eficiente dos ativos pertencentes a esse grupo, como as contas a receber e/ou os estoques, não apenas assegura o cumprimento das obrigações de curto prazo, mas também otimiza o fluxo de caixa e reduz os custos operacionais, refletindo diretamente nos lucros, nos índices de liquidez e na saúde financeira da organização.
Por outro lado, os ativos não circulantes são pilares estratégicos para o crescimento e a sustentabilidade de longo prazo das organizações. Sua importância é reforçada pela própria Lei das S.A., que no contexto das sociedades anônimas, exige a autorização prévia do Conselho de Administração para que os bens pertencentes ao ativo não circulante sejam alienados, exceto se previsto de modo diverso no Estatuto Social (7). A gestão cuidadosa desses ativos, incluindo os imóveis, os equipamentos e/ou os intangíveis, é essencial para expandir a capacidade produtiva das organizações, aprimorando sua eficiência operacional e fortalecendo sua posição competitiva no mercado.
Vitória Fiorini
Advogada da Equipe de Consultoria Societária do VLF Advogados
Paulo Vítor Ângelo
Coordenador da Equipe de Consultoria Societária do VLF Advogados
(1) Esse assunto foi abordado no Informativo VLF – 111/2023. CALAES, Gabriel; ÂNGELO, Paulo Vitor. Desvendando conceitos no direito de empresa: capital social e patrimônio. Disponível em: https://vlf.adv.br/noticia_aberta.php?id=2576. Acesso em: 27 ago. 2024.
(2) BRASIL. Lei nº 6.404/1976 (Dispõe sobre as Sociedades por Ações). Art. 178. No balanço, as contas serão classificadas segundo os elementos do patrimônio que registrem, e agrupadas de modo a facilitar o conhecimento e a análise da situação financeira da companhia. §1º. No ativo, as contas serão dispostas em ordem decrescente de grau de liquidez dos elementos nelas registrados, nos seguintes grupos: I – ativo circulante; e II – ativo não circulante, composto por ativo realizável a longo prazo, investimentos, imobilizado e intangível.
(3) EIZIRIK, Nelson. A Lei das S/A Comentada. v III. 3. ed. rev. amp. Arts. 138 a 205. São Paulo: Quartier Latin, 2021, p. 419.
(4) BRASIL. Lei nº 6.404/1976 (Dispõe sobre as Sociedades por Ações). Art. 179. As contas serão classificadas do seguinte modo: I – no ativo circulante: as disponibilidades, os direitos realizáveis no curso do exercício social subseqüente e as aplicações de recursos em despesas do exercício seguinte.
(5) Comitê de Pronunciamentos Contábeis. Pronunciamento Técnico CPC 26 (R1) – Apresentação das Demonstrações Contábeis, item 66.
(6) BRASIL. Lei nº 6.404/1976 (Dispõe sobre as Sociedades por Ações). Art. 179. As contas serão classificadas do seguinte modo: (…) II – no ativo realizável a longo prazo: os direitos realizáveis após o término do exercício seguinte, assim como os derivados de vendas, adiantamentos ou empréstimos a sociedades coligadas ou controladas (artigo 243), diretores, acionistas ou participantes no lucro da companhia, que não constituírem negócios usuais na exploração do objeto da companhia; III – em investimentos: as participações permanentes em outras sociedades e os direitos de qualquer natureza, não classificáveis no ativo circulante, e que não se destinem à manutenção da atividade da companhia ou da empresa; IV – no ativo imobilizado: os direitos que tenham por objeto bens corpóreos destinados à manutenção das atividades da companhia ou da empresa ou exercidos com essa finalidade, inclusive os decorrentes de operações que transfiram à companhia os benefícios, riscos e controle desses bens; V – (Revogado); VI – no intangível: os direitos que tenham por objeto bens incorpóreos destinados à manutenção da companhia ou exercidos com essa finalidade, inclusive o fundo de comércio adquirido.
(7) BRASIL. Lei nº 6.404/1976 (Dispõe sobre as Sociedades por Ações). Art. 142. Compete ao conselho de administração: (…) VIII – autorizar, se o estatuto não dispuser em contrário, a alienação de bens do ativo não circulante, a constituição de ônus reais e a prestação de garantias a obrigações de terceiros.